19/07/2007

Geomonumentos de Lisboa em risco de se perderem para sempre


Nas fotos: Geomonumentos em Lisboa. Dois casos: em cima, o de Rio Seco,
abandonado; em baixo, o da Sampaio Bruno, preservado.

Monumentos com milhões e milhões de anos deviam ser pólos museológicos

O que são os «geomonumentos»? Ninguém melhor para explicar isso do que o Prof. Galopim de Carvalho, que um dia tive a honra de entrevistar para rádio e que me explicitou tudo, como agora fez noutra entrevista onde explica com rigor o que são estas formações geológicas especiais: «Geomonumento, como o nome indica, é um monumento de natureza geológica. E monumento, se formos ver a raiz da palavra, quer dizer aquilo que se lega, aquilo que perpetua uma memória. Uma rocha, em certas circunstâncias, tem esta característica de monumentalidade e, como é de natureza geológica, é juntar a palavra, geomonumento. Uma pedra pode ser um monumento, a questão é ela ter significado. E esse significado que ela tem é o testemunho de uma certa página da história da Terra. Para ler esse testemunho é preciso conhecer as letras, os caracteres dessa escrita. E esses caracteres dessa escrita são os minerais, são os fósseis, são outras particularidades que o geólogo aprende a decifrar».
Diz ainda Galopim de Carvalho: «Em Lisboa há alguns afloramentos rochosos que eu entendi considerar como geomonumento e que propus à Câmara a sua salvaguarda. O que se fez. Em nome do Museu assinei um protocolo com a Câmara Municipal de Lisboa em 1998 para criar esses geomonumentos da cidade. A Câmara assumia a obrigatoriedade de os musealizar, de os preservar, de os valorizar e de os manter. O Museu, ao abrigo desse mesmo protocolo, era a entidade científica com capacidade de fazer tirar deles o proveito pedagógico e cultural que eles encerram. Mas esses geomonumentos, agora, estão ao abandono. E outros caíram no esquecimento ou perderam-se».

Recomendação da Assembleia Municipal

Há uns tempos, a Assembleia Municipal de Lisboa foi surpreendida com uma iniciativa de um pequeno grupo de deputados seus para criação de um «exo-museu» e para salvaguarda de um geomonumento concreto. No caso, o de Rio Seco. Terá 90 a 95 milhões de anos. A iniciativa foi de «Os Verdes» em meados de Abril deste ano. A Assembleia em peso aprovou as duas recomendações para que a Câmara respeitasse este seu compromisso para com a Museu de História Natural – firmado em letra de forma naquele Protocolo de 1998. Tudo para que não aconteça o mesmo que já aconteceu, por exemplo, ao geomonumento que havia na Travessa das Águas Livres, datado de há 30 milhões de anos e que foi… destruído. Ou como se vê «nalguns casos, (que) se estão a degradar, como aconteceu com o roubo do painel do pólo da Av. Gulbenkian». Como tantos. Como por pouco não acontecia há 12 anos com as marcas de dinossauros em Carenque, ao tempo de um governo de Cavaco Silva: a CREL em construção levava tudo à frente, claro, com a insensibilidade digna de uma obra urgente. A opinião pública e publicada (incluindo um programa de rádio que então eu editava) evitou o pior, com apoio do então PR, Mário Soares e de muitas figuras públicas.

Lista oficial dos 11 geomonumentos de Lisboa (Estudo do Museu de História Natural aceite pela CML)

1 - Avenida Infante Santo. Camadas de Calcário com sílex. 90 a 95 milhões de anos. Geomonumento implantado.
2 - Avenida Infante Santo. Afloramento de Calcários, recifal. 90 a 95 milhões de anos. Carece de estudo.
3 - Av. Duarte Pacheco (Sete Moinhos). Calcários do Cretácio. 90 a 95 milhões de anos. Geomonumento implantado.
4 - Av. Gulbenkian. Afloramento de Calcários do Cretácio. 90 a 95 milhões de anos. Geomonumento implantado.
5 - Rua Fialho de Almeida. Manto Basáltico do Cretácio Superior. 71 milhões de anos.
6 - Travessa das Águas Livres. Terraço flurio-marinho do Cenozóico Inferior. 30 milhões de anos. Destruído.
7 - Pedreira da Serafina. Calcários Marinhos do Cretácio Médio. 95 milhões de anos.
8 - Rio Seco. Calcários do Cretácio. 90 a 95 milhões de anos.
9 - Rua Sampaio Bruno. Fundo Marinho de uma plataforma recifal com briozoários. 24 milhões de anos). Geomonumento implantado.
10 - Rua Amílcar Cabral. Estratos sedimentares do miocénico com camadas areno-argilosas e calcárias fossilíferas. Classificação em projecto.
11 - Boa Hora / Aliança Operária. Escuada basáltica do Cretácio Superior.

6 comentários:

  1. Fantástico este Post.
    O vale de Rio Seco, na zona da Ajuda é practicamente desconhecido dos Lisboetas. Apesar de ser muito bonito, e ter esta caracteristica referida, está practicamente abandonado. Julgo que o mesmo era o local do antigo Campo das Salésias, onde se disputaram varias finais da Taça de Portugal antes de 1944. No entanto e como disse, o local está ao abandono.

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  2. Caro José Carlos Mendes,
    Está prevista a construção de um empreendimento imobiliário para habitação/comércio na Avenida Infante Santo/Calçada das Necessidades,Nos. 8 a 10.
    Tal empreendimento irá ser construído sobre um geomonumento aceite como tal pela CML, em protocolo estabelecido com o Museu Nacional de História Natural, em 22/06/1998.
    A Associação Lisboa verde, e-mail:associacao@lisboaverde.org, vem solicitar a sua colaboração no sentido de salvaguardar este património da cidade.
    Pinto Soares

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  3. Excelente post, sim senhor, parabéns! E um registo imprescindível para um acompanhamento do estado de cada um dos geomonumentos. O da Fialho de Almeida está em perigo iminente... e o de Rio Seco é uma vergonha ... tal como todo o vale, aliás. Há que pegar em ambos, e rapidamente.
    Fiquemos alerta!
    Abraço

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  4. Bem escrito :-)
    E isto quando há o protocolo e para Rio Seco havia um bom projecto de valorização e a perspectiva de construção de um núcleo museológico da geologia da cidade, como descobrimos quando por lá fizemos (Verdes) a visita (com o presidente da JFA).
    Abs
    Sofia

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  5. É forçoso salvar os geomonumentos. A começar pelos que correm risco real e iminente. Vamos ter de inventar uma operação especial nesse sentido. Em Setembro. Fica prometido?

    Um abraço a todos.

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  6. olá, sou uma aluna do 11º ano de ciencias e tecnologias, e gostava de saber onde ficavam estes geomonumentos para poder fazer um roteiro geologico de Lisboa...
    obrigada

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