“Uma das coisas que desfavoravelmente impressiona quem visita o nosso País é a incapacidade, aparente ou real, para, com inteligência e dignidade, aproveitarmos a árvore no urbanismo. Há quem fale, à boca pequena, de atávicos instintos arboricidas (…). Por esse País fora, em tantas caricaturas de jardins a que se dá por vezes o nome de parques municipais, raro se nos depara uma árvore verdadeira, uma árvore autêntica (…). Onde acaso existiu, poucas vezes escapou a brutais mutilações que a transformaram em grotesco Quasímodo, sem o mínimo respeito pela dignidade do mundo vegetal (…).
Num país castigado por uma ardente canícula, dir-se-ia que temos horror à sombra; onde se pediam arvoredos frondosos e acolhedores, o ninho de um oásis a suavizar as inclemências do estio, fizemos terreiros imensos, cruamente ensoalheirados e inóspitos; quando tantos dos nossos monumentos lucrariam com uma nobre moldura vegetal que acarinhasse e aquecesse a frieza da pedra ou por vezes quebrasse, com a cortina da folhagem, a monotonia das grandes massas arquitectónicas, e num ou noutro caso escondesse até a sua real pobreza; quando a presença da árvore exaltaria o poder evocador e o poético encanto que emana de tantas ruínas, como acontece aos templos perdidos nos bosques sagrados da Grécia, nós, pela calada, metodicamente, cinicamente, fomos degolando, mutilando, rapando tudo o que tivesse jeito de árvore para não prejudicar as ‘vistas’, tal como faria qualquer ricaço de letras gordas aos empecilhos que ofuscassem ou escondessem os arrebiques pelintras do seu chalet”.
(Joaquim Vieira Natividade, “A Árvore e a Cidade”)
Nome-chave da Agronomia e da Silvicultura em Portugal, Vieira Natividade (1899-1968) escreveu o texto que, em parte, acima se transcreve, em 1959. Se fosse vivo, que escreveria perante o que, por estes dias, nos é dado ver em Lisboa?
E, tal como ele, que escreveria Francisco Caldeira Cabral (1908-1992), outro mestre, pioneiro da Arquitectura Paisagista entre nós? Que, no seu clássico “A Árvore em Portugal”, nos lembrará sempre: “As árvores, como os homens, têm cada vez piores condições de vida na cidade moderna, o que torna cada vez mais urgente o desenvolvimento de uma política séria de espaços verdes que permitam conservar condições razoáveis de vida. Mas ao passo que o homem se pode deslocar nos fins-de-semana e no Verão, a árvore não tem férias, está sempre no seu posto. Se a queremos conservar na cidade temos de a tratar o melhor possível (…)”.
Muito se ganharia se quantos têm nas mãos a gestão desta cidade os (re)lessem e aprendessem com o seu saber e a sua humildade.
Num país castigado por uma ardente canícula, dir-se-ia que temos horror à sombra; onde se pediam arvoredos frondosos e acolhedores, o ninho de um oásis a suavizar as inclemências do estio, fizemos terreiros imensos, cruamente ensoalheirados e inóspitos; quando tantos dos nossos monumentos lucrariam com uma nobre moldura vegetal que acarinhasse e aquecesse a frieza da pedra ou por vezes quebrasse, com a cortina da folhagem, a monotonia das grandes massas arquitectónicas, e num ou noutro caso escondesse até a sua real pobreza; quando a presença da árvore exaltaria o poder evocador e o poético encanto que emana de tantas ruínas, como acontece aos templos perdidos nos bosques sagrados da Grécia, nós, pela calada, metodicamente, cinicamente, fomos degolando, mutilando, rapando tudo o que tivesse jeito de árvore para não prejudicar as ‘vistas’, tal como faria qualquer ricaço de letras gordas aos empecilhos que ofuscassem ou escondessem os arrebiques pelintras do seu chalet”.
(Joaquim Vieira Natividade, “A Árvore e a Cidade”)
Nome-chave da Agronomia e da Silvicultura em Portugal, Vieira Natividade (1899-1968) escreveu o texto que, em parte, acima se transcreve, em 1959. Se fosse vivo, que escreveria perante o que, por estes dias, nos é dado ver em Lisboa?
E, tal como ele, que escreveria Francisco Caldeira Cabral (1908-1992), outro mestre, pioneiro da Arquitectura Paisagista entre nós? Que, no seu clássico “A Árvore em Portugal”, nos lembrará sempre: “As árvores, como os homens, têm cada vez piores condições de vida na cidade moderna, o que torna cada vez mais urgente o desenvolvimento de uma política séria de espaços verdes que permitam conservar condições razoáveis de vida. Mas ao passo que o homem se pode deslocar nos fins-de-semana e no Verão, a árvore não tem férias, está sempre no seu posto. Se a queremos conservar na cidade temos de a tratar o melhor possível (…)”.
Muito se ganharia se quantos têm nas mãos a gestão desta cidade os (re)lessem e aprendessem com o seu saber e a sua humildade.
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Créditos imagem: Vincent van Gogh, Caminho com Choupos, 1884
Rijksmuseum Vincent van Gogh, Amesterdão
(...) lindo!
ResponderEliminar-imagem e texto.