31/01/2007

O caso de Lisboa

In Diário de Notícias (31/1/2007)
Pedro Rolo Duarte
Jornalista

«À vista desarmada, os lisboetas só po-dem estar de acordo com aqueles que, como Vasco Pulido Valente, pedem eleições antecipadas para a câmara municipal. É insustentável a maioria que suporta a autarquia, descemos ao grau zero da confiança, e o caos que sentimos no desgoverno da cidade pede medidas radicais. Até aqui, estamos no domínio do bom senso - curiosamente, invisível aos olhos do PSD, que sente legitimidade para se manter em funções, num autismo digno de uma ditadura sul-americana.

O problema, no entanto, está para lá des-se penso rápido que são umas eleições an-tecipadas. Na verdade, a situação a que chegámos, e a que assistimos impávidos e im-potentes, resulta de muitos anos de gestão camarária, que passou invariavelmente pelo PS, pelo PSD, pelo CDS e pela CDU. Ou seja: por mais eleições que se promovam, serão as mesmas forças a gerir a cidade (agora acrescentadas do - neste caso muito útil - Bloco de Esquerda). Presumivelmente, as mesmas pessoas. Com os mesmo vícios, compromissos, fretes e favores. Ou seja, mais do mesmo.

Assim sendo, e enquanto os cidadãos não perceberem que o voto, nestas circunstâncias, deve ser "dado" a quem dê garantias de cortar definitivamente com o passado (nas últimas eleições, só Sá Fernandes e Nogueira Pinto garantiam essa atitude), e não no âmbito da habitual competição de partidos, a probabilidade de assistirmos a uma mudança na forma de gerir a autarquia, de pensar a cidade, de planificar o trabalho e de o concretizar, é mínima, para não dizer que é nula.

Num delírio liberal, apetece mesmo de-fender a entrega da autarquia à gestão privada - competente, regulada, fiscalizada... - com os melhores urbanistas, arquitectos, engenheiros, sociólogos, a repensar tudo em função apenas da cidade e dos cidadãos, e não da gigantesca teia que cerca os paços do concelho....

Para quem mora em Lisboa, vive o caos instalado na cidade, não vê luz ao fundo do túnel (no sentido literal, mas também imagético) e há dezenas de anos assiste à delapidação diária e consecutiva da qualidade de vida na cidade, não há outra forma de olhar a câmara municipal - a não ser como um "edifício" doente que precisa com urgência de uma reforma de fundo. Ora, há doenças para as quais a cura é a morte. Para dar lugar ao renascimento. Esse é, cada vez mais claramente, o caso de Lisboa...
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