17/11/2006

1000 milhões de euros é o passivo acumulado da Câmara de Lisboa, dos quais 200 milhões são dívidas de curto prazo a fornecedores

In Público (17/11/2006)

"Apesar de independente, o presidente da Câmara de Lisboa viu-se envolvido numa luta fratricida pelo poder no interior do PSD, na qual está a ser acusado de ceder às pressões de Marques Mendes. Por Ana Henriques

É um presidente da Câmara de Lisboa fragilizado o que emerge da ruptura entre o PSD e o CDS/PP ocorrida na quarta-feira. Independente eleito com os votos dos sociais-democratas, Carmona não conseguiu deixar de ser arrastado para as guerras intestinas do PSD. E o poder que está a entregar a uma das suas facções gerou indignações que podem vir a voltar-se contra si.
Um dos episódios centrais da ruptura da coligação relaciona-se com a nomeação do conselho de administração da Sociedade de Reabilitação Urbana (SRU) da Baixa Pombalina. Carmona Rodrigues convidou para um dos três lugares o antigo chefe da bancada social-democrata na Assembleia Municipal de Lisboa, Pedro Portugal Gaspar. E poucos dias depois retirou-lhe abruptamente o convite.
Portugal Gaspar garante que o autarca o fez por pressão do líder do partido, Marques Mendes, que interferiu por ele estar ligado à facção rival de Luís Filipe Menezes, que apoiou em congresso. Além disso, o ex-líder da bancada integrou a lista derrotada nas últimas eleições para a distrital de Lisboa do PSD, que foram vencidas por Paula Teixeira da Cruz, presidente da assembleia municipal e até aí vice-presidente de Marques Mendes.
O gabinete de Marques Mendes nega ter pressionado Carmona. E o presidente da câmara confirma-o: "Toda a iniciativa do processo foi minha, embora tenha tido o apoio das estruturas nacionais e distritais do partido." Seja como for, é precisamente com o facto de não ter sido informada do súbito desaparecimento do nome de Portugal Gaspar da proposta de Carmona que a vereadora do PP Maria José Nogueira Pinto justifica o que sucedeu anteontem.
Responsável pela ambiciosa proposta de reabilitação da Baixa-Chiado, a autarca preparava-se para fechar os olhos ao facto de Carmona querer pôr na presidência da SRU alguém que ela considerava não ter "o perfil adequado" - Nunes Barata, com quem tinha tido uma relação difícil quando ambos trabalharam na Misericórdia de Lisboa -, quando foi surpreendida, segundo conta, com a retirada do convite a Portugal Gaspar. Apesar de já ter combinado com Carmona que viabilizaria o nome do ex-colega da Misericórdia, provavelmente através de uma abstenção, Nogueira Pinto acabou por votar com a oposição contra Nunes Barata.
Menezes aproveitou o episódio para desferir novas críticas à direcção do partido e ao seu líder, que acusou de estar sobretudo preocupado "em "sanear" opositores internos". "Este caso, desencadeado por pressões directas da liderança partidária sobre a CML, obriga-me a continuar a não afastar uma variável: o sucesso do medíocre Governo Sócrates só resulta da ineficácia de um partido que, sob a capa de um justicialismo de fachada, está a enveredar pela perigosa deriva do centralismo autoritário", escreve o presidente da Câmara de Gaia na sua crónica publicada ontem no Correio da Manhã.
O presidente da câmara acabou por entregar os pelouros que tirou a Nogueira Pinto ao vereador Sérgio Lipari, apoiante de Marques Mendes, ficando ele próprio com a presidência do Comissariado da Baixa-Chiado.
O episódio Baixa-Chiado foi precedido, há menos de um mês, por um violento confronto entre Nogueira Pinto e Paula Teixeira da Cruz, que sempre foi contra a coligação com o PP (ver texto à parte). O incidente acabou por pôr a nu as clivagens entre sociais-democratas, particularmente entre os seguidores de Marques Mendes e os apoiantes de Luís Filipe Menezes.
E se há na vereação do PSD quem tenha visto com bons olhos a decisão de Carmona em relação a Nogueira Pinto, contrariando a falta de firmeza de que tem sido acusado, também há quem fale em precipitação e tema que a câmara se torne ingovernável, com o PP a pôr a oposição em maioria.
Antes de se coligar com o PSD, Nogueira Pinto questionou por várias vezes as decisões dos sociais-democratas, atitude que de resto não abandonou por completo após o enlace entre os dois partidos. Ontem, Carmona admitiu mesmo que o seu comportamento já tinha violado as bases da coligação quando, em Abril, votou favoravelmente, com a oposição, uma proposta do PCP. "Mas nessa altura não se tratava de inviabilizar uma proposta do presidente", observou Carmona, para sublinhar a gravidade do que agora aconteceu.
Nogueira Pinto assegurou entretanto que irá ficar na câmara até ao final do mandato e garantiu que jamais chumbará boas propostas só por virem do PSD. Mas acrescentou que dificilmente se atreveria a ter a iniciativa de romper a coligação, por causa da "enorme fragilidade" em que se encontra a câmara. "Há neste momento diversos PSD", além de que "em Lisboa o PSD está em convulsão", disse.
Carmona procurou mostrar alguma tranquilidade. "É possível funcionar com maiorias relativas e absolutas. Ambos os cenários são possíveis e porventura é tão estabilizador um quanto outro." O autarca salientou que a situação de maioria relativa "já ocorreu em Lisboa e em muitas autarquias do país" e desafiou os partidos da oposição: "Sempre foi minha vontade alargar o leque de apoios a quem quiser juntar-se a nós." Com José António Cerejo
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