E eu, que lá fui exactamente no dia 18 de Abril, pude constatar que está tudo como dantes, ou seja, revi um palácio que devia ser visita obrigatória para turista acidental, ter as paredes com rachas nas paredes da espessura de dedos, os magníficos estuques dos tectos das salas do 1º andar colados com cuspo, a capela a cair, o pátio entregue à bicharada, o telhado à espera de conserto definitivo, a iluminação em sistema de intemitência, tem as fachadas traseiras um desastre, tem os w.c. impróprias para motel de estrada abandonada, enfim, é um rol de tristezas. Simplesmente, e embora achasseque foi demasiado curto, pensei que o fecho do edifício tivesse a ver com recuperação do edifício, e não com algum pormenor mais perigoso que passasse despercebido ao visitante. Sendo assim, tudo como dantes.
Apenas 2 notas muito simples:
1. Alguém explica a este pobre imbecil por que razão o projecto do novo arquivo não tem espaço para uma hemeroteca moderna e eficaz, libertando este belíssimo palacete para outro uso que não este?
2. Que é feito dos propósitos da CML em trasladar o recheio desta hemeroteca para o antigo edifício do Record?
PF
Também tenho alguma dificuldade em compreender a falta de conservação de um edifício tão interessante e, ainda por cima, quando é ocupado por um serviço de uma instituição que despende avultadas quantias em tantas outras coisas.
ResponderEliminarQuanto à mudança de local não poderia estar mais de acordo consigo (embora não no que respeita às antigas instalações do Record, já estão desvitalizadas, para quê mais preocupações). Confesso que a ideia de mudança para o edifício do novo arquivo não era nada má... à beira da via rápida, quase debaixo da ponte, bem moderno! (ou urbano, como se diz agora) e eu que não me tinha lembrado disso. Quando pensava na mudança da Hemeroteca só me ocorriam lugares mais complicados de resolver no que respeita como às cedências, pensava na Malveira, Alcabideche, Massamá, Bobadela, Casal do Marco, ou outros lugares à beira das grandes vias de comunicação, com facilidade de estacionamento e com ruas (perdão, estradas) generosamente arborizadas.
E já que estamos a falar daquela zona por que não aproveitamos para propor que se mude também a Misericórdia? Podemos transformar o edifício num museu, para que os turistas tenham mais um destino. E o ICAM? Se se mudasse para Loures poderia ficar junto da parte moderna das instalações da Cinemateca, o Arquivo Nacional das Imagens em Movimento. O resto da casa do Arquitecto João Frederico Ludovice podia passar a ser o Portugal Wine Museum, vinho do Porto no rés-do-chão, Alentejanos no primeiro andar e por aí acima. O arquitecto não se importaria, não foi ele um dos obreiros do movimento de sub urbanização da corte?
E a Trindade? Não, com esses não temos de nos preocupar, já abriram restaurantes nas zonas dos turista e, mais tarde ou mais cedo fecham o do Chiado por falta de freguesia. E se começarem a ter veleidades como, por exemplo, vender o espaço para um condomínio de luxo (daqueles em que não fica um único fogo desabitado) podemos sempre classificar o edifício para os impedir. Depois fazemos umas vigílias e uns debates e conseguimos que se autorize apenas a reutilização para um centro qualquer de actividades infantis (deve ser seguro, por essa altura já não deve haver crianças a residir nesta zona, os filhos dos funcionários da Hemeroteca, da Misericórdia, do ICAM e da Trindade já não virão para Lisboa, pelo menos para o centro, os filhos dos turistas não entendem a nossa língua, por isso não se abre o centro por falta de freguesia).
E o Convento do Carmo? Que belo Museu da Revolução! Estou a imaginá-lo cheio de turistas. Bem, uma vez por ano teremos de aguentar as duas dúzias de portugueses que teimam em comemorar o 25 de Abril in loco Mas estamos a ser pessimistas, parte das pessoas já estão afastadas, museu que se preze implica uma área pedonal em volta, como a maior parte não vai a lado nenhum sem automóvel...(e a estação do Rossio já está desvitalizada, mesmo sem termos tido necessidade de fazer por isso).
Ao lado do quartel há uma escola. Ou já houve? De qualquer modo em relação às escolas não temos razões para alarme, mais tarde ou mais cedo fecham-se por falta de crianças.
E o Teatro da Trindade? Também deve estar podre. Sabe onde assentaria como uma luva? (esta da luva resolvia o problema do seu novo nome) Na Pontinha, entre a Casa do Artista e a estação de metro. Podia ser, até, que o Chapitô se deixasse de centralidades e se mudasse para o terreno ao lado, onde já estão alguns artistas de circo. Poderíamos criar o Pólo de Artes Dramáticas de Lisboa. O seu ex libris podia ser o Capitólio Transladado. Uma estrutura de tal modo completa que tornaria impossível aos artistas sair de lá, tal atitude seria mesmo imoral, um gesto de loucura e de ingratidão. Até podíamos construir uma suite para quando o Alberto João vem a Lisboa não se sentir tão deslocado.
Sabe quem se nos antecipou? O ISLA. Eles, que tinham dois edifícios na Lapa e eram responsáveis por um terço da vida daquela parte do bairro, mudaram-se para a Pontinha.
Pois é, eu sei que a Carris já lá está há muitos anos, que as outras estações deles são bem fora da cidade, que resistiram no Arco do Cego até mais tarde por razões de força maior. Mas acabaram por sair. E fizeram tudo como deve ser, um museu para os estrangeiros se deliciarem com os eléctricos e um canteiro gigantesco – chamado jardim – como aqueles de Belém para os cães fazerem chichi. (Não se preocupe que os reformados não vão para lá, os bancos foram estrategicamente colocados ao Sol)
Mas sobre as Avenidas Novas não vale a pena falar enquanto ainda houver funções centrais na Baixa. Ataquemos o mal pela raiz que o resto perecerá por si.
Agora as boas notícias: sabe que temos simpatizantes na equipa do Plano da Baixa? Ouvi dizer que querem revitalizar o comércio local. Já imaginou se conseguíssemos, como que por milagre (ou por decreto, tanto faz), transformar o pouco comércio com características de centralidade em comércio local? Já viu a finura com que se daria o golpe de misericórdia na Baixa? Que razão haveria para lá ir? Dormir, eu sei, mas de dia não se veria ninguém (para além dos turistas). Já foi à Rinchoa e a Odivelas a meio da tarde? Então qual é a preocupação? Os filhos dos habitantes dessa Baixa não andam na rua, não se preocupe, a maioria até anda em colégios e vai de carrinha.
Bom, agora vou à janela, que já são quase cinco da manhã, vou bater com uns tachos para ver se consigo afugentar mais uma ou duas famílias daqui para fora.
António Maria