Durante anos foram o supra-sumo do kitsch em Portugal. De dimensão desproporcionada, tinham as fachadas revestidas a azulejo de interior, por regra de cor e padrão duvidosos. Eram as casas tipo maison, que polvilharam a paisagem rural de ruído visual, num corte abrupto com materiais e técnicas tradicionais de construção e todo o seu saber-fazer.
Erguidas com as próprias mãos, com as poupanças de uma vida de trabalho longe do país, era apesar de tudo possível compreender o sentido destas casas espalhafatosas e a razão por que não podiam ser de outra maneira. O que já não se compreende é que hoje, cidade fora, mesmo em intervenções de recuperação do edificado apontadas como irrepreensíveis e que envolveram avultados investimentos, se vejam detalhes que, em rigor, não são muito diferentes dos que caracterizaram a ridicularizada casa tipo maison: não já os azulejos de cozinha e de casa-de-banho a revestir fachadas, mas o uso crescente de caixilharias de alumínio e de PVC lacados adornando janelas e de fechaduras e puxadores claramente de interior adornando a “porta da rua”.
Poderá sempre dizer-se que estas escolhas são reversíveis. Certamente que o são. O problema é que, enquanto lá estão, dão um péssimo sinal para o exterior - o de que se pode dar uma obra como acabada mesmo que esse toque final deite tudo a perder. Enquanto isso, e em nome da modernidade, elementos de serralharia artística e azulejos irrepetíveis – como aqueles que, como aqui vimos há dias, são roubados com a maior das calmas – vão direitinhos para o lixo. Como no contentor de entulho acabam belíssimas cantarias e portas de madeira trabalhada, corrimões, caixas de correio ou elevadores antigos e tudo o mais que, mesmo nos edifícios de tipologia mais modesta, era acarinhado. A preocupação de cuidar dos detalhes transformou-se hoje numa coisa sem a menor importância.
Toda a razão do mundo. As pessoas parecem cegas, direitinhas casa-trabalho e só vivem para o telemóvel, a aparelhagem e o plasma ... e o inevitável carro. Os mais afortunados ainda podem aspirar ao seu Golden Retriever. Tudo o mais confunde os sentidos. Detalhe, para quê?
ResponderEliminarBj. PF
Eu sou das pessoas que repara nisso e tenho pena..
ResponderEliminarEspecialmente quando vejo devolutas, á espera que caiam casas com essas caracteristicas e alguns meses depois destas cairem surgirem torres todas metalizadas ou edificios revestidos a azulejos que lembram azulajos de casas de banho coloridos, mas com faxadas completamente paralelepipedas.
Mas o que fazer? Abaixos assinados? manifestações? em regra geral são coisas que não resultam..
Ainda não há por parte de muita gente a capacidade de ver a destruição e o aspecto de degradação que tal facto dá á cidade, ainda há muita gente a achar que os predios antigos devem ser destruidos e que são feios e aqueles mamarrachos que vemos aparecer é que são bonitos.
Eu acho seriamente uma parte da culpa disso, está na falta de educação cultural das pessoas, mas ao preço a que está a cultura..
Como eu a percebo! Todos os dias reparo em pormenores fabulosos da nossa cidade - e raramente são obra dos últimos 20 anos. Até ao príncipio dos anos 70 ainda se tinha cuidado com a pormenorização dos edifícios: uma porta de prédio com um desenho único, um candeeiro na entrada, a guarda de uma varanda, etc. Agora, é tudo escolhido por catálogo, já nada é feito com a exclusividade de outrora (hoje em dia apenas os projectos de excepção, Siza, etc, é que ainda continuam essa tradição do desenho dos detalhes). Lisboa está a ficar mais pobre, plana, raza. Na zona do Areeiro-Roma-Alvalade não passa uma semana sem que eu veja a destruição de pormenores especiais.
ResponderEliminarObrigada a todos pelos vossos comentários.
ResponderEliminarÉ verdade, Paulo, se a procura frenética de tudo isso tivesse equivalente na preocupação em relação a tudo o resto, seríamos um país bem diferente... Muitas das coisas inacreditáveis que vemos acontecer na cidade seriam seguramente mais raras ou não chegariam sequer a acontecer. Mas, apesar de as coisas serem assim, elas não têm necessariamente de ser assim e é nisso que há que continuar a acreditar. Bj, Maria
Caros Estudante de Arq.-Paisagista e F. Jorge:
É possível que, nalguns casos, a sensibilidade para estas questões já lá esteja desde o berço, mas a formação - e o insistir, insistir -também algum resultado terá para quebrar esta indiferença generalizada. Ocorre-me, por exemplo, o papel decisivo que o consumidor final tem: se quem procura casa ou escritório for mais exigente nas suas escolhas, certamente que promotores, projectistas e construtores acabarão por perceber que também eles terão de o ser.
Mas afinal para que servem as Juntas de Freguesia? Leio e releio este blogue e em todas a noticías, em todos os comentários não encontro exemplos de defesa dos residentes e dos seus direitos por parte das Juntas de Freguesia. É lamentável desperdiçar assim a democracia. Ou será que temos os autarcas que merecemos?!... É preciso ser exigente, comprometido com a sociedade, responsável e passar palavra.
ResponderEliminarCarlos M.
Lisboa
Caro Carlso M.,
ResponderEliminarInfelizmente, as Juntas em Lisboa não servem rigorosamente para nada a não ser para emitirem cartões de eleitor e dar emprego a uma série de pessoas. Haverá, como em tudo, excepções à regra. Mas é assim mesmo. Ponto.