Exmo. Senhor Ministro da Cultura,
Como será do conhecimento de V.Exa. assiste-se hoje em Lisboa, e no resto do país, a um agudizar de uma crise que já vem longa: referimo-nos ao sucessivo fecho das salas de cinema independentes e ao estrangulamento do mercado de distribuição, naquilo que se afigura como um claro abuso de posição dominante; situação que, como V.Exa. reconhecerá, contraria o dispositivo normativo da União Europeia.
O estertor do Quarteto é disso prova evidente. A situação não é nova, como referimos, mas é cada vez mais insuportável.
Não somos contra contra as 'Majors', muito menos contra os filmes norte-americanos. Somos, apenas, e usando uma expressão de conhecido economista norte-americano, pelo direito a sermos free to choose, ou seja, achamos que não somos menos que os nossos vizinhos espanhóis, franceses ou alemães: queremos ter acesso às demais filmografias, em particular às europeias, que há 25-30 anos eram tão populares entre nós quanto a norte-americana, com públicos entusiastas e salas de cinema a condizer, em que o Quarteto, a sala estúdio do Cinema Império, ou, mais recentemente, os Cinemas King, desempenharam um papel fundamental na resistência à hegemonia do 'blockbuster'.
Por outro lado, em Portugal, em Lisboa, em particular, não há assim tantas salas de cinema de reconhecido valor arquitectónico ou histórico. Já não existem cinemas emblemáticas como o Eden (inexplicavelmente transformado em aparthotel) ou o Monumental (demolido a bel-prazer do poder autárquico da altura), ou salas de bairro (tão importantes para a vida de um bairro habitacional, como os mercados, as esquadras ou as igrejas) como o Alvalade, o Cine Royal ou o Paris. Apenas restam como sobreviventes, cada um à sua época, cada um com a sua estética e o seu inegável potencial: Capitólio, Odéon e São Jorge.
Cremos, por isso, necessária uma intervenção urgente, de quem de direito, nestas três salas, designadamente, garantindo a valência «cinema» ao Capitólio; uma programação adequada, ao São Jorge (porque não 'a' sala do cinema português?); e uma recuperação atenta e uma exploração bem estruturada, ao Odéon (porque não 'a' sala do circuito 'indie'?). Lisboa e o país precisam do Capitólio, do São Jorge e do Odéon.
Por outro lado, certamente que em sede de regulamentação da Lei do Património - cujo grupo de trabalho opera sob a tutela do Ministério da Cultura - será possível fazer alguma coisa para que, em caso de mudança de titularidade ou de cessação de actividade, seja respeitado o uso original destes espaços.
Além disso, os circuitos internacionais de festivais, cada vez mais frequentes, podem ser um elemento vital para a projecção internacional do nosso país, e nada melhor que termos salas adequadas a esses festivais. Salas que se situem na «espinha dorsal» de Lisboa, que é a Avenida da Liberdade. Ora, os três cinemas referidos encontram-se nesse eixo, onde existe habitação, hotéis, miradouros, elevadores históricos, teatros, palácios, igrejas e restauração.
Por favor, Senhor Ministro, ajude a resolver, de uma vez por todas, o problema do mercado de distribuição e exibição em Portugal, e ajude a capital deste país a ter de volta uma rede condigna e valiosa de salas de cinema.
Paulo Ferrero, Carlos Brandão, Fernando Jorge, Hugo Daniel de Oliveira, Jorge Silva Melo, José Carlos Mendes, Júlio Amorim, Maria Amorim Amorais, Mário Miguel, Miguel Atanásio Carvalho, Nuno Caiado e Virgílio Marques
"queremos ter acesso às demais filmografias, em particular às europeias, que há 25-30 anos eram tão populares entre nós"
ResponderEliminarJá têm. Essas produções até são favorecidas através de avultados subsídios pagos por pessoas que não estão interessadas em ver.
Caro Filipe, sempre no seu melhor.
ResponderEliminarNeste caso o que penso que os autores se referem é, não tanto a certas “filmografias” produzidas para salas vazias que, embora tenham o seu espaço como ensaios culturais de alguma forma estarei de acordo que os párocos subsídios devem ser mais bem geridos, mas referem-se sim a "filmografias" de reposição "nomeadamente europeias, que há 25-30 anos eram tão populares entre nós". Relembro por exemplo a reposição recente no Quarteto do Leopardo, reposição essa que só por si foi um êxito.
Um abraço
Jorge Santos Silva
Parabéns à todos para esta iniciativa. A cinema de qualidade merece mais atenção, com certeza. É um parte integrante da nossa cultura moderna.
ResponderEliminarGilbert
o problema e que o mercado de cinema em portugal nao tem interresse em manter cinemas de reposiçoes , pois as distribuidoras de filmes querem o lucro facil de colocar de imediato os filmes em dvd ou em tv cabo .
ResponderEliminareu pessoalmente ( presidente da associaçao cine cultural da amadora ) tentei manter uma politica de reposiçoes no quarteto , mas como os grandes grupos de exibiçao em portugal nao estavam a gostar de haver publico na minha programaçao , obviamente o quarteto passou a ser um cinema a abater e como tal encomendou-se o encerramento a quem o poderia fazer com mais poder .
Carlos Pagara