Relativamente a um post, que escrevi noutro blog, sobre a tendência para apontar o dedo ao "desmazelo" dos peões como causa dos atropelamentos, recebi um comentário por mail bem interessante de um português a viver na Alemanha.
Republico aqui porque o acho de extrema importância:
Republico aqui porque o acho de extrema importância:
Como português que fez a carta de condução na Alemanha não posso deixar de comentar este post.
Primeiro: não só na Holanda, como também na Alemanha (e acredito que em grande parte da Europa) a lei parte sempre do princípio que num incidente (para não falar logo de acidentes) rodoviário envolvendo também peões ou ciclistas, a culpa está do lado do automobilista. Está claro que a minha reacção na altura que soube desta lei (e ainda com a minha típica mentalidade portuguesa) foi a de pensar "estes alemães são é malucos, então o peão é que faz a merda e o automobilista é que paga, mas que estupidez!".
Um exemplo que o nosso instrutor gostava muito de dar para justificar a lei era o seguinte:
Imagine-se como condutor numa zona residencial, estrada não muito larga, à esquerda e à direita densas filas de automóveis estacionados que não lhe permitem como condutor de ver o que se passa por detrás delas. Uma das situações mais típicas que se podem passar nestas condições (e como dizia, estamos numa zona residencial) é a de haver por detrás destas autênticas muralhas de automóveis uma ou mais crianças a brincarem com a sua bola de futebol, que mais cedo ou mais tarde acaba por saltar para o meio da rua. É claro que a reacção espontânea de qualquer criança é a de correr atrás da bola, inconsciente do perigo à qual está exposta ao reagir desta maneira. A probabilidade de um condutor atropelar uma criança nestas circunstâncias é bastante grande, e maior ainda é a probabilidade do atropelamento ser mortal, quanto mais alta for a velocidade do condutor. Uma reacção típica em Portugal seria qualquer coisa do género "Ó pá, é uma tragédia a criança ter morrido, mas olha, acontece. Da próxima vez que tome mais atenção! E está claro que a culpa é dos pais que não estavam no local para tomar conta das crianças." Tal comentário parece quase macabro, mas infelizmente é a realidade no nosso país.
Recordo uma tragédia que se passou no meu bairro há coisa de 15 anos atrás: era carnaval e um bom amigo do meu irmão (na altura teria uns 10 anos), ao fugir de outras crianças que lhe atiravam com ovos (outra tradição de carnaval que nunca cheguei a compreender), correu para o meio da rua onde um automóvel a "alta" velocidade (isto no meio de um bairro residencial) o atropelou mortalmente. O bairro todo ficou chocado com o sucedido, mas o comentário geral das pessoas foi "Ó pá, são azares da vida! Pena, era um puto tão bacano ...Também, que coisa mais estúpida essa de se atirarem com ovos." Em nenhuma altura se considerou o condutor responsável pelo atropelamento como culpado do que quer que seja... O sucedido foi pura e simplesmente aceite como um azar da vida. Ora, um condutor envolvido numa mesma situação na Alemanha ou na Holanda muito provavelmente teria ido parar na cadeia. E porquê? Devido à tal lei, que culpabiliza sempre o condutor - o que entretanto me parece mais que lógico, porque quem sai a perder são sempre o peões e os ciclistas. O resultado de uma tal lei é que os condutores preferem reduzir a sua velocidade e adaptá-la às circunstâncias, em vez de terem que passar parte de suas vidas na prisão. E acreditem-me que uma tal lei intimida qualquer condutor e poupa muitas vidas.
Primeiro: não só na Holanda, como também na Alemanha (e acredito que em grande parte da Europa) a lei parte sempre do princípio que num incidente (para não falar logo de acidentes) rodoviário envolvendo também peões ou ciclistas, a culpa está do lado do automobilista. Está claro que a minha reacção na altura que soube desta lei (e ainda com a minha típica mentalidade portuguesa) foi a de pensar "estes alemães são é malucos, então o peão é que faz a merda e o automobilista é que paga, mas que estupidez!".
Um exemplo que o nosso instrutor gostava muito de dar para justificar a lei era o seguinte:
Imagine-se como condutor numa zona residencial, estrada não muito larga, à esquerda e à direita densas filas de automóveis estacionados que não lhe permitem como condutor de ver o que se passa por detrás delas. Uma das situações mais típicas que se podem passar nestas condições (e como dizia, estamos numa zona residencial) é a de haver por detrás destas autênticas muralhas de automóveis uma ou mais crianças a brincarem com a sua bola de futebol, que mais cedo ou mais tarde acaba por saltar para o meio da rua. É claro que a reacção espontânea de qualquer criança é a de correr atrás da bola, inconsciente do perigo à qual está exposta ao reagir desta maneira. A probabilidade de um condutor atropelar uma criança nestas circunstâncias é bastante grande, e maior ainda é a probabilidade do atropelamento ser mortal, quanto mais alta for a velocidade do condutor. Uma reacção típica em Portugal seria qualquer coisa do género "Ó pá, é uma tragédia a criança ter morrido, mas olha, acontece. Da próxima vez que tome mais atenção! E está claro que a culpa é dos pais que não estavam no local para tomar conta das crianças." Tal comentário parece quase macabro, mas infelizmente é a realidade no nosso país.
Recordo uma tragédia que se passou no meu bairro há coisa de 15 anos atrás: era carnaval e um bom amigo do meu irmão (na altura teria uns 10 anos), ao fugir de outras crianças que lhe atiravam com ovos (outra tradição de carnaval que nunca cheguei a compreender), correu para o meio da rua onde um automóvel a "alta" velocidade (isto no meio de um bairro residencial) o atropelou mortalmente. O bairro todo ficou chocado com o sucedido, mas o comentário geral das pessoas foi "Ó pá, são azares da vida! Pena, era um puto tão bacano ...Também, que coisa mais estúpida essa de se atirarem com ovos." Em nenhuma altura se considerou o condutor responsável pelo atropelamento como culpado do que quer que seja... O sucedido foi pura e simplesmente aceite como um azar da vida. Ora, um condutor envolvido numa mesma situação na Alemanha ou na Holanda muito provavelmente teria ido parar na cadeia. E porquê? Devido à tal lei, que culpabiliza sempre o condutor - o que entretanto me parece mais que lógico, porque quem sai a perder são sempre o peões e os ciclistas. O resultado de uma tal lei é que os condutores preferem reduzir a sua velocidade e adaptá-la às circunstâncias, em vez de terem que passar parte de suas vidas na prisão. E acreditem-me que uma tal lei intimida qualquer condutor e poupa muitas vidas.
Existe um link que seja para essa pretensa lei? Pode ser em alemão que eu não me importo. Pago um café a quem conseguir.
ResponderEliminarÉ tão tonto dizer-se que a culpa é só dos peões, como dizer-se que nunca o é - infantilizando-os.
ResponderEliminarPor vezes há grande confusão entre a RESPONSABILIDADE no acidente e as CONSEQUÊNCIAS dele.
Claro que as consequências são mais gravosas para o peão, mas isso é outro assunto.
O que está em causa é a realidade de que, por vezes, também tem culpa - e isso não pode nem deve ser escamoteado.
Além disso, as suas obrigações estão bem escarrapachadas no nosso Código da Estrada. O facto de as coimas (que vão até 50 ou 60 euros) não serem aplicadas é também outro assunto, e bem grave.
Por vezes, é preciso obrigar o principal interessado a proteger-se, como sucede com o cinto-de-segurança ou o uso do capacete nas obras.
Que diabo! Será pedir muito ao principal interessado que também faça a sua parte na segurança rodoviária - a começar por si mesmo?!
Torna-se é um pouco aborrecido para o principal interessado os automobilistas não respeitarem passadeiras e/ou aqueles semáferos com sinal intermitente para o automobilista enquanto o sinal verde, para o peão, transmite uma falsa sensação de segurança...
ResponderEliminarConcordo q todos devemos contribuir para a segurança, mas o corpo humano é certamente mto mais frágil q um parachoques...
À parte estes pequenos detalhes e a falta de civismo, tudo bem...
mb
Há anos que me desloco em Lisboa diariamente, de carro, de garagem em garagem. Casa-emprego-supermercado-cinema-ginásio-etc, encontro garagens por todo o lado. É bastante normal viver-se em Lisboa, sem se ser peão. Julgo que mesmo que essa é uma das ambiçoes de muitos Lisboetas. Vendem-nos casas com garagem, centros comercias com cinema, ginásio, lojas, etc e... garagem.
ResponderEliminarPrémio mais cobiçado em qualquer concurso? Um carro!
Lisboa está feita para andar de carro. E somos muitos a andar de carro. Que peões sobram então?
Os putos, os velhos, os utilizadores de um sistema de transportes públicos que os deixa em stress constante, logo, peões de alto-risco.
Tem toda a razão o Carlos Medina Ribeiro. Tudo o que acabou de dizer está certo. Eu sei, como disse, só ando de carro, tenho mesmo de topar os peões à légua. Logo, a minha primeira lei é: os peões são os bons, e nós os maus (Na cabeça dos peões). Não vou discutir este assunto com eles, é óbvio que perco, quanto mais não seja, porque, se alguém se apresenta na frente de um carro, em evidente desvantagem física, a exigir ganhar uma batalha... é meio louco, mais vale ter isso em conta e encolher os ombros.
2ª lei: sei que as passadeiras me podem aparecer onde menos as espero. (Quem as manda colocar em planta, deve ser tão peão quanto eu e sado-mazo, visto que gosta de matar e pagar por isso.)
3ª lei: mal saio deste País, uso e abuso de ser peão. Vingo-me. Atravesso toda e qualquer passadeira sem olhar à esquerda nem à direita, nas calmas, e, se estiver bem disposto, ainda volto para trás, a meio do caminho, porque sei que automobilista algum vai pôr um pára-choques que seja sobre a passadeira ANTES de eu estar em cima do passeio.
Porque se o fizer, está lixado. Está a quebrar uma lei. E tem tantos anos de leis e de olhos da lei em cima dele, que nem pensa duas vezes. Está mais do que lixado, está civilizado.
Moral da minha história:
O problema somos nós Portugueses. Peões, ciclistas, automobilistas, motards, o que quiser. Ninguém respeita ninguém. Ninguém faz ninguém respeitar ninguém.
Os peões não são multados, os automobilistas não são multados (só não estaciona em cima dos passeios quem não quer, não é quem tem medo da multa, todos sabemos onde se consegue andar a 100 à hora sem que ninguém nos apanhe - e no geral os peões até fogem do barulho dos carros), andar fora de casa, seja por que meio for, sempre foi entrar na selva. E, na selva, há animais muito, muito espertos, animais muito, muito estúpidos, animais assim, assim, mas o que não há, é gente civilizada.
O injusto, a chatice, é que um peão dificilmente atropela mortalmente um carro.
E essa é que é essa.
Porque senão...
cadeia na holanda? o senhor não sabe do que fala, é altamente improvável por atropelamento
ResponderEliminara am/ experiencia de peão em amersterdão está muito longe de ser a mais feliz
E CONCORDO QUE ATRRIBUIR CULPAS Á PARTIDA A UM OU OUTRO DOS ENVOLVIDOS É INFANTIL, DESCABIDO E FALSO
nuno caiado, peão
O sr Filipe Melo Sousa tinha tantas certezas em duvidar da existência da lei, que só quis apostar um café.. Eu compreendo.
ResponderEliminarNão encontrei a lei, mas o autor do texto original encontrou uma notícia no Spiegel que refere um caso onde a lei foi aplicada. E só foi notícia porque a lei foi aplicada num âmbito ainda mais "surpreendente" aos olhos de um português. A lei refere-se a comportamentos negligentes dos peões, mas neste caso a interpretação foi mais longe e foi aplicada com um comportamento incorrecto do peão.
www.spiegel.de/auto/aktuell/0,1518,426574,00.html
Uma traduçãozinha para quem não fala alemão:
Peão comete erro – Condutor é culpado
Não são raras as vezes que acidentes de gravidade são causadas devido ao comportamento negligente de peões ao atravessarem uma estrada.
Na maioria dos casos é o automobilista a ser culpabilizado. Tal também é valido aquando dum comportamento incorrecto da parte do peão – assim o decidiu um tribunal superior.
Por princípio os automobilistas devem poder contar com um bom comportamento de qualquer peão adulto na via pública. São no entanto obrigados a reagir imediatamente, mal seja óbvio que um peão esteja a comportar-se incorrectamente e de que a situação se possa tornar perigosa. Assim consta num veredicto emitido pelo tribunal superior de Rostock, informa o grupo de trabalho “código da estrada” da associação alemã de advogados.
No caso concreto trata-se da iniciativa de uma senhora de 71 anos de atravessar uma estrada fora da sua localidade. Na acto da travessia acabou por ficar parada na faixa da esquerda, apesar de ter tido a possibilidade de finalizar a travessia antes que viesse o próximo carro. Entretanto aproximava-se um carro a um velocidade de 80 Km/h. Pouco antes do carro alcançar o local onde se encontrava a senhora, esta retomou subitamente a sua travessia, sendo atropelada e gravemente ferida. Em reacção ao sucedido a sua segurança social acuso o automobilista.
O tribunal teve que constatar, que grande parte da culpa no acidente se devia ao comportamento do peão, que deveria ter aproveitado a possibilidade de atravessar a estrada enquanto podia. No entanto, devido ao comportamento insólito do peão com o qual a condutora se viu confrontada, ela deveria ter reduzido da velocidade e preparado-se para qualquer eventualidade que exigisse uma travagem brusca. Os juízes concluíram, que num caso normal, ou seja, de um peão se encontrar na margem da estrada, um condutor não precisa de partir do princípio de que o peão possa ter um comportamento incorrecto. No caso presente o peão encontrava-se no meio da estrada. O automobilista tinha se dado conta de tal comportamento fora do vulgar e deveria ter reagido.
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Quanto ao café, não gosto de ganhar apostas fáceis. Ofereça ao próximo peão que não respeitar numa passadeira
Olha, mais um exemplo:
ResponderEliminarwww.spiegel.de/auto/aktuell/0,1518,426145,00.html
Destaco agora (já sem tradução):
Ein bayerisches Gericht hat jetzt einen Autofahrer dazu verurteilt, einen Teil eines Schadens zu übernehmen. Obwohl er unschuldig war.
A reacção de alguns dos comentadores, quer de incredibilidade, como de alguma irritação e incompreensão de uma regra muito simples, não é mais que um choque cultural de quem está habituado a viver numa sociedade onde se acha que se pode chegar à equidade de direitos pelo simples facto que a lei é igual para todos.
ResponderEliminarAlguns países já concluiram há vários anos que a melhor forma de garantir a equidade e o bem-estar, é beneficiar claramente o mais vulnerável:
"Dutch traffic law was changed in 1998 regarding accidents involving cyclists and pedestrians so that motorists are now considered to be wholly at fault. Having the right of way does not excuse motorists from hitting cyclists and pedestrians and the courts require that motorists anticipate unsafe walking and cycling behaviour. That applies even to illegal behaviour and insurance companies pay damages to cyclists and pedestrians automatically regardless of guilt."
Não esquecer que, quer o peão como o ciclista, não tem que ter qualquer permissão para usar a via pública e como tal um condutor deve conduzir de forma a antecipar movimentos imprevisíveis de uma criança, de um louco ou distraído.
Atenção que não é imputação automática de culpa, mas sim de responsabilidade civil coberta pela seguradora.
Em caso de grave negligencia do peão ou ciclista, e caso o motorista queira ir a tribunal, jurisprudência indica que a quase totalidade dos casos é pelo menos uma divisão de custos 50/50 no caso de adultos ou 100% desfavorável ao condutor no caso de crianças com menos 14 anos.
Joana
Este comentário foi removido pelo autor.
ResponderEliminarOra cá vai mais um exemplo da Holanda:
ResponderEliminarhttp://www.dutchnews.nl/news/archives/2008/04/drunk_driver_gets_two_years_ja.php
2 anos de cadeia por um atropelamento mortal