Foi há dez anos, a assinalar no próximo mês de Maio, que se acreditou ser possível fazer cidade nova sem cometer os erros do passado. E os erros da cidade – Sevilha – que nos passara o testemunho de uma exposição internacional, mundial no caso de Lisboa. Tendo tido profissionalmente o privilégio de estar entre os que a viram nascer do zero até se extinguir o último fio de luz que a encerrou, recordo-me da alegria genuína com que aquele recinto se enchia diariamente. Por uma vez, um pedaço de cidade era pensado para as pessoas. E elas responderam, cuidando dele de forma excepcional.
Acreditou-se, então, uma vez mais genuinamente, que o grau de exigência se elevaria. Não se elevou, bem pelo contrário. Dez anos passados, o que foi a Zona de Intervenção da Expo’98 e áreas adjacentes transformou-se numa gigantesca Brandoa Classe A, onde cada um construiu como quis e o mais que pôde e mais construiria se mais terreno livre houvesse. Frenética, irresponsável e atabalhoadamente. A ideia peregrina de que o Parque das Nações seria assimilado pelo resto da cidade trataria do resto, com os sinais de desleixo a serem hoje já óbvios: coisas tão simples como as casas-de-banho públicas que serviram o recinto da Exposição estão hoje seladas, não obstante esta se ter tornado a principal zona de lazer de ar livre da Grande Lisboa.
Recordo-me que nesse dia de encerramento, há quase dez anos, havia no ar um sentimento misto, particularmente marcante para quantos nasceram nesta cidade e têm memória dela: um misto de nostalgia pela experiência que se vivera, de expectativa do que seria o futuro. De tanto acreditar que seria possível virar de página, esquecemo-nos que não se deve voltar aos lugares onde se foi feliz.
Acreditou-se, então, uma vez mais genuinamente, que o grau de exigência se elevaria. Não se elevou, bem pelo contrário. Dez anos passados, o que foi a Zona de Intervenção da Expo’98 e áreas adjacentes transformou-se numa gigantesca Brandoa Classe A, onde cada um construiu como quis e o mais que pôde e mais construiria se mais terreno livre houvesse. Frenética, irresponsável e atabalhoadamente. A ideia peregrina de que o Parque das Nações seria assimilado pelo resto da cidade trataria do resto, com os sinais de desleixo a serem hoje já óbvios: coisas tão simples como as casas-de-banho públicas que serviram o recinto da Exposição estão hoje seladas, não obstante esta se ter tornado a principal zona de lazer de ar livre da Grande Lisboa.
Recordo-me que nesse dia de encerramento, há quase dez anos, havia no ar um sentimento misto, particularmente marcante para quantos nasceram nesta cidade e têm memória dela: um misto de nostalgia pela experiência que se vivera, de expectativa do que seria o futuro. De tanto acreditar que seria possível virar de página, esquecemo-nos que não se deve voltar aos lugares onde se foi feliz.
O parque das nações não é o exemplo perfeito de como se deve fazer cidade, mas tem vários aspectos positivos.
ResponderEliminarChamar Brandoa de luxo é, quanto a mim, exagerado para uma zona da cidade que (ainda alguem se lembra??) algo bem diferente antes da Expo.
Com certeza que houve erros, mas o balanço é positivo. Que toda a experiência da Expo, sirva para regenerações (monumentais) na cidade.
existe quinta da marinha para pobre? pois! ;)
ResponderEliminara avaliação da gestão do parque das nações, que a faça quem souber. ao fim de 10 anos, continuo a gostar de lá ir, por isso o receio que tive sobre o exemplo de sevilha não se concretizou.
claro que gostava de ver menos urbanização, mas tomaramos nós que, por exemplo, a Alta de Lisboa tivesse o mesmo standard, mesmo descontando a fruição do rio que o parque das nações proporciona.
coisas a melhorar, há sempre!
António Branco Almeida
Um dos aspectos marcantes do recinto nos meses após o encerramento da exposição era a clara aposta no "afastamento" do automóvel. então, quem queria ir ao Parque das Nações deixava o carro longe e fazia o percurso a pé. Hoje, a realidade é a realidade do resto da cidade. O carro invadiu o espaço, o estacionamento desregrado é a regra, os passeios já não são exclusivos dos peões, e a pergunta é sempre a mesma : Chegaremos lá ?
ResponderEliminarTodos os portugueses tem mau gosto, mas poucos o sabem. Por isso não espanta que se faça um Parque das Nações, ou outra coisa qualquer. O que estava lá antes era igualmente irrelevante, o que virá depois também.
ResponderEliminarMas a verdade é que as pessoas escolheram aquele espaço como zona de lazer, substituiu a Feira Popular, sem sardinhadas, mas com outra fast-food, menos exótica, mais gosto médio internacional , que como se sabe é mau gosto.
Mas é esse o gosto dominante. De modo que está tudo bem, por enquanto. resta ver como se degradará, a seu tempo. A obscolescência dos materiais rápidos e modernos é também rápida, já vejo na neo barroca e pós-moderna estação do Calatrava umas belas rachas prometedoras, além de uma imensidão de vidros sujos. Já vi rachas nas paredes do Oceanário, e musgo paciente que acabará por ganhar a batalha a corroer outras paredes. O tempo "esse infinito idiota" baralha os sonhos dos Candides.
Passo às vezes no meu iate à frente dø melancólico bairro, cheio de torres iguais. Que fazer disto? Lisboa nunca fui Veneza, nunca se entregou aos jogos de água com a eternidade, apenas, passe a rima, a uma troca de tiros de pistola de água com versões indígenas da modernidade.
Quando as cidades são reinvadidas por espaços ao gosto das novas plebes audio-visuais é a altura de reler o Gattopardo. Além disso a filosofia oferece algumas consolações. Por isso, não me preocupa nada o Parque das Nações, nem o seu optimismo catita e quadrado que se vai desvanecendo comido pelo habitante mais preclaro de Lisboa: o automóvel.
Cristóvão de Saa
O grande problema do parque das naçoes: falta de ligação com o resto da cidade, a zona norte e sul vivem completamente à margem de quaisquer transportes públicos. Para quem vive nas urbanizações situadas no topo sul e norte o metro fica longe de mais, deixa de ser uma opção. Falta uma linha de eléctrico rápido que faça a ligação ribeirinha, talvez vindo de algés, e que termine na extremidade sul do parque.
ResponderEliminarHá três anos deixei esta observação algures neste blogue:
ResponderEliminar"Pavilhão de Portugal....símbolo, ou sintoma?
Uma belíssima obra de arquitectura para uma cidade e um povo que a não merece?
Primeiro porque o pavilhão está em estado de abandono e, já aqui estão os primeiros sintomas da incompetência Lusitana. Porque razão não existiu um plano futuro para esse edifício? Provavelmente até existiu, só que futuro nas nossas latitudes parece
ser sinónimo de asneira, imprevisto, incontrolável, não chegamos lá...ponto.
Segundo porque o edifício como símbolo nacional, deveria ter sido construído com qualidade….. Rolls Royce, nem mais nem menos. O melhor, ponto. Infelizmente ficou longe, muito longe disso. Pedras de revestimento a cair, caídas, partidas!? Uma técnica de revestimento com bastantes décadas ....e de execução simples! Porque teria de falhar no ”Bastião Nacional”? Será a aldrabice enfermidade nacional? ....parece que sim, tendo em conta que o Instituto Superior de Economia de Göteborg, foi revestido (com a mesma técnica) por uma equipa de operários portugueses, obra de qualidade impecável e execução minuciosa! Porque razão não encontraram essa equipa para revestir a (melhor?) obra de arquitectura do Portugal contemporâneo?
Mas a vergonha não fica por ai. Lajes partidas, tinta a cair, madeiras totalmente podres ou empenadas! ....passados 7 anos?
A resposta é óbvia: A aldrabice é institucionalizada e sistematizada, os planos do arquitecto são folhas virtuais para criar uma forma ou um volume. O resto tem prazo de garantia como o leite fresco. A ganância, o lucro máximo a curto prazo, o deixa
andar e fecha os olhos dos envolvidos, srs doutores, técnicos e responsáveis com belos títulos em papel, todos a construírem um futuro que já devia ter passado.....há muito. Vergonha Portugal!"
JA
Em dia que não posso precisar, mas que foi um dia 31 de Dezembro de um dos últimos anos do século passado, andando quase todos nós a comemorar os festejos natalícios e do ano novo, o governo de então (PS?, PDS?, pouco interessa) aprovou, e publicou em DR a Revisão do Plano de Urbanização da Expo e, salvo erro, seis Planos de Pormenor. Aparentemente ninguém deu por isso. Por razões profissionais fui obrigado a estudá-los e lembro-me de ter ficado pouco menos que em pânico. Estes apenas passavam as volumetrias existentes para o dobro.Tentei chamar a atenção de quem pude para aquela calamidade, mas sem êxito.
ResponderEliminarPortanto o que lá está não aconteceu por acaso, nem foi acontecendo. Foi premeditado, estudado, projectado e aprovado por alguém com nome e autoridade para tal. Seria bom que agora desse a cara.
Ao contrário do que aconteceu nas Brandoas de antanho o que se passou (passa) na Parque Expo não é fruto de pequenas corrupções de patos bravos e fiscais municipais. Vem de muito mais alto. É fruto de uma política em que o cifrão foi eleito referência máxima para todos os actos desta vida.
Como diz o ditado, não se pode ao mesmo tempo ter sol na eira e água no nabal.
O exemplo claro dessa politica suja do betão é a zona a norte da Ponte vasco da Gama. Nos primeiros planos da Expo essa zona onde se situava a lixeira de Beirolas seria apenas o parque do Trancão, uma zona verde para lazer. Hoje é um imenso parque de estacionamento onde à noite param automóveis longe uns dos outros para que não se veja o que se faz lá dentro, e encostado à antiga lixeira nasceram 9 edificios de habitação e lojas (naquele sitio ???) promovidos por uma imobiliária espanhola.
ResponderEliminarO antigo recinto da Expo 98 encolhe a cada dia que passa. Neste momento é como se fosse umas calças de ganga de boa marca que já foram usadas e lavadas vezes sem conta, a que já se colaram uns remendos, mas que ficaram encolhidas e desbotadas.... Tornaram-se um guetto suburbano, onde habitantes de zonas degradadas vão vêr as horrorosas torres de vidro e arquitectura heterogéna, sonhando com uma minúscula fracção num tipo de subúrbio pseudo-luxuoso. Para ir ao encontro desse tipo de cleintela o parque teve que se adaptar a esses gostos - menos zonas verdes, mais betão e fast food, mais estacionamento e cada vez mais perto do rio, etc, etc....
ResponderEliminarCada nação tem o que merece, e dada a cultura e civismo dos Portugueses esta não é excepção. Deveríamos era pertencer a uma união de países Africanos e não Europeus - seria mais coerente com as nossas verdadeiras aspirações e civismo.
Por uma falsa noção de economia, comprar o mais barato, boa parte dos materiais de construção modernos e baratos, a maior parte do edificado contemporâneo em Portugal, afinal, envelhece mal. O resultado são uma série anómala e algo cómica de pré-ruínas contemporâneas, o que acentua o lado decadente (já não era pouco) do país.
ResponderEliminarCurioso como a onda desse tipo de construções (o "construir para o futuro", do vesgo general) ajudou ainda mais o cliché da decadência. Mas não é só no Parque das Nações, e nos seus edifícios mais emblemáticos que ela se anicha, monumental. É por todo o lado, salvo excepções, como a Mesquita de Lisboa, Serralves, e não muitas mais, em que não houve temor de gastar para ter qualidade/durabilidade e qualidade estética.
A mim, por gostar imenso de arquitectura contemporânea custa-me e causa-me uma hilaridade negativa, em vez de vê-la, ver estas imitações baratas, sem estilo, com uma obscolescência ultra-rápida.
Mas vá lá, nem tudo é tão negro, como pensam tradicionalistas excessivos e apocalíticos vários, haja calma: tudo isto ruirá em breve. A filosofia da paciência face ao edificado impaciente tem consolações cínicas e deliciosas. Não é preciso como disse aqui um exaltado e anónimo purista fazer implodir as periferias quiqui.Não vale a pena gastar dinheiro nisso. Essas coisas estão a cair por si. Não é essa a estimável tradição nossa, de resto?
Podia ser pior. Podiam ter feito mamarrachos à prova de bala. Teme-se é que parte do Pavilhão de Portugal rompa a telha a algum passante. Não é isso que o tornará mais patriota.
Entretanto passemos ligeiramente pelos tempos da decadência. Não há volta a dar-lhe, são várias gerações sem qualidade ou de dúbia qualidade as responsáveis, e a que está aí agora, em lugares decisores, ainda não deu a volta ao prego. Não deu o salto ontológico necessário. Parece ter quase a mesma falta de gosto, pudera não teve uma educação sentimental como devia ser. A verdade é que são precisas três gerações para fazer um gentleman, um homem de gosto. Que se me perdoe a evidência mas é o que mais falta em Portugal. Não vale a pena ter sonhos de uma economia ontológica, que nos diz que a riqueza das nações transformará o indivíduo. Transformará pois claro, a riqueza, mas só "à la longue" e isso sempre demora o seu tempo. A pobreza nada resolverá, é arquióbvio. Mas a riqueza remediada e sem gosto que a era veicula também não.
Por mim, aguardo, embora com alguma reticência, pela próxima geração. Talvez não tenha medo de ser mais elitista. Porque o gosto adaptado aos padrões da plebe já bem se viu como baila.
E outro a dar-lhe com a minha proposta de implosão. Esteja sossegadinho, o senhor e o sr. Filipe, só o faremos com o consentimento dos moradores. Não somos talibans. Caso queiram ficar com os bonzos de cimento e alumínio, tudo bem. Arquiva-se para geração futura, porventura mais esclarecida consultar o que eram propostas de facto transformadoras, e não decisões anfíbias, em meia lua e "pas de deux."
ResponderEliminarEu não tenho a sua paciência, caro Cristóvao. O meu amigo é da raça olímpica e eu reles mortal não tenho como v. a eternidade à minha frente.
Voltando à ponte. Deviamos fazer uma ponte que nos ligasse a Londres. Isso sim é que nos daria progresso e "sense of purpose". Ficaríamos ligados com boas práticas de arquitectura, integrados num bridge-space ímpar. Lisboa-Londres em TGV, que sonho!
Agora francamente meter-se em Chelas e desembocar no Barreiro, que seca!
Que acha da implosão qualificada do Barreiro, já agora?
Caro Anónimo,
ResponderEliminarO Barreiro ainda tem - pequeno, é certo - um núcleo histórico. Por isso falar assim de implosão de modo tão genérico é capaz de ser mediaticamente atraente e eficaz para divulgar o seu ponto de vista, que me parece ser de ordem exclusivamente estética, mas seria injusto para as pessoas, em primeiro lugar, porque são elas as pedras vivas das cidades, e para algumas partes do Barreiro que não merecem ir aos ares num apocalipse mesmo cheio de boas intenções. Lembre-se que quem o feio ama bonito lhe parece. Há concerteza muitos barreirenses que amam a sua vila ou cidade. Como haverá gente do Cacém que adora o seu Cacém. Iremos contra os afectos? Não me parece boa política. Tem mau gosto? Já disse que talvez daqui a três gerações... Mas não se pode impôr o bom gosto à bomba.
Em segundo lugar, as soluções de "limpeza étnica ou estética" radicais tem um toque de despotismo radical que confesso não ser da minha predilecção. Já o Marquês de Pombal tentou o mesmo, e não se deu nada bem com os resultados.
Para ir a Londres vou de iate. No entanto, essa ponte que propõe é uma adaptação de uma ideia gaulesa. Já houve não sei quantos visionários a querer o túnel da mancha ligando Dover a Calais. Depois Ponte. A seguir túnel ferro ou rodo ou ferro-rodoviário. E até pneumático! Houve discussões acesas - e há ainda - sobre a viabilidade de tal projecto. Quebraria uma coisa que our dear oldest allies muito prezam, a sua insularidade.
Lord McGrave, um amigo meu, disse-me há tempos que mais depressa seriam os Labour actualmente no poder a vetar uma tal ligação do que os Tories.
Mas talvez algo se ganhasse com essa ideia caso fosse para a frente. Isso até dá asas para outros sonhos: Uma ponte para a Madeira, um dia? Outra para os Açores? Teríamos que ser Cnossos, o rico. Eu enquanto isso que me parece altamente iimprovável não acontece evidentemnte puxo a brasa a minha sardinha : acho que devia haver mais marinas em toda a costa. Defendo que os portugueses deviam voltar massivamente para o Mar. (Já estamos quase todos a viver na Costa, mais um esforço antigos marinheiros!) Inclusivé aproveitar certos pontos da costa de baixa profundidade (não há muitos) para criar ilhas. Não devemos aumentar território? A mim parece-me saudável a ideia de querer ter mais território. Podiam ser ilhas flutuantes. Um dia haverá saber,e engenho e arte para isso. Talvez um dia se possa induzir um vulcão dos fundos por meio de uma técnica qualquer a subir junto da costa.
Mas voltando a pôr os pés na terra, ou melhor dito a mergulhar os pés descalços na água salgada do mar, acho que devia haver mais barcos privados e públicos fazendo conexões entre o Portugal que temos e o mundo. Devíamo-nos preparar para o segundo fôlego da marinha, porque as viagens longas vão voltar cada vez mais para mais pessoas, com tempo e dinheiro. Que é o que se deseja a todos que tenham, evidentemente.
E já agora que vejo que neste interessantíssimo e tão necessário forum se tem falado de pontes sobre o Tejo devia-se velar pela navegabilidade do Tejo até Espanha.
Escrito ao largo da Costa de Tróia. Vento fraco do NE. Vinho tinto Sousão, do Minho, ao almoço a acompanhar chocos grelhados.Gatos a bordo. E uma Sereia.
Bem....os gatos a bordo, dispensava...o resto, não me desagradava....
ResponderEliminarJA