Com este título, João Pinto e Castro publica hoje no Jornal de Negócios um interessantíssimo artigo, cuja leitura recomendo (infelizmente não há link). A ideia desse artigo é que a análise custo-benefício de um projecto de investimento público não é, de per si, uma ferramenta suficiente para a avaliação de projectos de investimento público; e que não se pode escamotear a componente política desses projectos.
Parece-me evidente que é difícil e aleatório atribuir um valor a muitas coisas; mas, tal como diz João Pinto e Castro, isso não dispensa "umas continhas"; e muito menos "a explicitação de uma estratégia de desenvolvimento para o país".
O ponto fulcral do artigo, quanto a mim, está numa pergunta: "Que eventualidade será mais grave: a) construir o TGV e constatar a posteriori que a procura é insuficiente; ou b) não o construir e descobrir que, por causa disso, o país é ainda mais periférico no contexto europeu?" Claro que as alternativas são insuficientes, o que se compreende num artigo de jornal; e que se poderiam fazer outras perguntas - por exemplo, o que é mais importante: melhorar a rede interna de comboios ou ter um TGV para Madrid? Mas ela resume, e bem, muitos dos dilemas das obras públicas.
Como adaptá-la à ampliação do Terminal de Contentores de Alcântara? Poderia ficar assim, talvez: "Que eventualidade será mais grave: a) fazer a ampliação e descobrir que daqui a vinte ou trinta anos é necessária outra, porque a capacidade do terminal está esgotada; ou b) não a fazer, e descobrir que aquela zona, utilizada noutras actividades como o recreio, os cruzeiros e o lazer é extremanente rentável, criou empregos e ajudou a desenvolver um sector do turismo (o turismo náutico) que o Governo, num plano estratégico com um nome infeliz (PENT), determinou - e muito bem - ser prioritária?" Ou: "Que eventualidade será mais grave: a) fazer a ampliação e descobrir que se destruiu valor a uma zona nobre da cidade; ou b) ditto?"
Felizmente, a resposta é mais fácil do que no caso do TGV.
Portugal não pode viver apenas do Turismo; mas também não pode viver só de plataformas logísticas. Porque não continuar com estas em Sines, por exemplo*, e desenvolver aquele, no seu segmento náutico, em Lisboa (isto não significa excluir o Algarve, claro, nem a Madeira ou os Açores. Significa aproveitar as condições naturais de Lisboa para uma actividade económica para a qual elas são reconhecidamente excelentes)? Como se confirmou com a America's Cup, Lisboa tem condições naturais ideais para os desportos náuticos**.
É este o verdadeiro debate: que futuro queremos para o nosso país? (No caso do TCA, há um outro tema a debater: queremos continuar a fazer política como se fôssemos um país africano, ou queremos integrar o grupo de países europeus?)
* - por favor não venham com o argumento do custo do transporte para "a margem norte": uma grande parte dos contentores vai para a Península Ibérica via Poceirão (que é pertíssimo de Setúbal e onde a Mota Engil acaba aliás de investir 20 milhões de euros) e o custo do transporte é irrisório.
** - não foi por causa das condições naturais que a Taça América não veio para cá.
Parece-me evidente que é difícil e aleatório atribuir um valor a muitas coisas; mas, tal como diz João Pinto e Castro, isso não dispensa "umas continhas"; e muito menos "a explicitação de uma estratégia de desenvolvimento para o país".
O ponto fulcral do artigo, quanto a mim, está numa pergunta: "Que eventualidade será mais grave: a) construir o TGV e constatar a posteriori que a procura é insuficiente; ou b) não o construir e descobrir que, por causa disso, o país é ainda mais periférico no contexto europeu?" Claro que as alternativas são insuficientes, o que se compreende num artigo de jornal; e que se poderiam fazer outras perguntas - por exemplo, o que é mais importante: melhorar a rede interna de comboios ou ter um TGV para Madrid? Mas ela resume, e bem, muitos dos dilemas das obras públicas.
Como adaptá-la à ampliação do Terminal de Contentores de Alcântara? Poderia ficar assim, talvez: "Que eventualidade será mais grave: a) fazer a ampliação e descobrir que daqui a vinte ou trinta anos é necessária outra, porque a capacidade do terminal está esgotada; ou b) não a fazer, e descobrir que aquela zona, utilizada noutras actividades como o recreio, os cruzeiros e o lazer é extremanente rentável, criou empregos e ajudou a desenvolver um sector do turismo (o turismo náutico) que o Governo, num plano estratégico com um nome infeliz (PENT), determinou - e muito bem - ser prioritária?" Ou: "Que eventualidade será mais grave: a) fazer a ampliação e descobrir que se destruiu valor a uma zona nobre da cidade; ou b) ditto?"
Felizmente, a resposta é mais fácil do que no caso do TGV.
Portugal não pode viver apenas do Turismo; mas também não pode viver só de plataformas logísticas. Porque não continuar com estas em Sines, por exemplo*, e desenvolver aquele, no seu segmento náutico, em Lisboa (isto não significa excluir o Algarve, claro, nem a Madeira ou os Açores. Significa aproveitar as condições naturais de Lisboa para uma actividade económica para a qual elas são reconhecidamente excelentes)? Como se confirmou com a America's Cup, Lisboa tem condições naturais ideais para os desportos náuticos**.
É este o verdadeiro debate: que futuro queremos para o nosso país? (No caso do TCA, há um outro tema a debater: queremos continuar a fazer política como se fôssemos um país africano, ou queremos integrar o grupo de países europeus?)
* - por favor não venham com o argumento do custo do transporte para "a margem norte": uma grande parte dos contentores vai para a Península Ibérica via Poceirão (que é pertíssimo de Setúbal e onde a Mota Engil acaba aliás de investir 20 milhões de euros) e o custo do transporte é irrisório.
** - não foi por causa das condições naturais que a Taça América não veio para cá.
o sentido do artigo é completamente oposto...
ResponderEliminarNão fazer o TGV tem outra consequência gravíssima: as construtoras civis assanham-se todas contra o governo.
ResponderEliminarAnónimo das 13h42,
ResponderEliminarInfelizmente não o tenho aqui. Mas olhe que não me parece.
"É este o verdadeiro debate: que futuro queremos para o nosso país?"
ResponderEliminarQueremos servir cafés aos turistas e vender viagens de barquinho a meninos de bem ou queremos ser competitivos num sector que teima em crescer apesar da crise ?
Sr. Serpa, a sua visão de futuro para Portugal é simplista e seviçal, náutica de recreio? desportos náuticos? condições naturais? Quer transformar Lisboa noutro ALLGARVE ???
NÃO OBRIGADO !!!
"Felizmente, a resposta é mais fácil do que no caso do TGV."
ResponderEliminarTiro no pé.
Escusado será dizer que parei aqui e não quis saber de mais nada no texto.
Cascais-Cintura JÁ!!!
Caro Anónimo das 07h48,
ResponderEliminarO seu comentário - que lhe agradeço - revela muito do desconhecimento que há em Portugal sobre a náutica de recreio.
A náutica de recreio é uma indústria que em países como a França, a Espanha, o Reino Unido, a Alemanha, a Suécia, a Noruega, a Itália, a Nova Zelândia, a Austrália dá trabalho a milhões de pessoas (não se esqueça que para os "meninos de bem" possam andar de "barquinho", como diz, é preciso construí-los, repará-los, amarrá-los, equipá-los, vendê-los - toda uma série de empregos que são muito mais do que "servir cafés aos turistas" - que é. aliás, deixe-me lembrar-lhe, aquilo que muitos dos nossos jovens andam a fazer por essa Europa fora).
Acha realmente que os países que citei, nos quais a náutica de recreio tem um impacto importante na economia (em Espanha representa 1% do PIB, por exemplo) fizeram más escolhas? Não me parece.
Para além disso, não nos devemos esquecer que Portugal não é Lisboa - e muito menos Alcântara, claro. Se o porto deep sea fôr para Sines ou Setúbal o país não fica a perder. Ficam a Mota-Engil e a APL - que também não são Portugal.
Quanto ao Allgarve, partilho a sua indignação - mas faço-lhe ver que, se a opção tivesse sido o turismo náutico em vez do turismo de sopeiras, talvez o descalabro não tivesse sido tão grande.
Caro Anónimo das 15h42,
ResponderEliminarPublico aqui uma precisão que o autor do artigo fez. Parece-me que a minha interpretação não estava muito ao lado:
"O meu artigo de ontem no Jornal de Negócios não é - repito: não é - uma defesa do TGV. Também não sustenta - repito: não sustenta - a inutilidade de se avaliarem os custos e benefícios económicos dos investimentos públicos. Visa apenas - repito: apenas - desfazer a ilusão de que a análise económica nos dispensa de ter uma visão estratégica para o país assente em escolhas éticas e políticas.
É óbvio que só se tem a ganhar se o porto de contentores passar para sines, por exemplo, e enviar as mercadorias por comboio. E por favor não me venham com o custo de transporte. Voltem para a 4ª classe e aprendam a fazer contas de multiplicar.
ResponderEliminarMas não, o que é bom é ter navios a descarregar no centro da capital e camiões a distribuir para as plataformas logísticas na periferia. É de uma pobreza de espírito impressionante...
Fazer reformas e definir rumos que mexam com interesses inatalados não é fácil e todos querem reformas desde que seja no quintal do vizinho.
ResponderEliminarComo semore o nosso velho Portugal optou pelo caminho mais fácil e menos doloroso.
Caro Serpa,
ResponderEliminarA minha paciência para responder aos seus comentários falaciosos e utópicos é cada vez menor, mas não posso deixar passar a campanha de difamação e propaganda que o Sr. leva a cabo neste local de discussão.
Primeiro argumenta que desconheço a realidade da náutica de recreio nacional, depois atira com exemplos de outros países, com níveis de desenvolvimento económico e social incomparáveis com o nosso! Então e a realidade nacional?
Todos os países que o Sr. menciona
possuem grandes portos comerciais que lhes ajudaram a atingir um nível de desenvolvimento compatível com o crescimento da náutica de recreio.
Em Portugal a náutica de recreio tem vindo a desenvolver-se de forma constante mas modesta - à semelhança das restantes actividades económicas. O que o Sr. propõe é o encerramento de um porto comercial em expansão para apostar numa ideia megalómana e sem viabilidade neste momento num país como o nosso. Fala tanto de estudos... Também eu gostava de saber que estudos é que o Sr. fez para essa sua aposta no crescimento exponencial da náutica de recreio num país em crise? Apresente-os! Ou é só porque os outros também têem? Um dos problemas das pessoas que passam muito tempo no estrangeiro, quando regressam a Portugal, é quererem encontrar uma realidade semelhante e tornam-se então nuns xicos-espertos que vêem ensinar aos que cá ficaram como é que fazem as coisas! NÃO OBRIGADO!
Caro Anónimo das 18h50,
ResponderEliminarAntes de mais, obrigado por ter vencido a sua falta de paciência para comentar os meus argumentos - se bem me pareça que a demagogia e a falácia estão muito mais do lado das pessoas que defendem a ampliação do TCA. E quanto à xico-espertice, creio que o método que a APL estava a tentar utilizar para nos colocar este projecto no prato antes mesmo de que nos pudéssemos aperceber que ele estava a ser cozinhado fala por si.
Mas vamos por partes, pode ser?
a) Eu não disse que V. não percebe nada de náutica de recreio. Disse que a náutica de recreio é desconhecida em Portugal, e que o seu comentario reflectia esse desconhecimento. São duas coisas diferentes, não concorda? Quanto ao que sabe ou não de náutica de recreio, não faço ideia, porque até agora aida não me deu argumentos para saber.
b) Países mais desenvolvidos: os países que cito não são mais desenvolvidos que nós por obra e graça do Espírito Santo. São-no devido a um conjunto de razões, algumas das quais nós não podemos imitar, ou recuperar. Não falemos muito delas, só interessam a historiadores. Mas outras são perfeitamente passíveis de ser aplicadas no nosso país.
Uma delas é o aproveitamento racional de recursos - esses países tentam aplicar o seu dinheiro em projectos que potenciem as suas condições naturais, e não o contrário; a outra, é a discussão pública de projectos - para cada projecto destes há debates - entre a população em geral, entre técnicos, entre todas as partes directamente interessadas - é por isso que as coisas lá funcionam (e já nem menciono a Suíça, em que uma coisa destas é directamente posta à votação, sem possibilidade sequer de o não ser); outra ainda é a transparência na Governação - não porque os políticos "deles" sejam melhores do que os nossos, mas precisamente por causa disso, os seus actos são escrutinados e punidos se for caso disso - o que os obriga a ser transparentes. A única coisa que separa Portugal da Europa (e nos aproxima muito, infelizmente, de África é a impunidade. Mas isto é outro debate...)
Como vê, nada que não se possa fazer cá - e, garanto-lhe, com as mesmas consequências. Porque, e este é outro ponto que queria tocar, nós não somos diferentes: as mesmas acções roduzem os mesmos resultados aqui, na Europa ou em Singapura (mutatis mutandi, claro, mas enfim, o mutandi é muito menos do que se pensa).
Há 40 anos não havia náutica de recreio digna desse nome em França, e há 30 a construção naval (de recreio) na Alemanha era quase inexistente; a náutica de recreio não lhes caíu do céu. Foi porque esses países se aperceberam da sua importância económica e social que a desenvolveram. E são países ricos e desenvolvidos. Pessoalmente, acho que a correlação não é aleatória. É causal. Eles são ricos porque aproveitaram oportunidades e condições naturais e saber, e a náutica de recreio é uma das actividades que os enriqueceu. Não os empobreceu.
"Projectos megalómanos e sem viabilidade neste momento num país como o nosso": desculpe, mas eu posso utilizar essa expressão, sem tirar nem pôr, para o projecto de ampliação. Já para uma actividade que não precisa de túneis de caminhos de ferro; não precisa de obras marítimas; não precisa de obras terrestres - desculpe, mas não vejo onde está a megalomania;
"estudos, potencial económico da náutica de recreio" - estou realmente a preparar alguns dados sobre a náutica de recreio. De qq forma, estes dados não são completos, não tenho infelizmente capacidade económica para os encomendar.
Mas, se reparar bem naquilo que tenho vindo a escrever, aperceber-se-á de que aquilo que eu digo é que a náutica de recreio, os cruzeiros e o lazer devem ser uma das alternativas estudadas para a utilização daquele espaço. E que se deve tomar uma decisão conhecendo TODOS os aspectos e TODAS as alternativas.
Como se faria se estivéssemos noutros países, que - acaso, coincidência? - são muito mais ricos do que nós.