25/03/2009

Carta a Primeiro Ministro : Assunto: Construção do novo Museu dos Coches.

Carta a Primeiro Ministro : Assunto: Construção do novo Museu dos Coches.
Exmo. Senhor
Primeiro-Ministro,
Excelência
Lisboa, em 9 de Março de 2009
URGENTE
Assunto: Construção do novo Museu dos Coches.
Foram os signatários advertidos pelos meios de comunicação social no passado fim-de-semana e pelos relatos directos do pessoal envolvido, que as empresas adjudicatárias da demolição dos edifícios onde se pretende construir o novo Museu Nacional dos Coches se começam a instalar, com grande aparato de viaturas e maquinaria pesada, criando uma situação insustentável, de eminente e gravíssimo perigo para a integridade física de todos os técnicos do Ministério da Cultura que continuam a trabalhar no local, assim como para os preciosíssimos arquivos documentais, colecções e equipamentos que nele estão guardados.
Esta situação actualiza de forma dramática o processo de decisão de criação de um novo Museu dos Coches, que temos vindo a acompanhar e a denunciar ao longo de meses.
Após sucessivos encontros de reflexão, discussões públicas, relatórios técnicos e textos de opinião que promovemos ou que recolhemos, não conseguimos encontrar um único especialista com obra reconhecida nos domínios das políticas de património cultural e de museus que defenda a construção de um novo Museu dos Coches. È para todos nós evidente, e tão cristalino como água, que o actual Museu, o mais visitado do Ministério da Cultura, serve muitíssimo bem os propósitos que o levaram a criar e a instalar desde 1906 no chamado “picadeiro real” do Palácio de Belém, o qual na realidade nunca funcionou como picadeiro e está hoje provado que jamais assim funcionará no futuro, devido a requisitos básicos de conservação.
Um novo Museu dos Coches, nos termos em que tem sido anunciado, constitui um erro crasso de política patrimonial e museológica, tanto mais que a motivação original que o poderia ter justificado deixou de fazer sentido, dada a aquisição consolidada quanto ao uso do chamado “picadeiro real”, acima referida. Assim, os meios financeiros tão excepcionais e vultuosos que foram colocados ao serviço deste projecto sem sentido, deveriam com muito maior utilidade, ser canalizados para a construção de raiz de outro museu nacional, como poderia ser o caso do Museu Nacional de Arqueologia, e ainda para a requalificação dos Museus Nacionais de Arte Antiga e do Azulejo, os quais todos os especialistas por nós consultados consideram constituir as verdadeiras prioridades de uma política museológica consistente.
Acresce que as necessidades decorrentes da libertação do espaço para a construção do novo Museu dos Coches conduziram o Ministério da Cultura a montar um sistema de permutas que se configura como um dominó arrasador, de efeitos ainda muito mais catastróficos que própria motivação inicial. De facto, pretende-se instalar na Cordoaria Nacional grande parte dos serviços do Ministério da Cultura a desalojar, usando como bem de troca o espaço secularmente ocupado no Mosteiro dos Jerónimos pelo Museu Nacional de Arqueologia, que igualmente teria como destino a Cordoaria Nacional.
Nunca é de mais acentuar o carácter devastador deste acordo totalmente circunstancial e até irracional, que alguém já qualificou como um “vandalismo de Estado”. As colecções existentes no espaço a desocupar constituem um acervo patrimonial único e de extrema importância pública, preenchendo funções essenciais em domínios tais como a monitorização e a fiscalização de trabalhos arqueológicos ou o acompanhamento de estudos de impacte ambiental, casos em que qualquer diminuição de operacionalidade do Estado não apenas terá consequência potencialmente dramáticas para o património nacional, como implicará as consequentes queixas e penalidades impostas pela legislação europeia. A Cordoaria Nacional é um monumento nacional que merece respeito e deveria ser valorizado nessa sua condição de espaço ligado às actividades marítimas e industriais. O Museu Nacional de Arqueologia, o velho museu de Leite de Vasconcelos, fortemente incentivado por estadistas como Bernardino Machado ou Manuel Arriaga, é uma das instituições mais respeitadas do nosso parque museológico, com colecções imensas e centenas de peças classificadas como tesouros nacionais, que não podem ser tratadas de animo leve.
Nestes termos, sentimo-nos no direito, e sobretudo no dever cívico, de reclamar a pronta suspensão do processo de construção de um novo Museu dos Coches, para que toda esta problemática seja devidamente ponderada.
No imediato e dado o posicionamento no terreno de importantes meios de maquinaria aparentemente destinados a dar início às demolições, vimos denunciar veemente perante V. Exa. a gravidade da acção assim empreendida, responsabilizando desde já, cível e criminalmente, todos os seus responsáveis pelos eventuais danos pessoais e patrimoniais que daí possam advir.
Exigimos assim a imediata suspensão dessas acções, por limitadas que sejam, pelo menos até que esteja garantida e concretizada em condições dignas a transferência para outras instalações de todos os arquivos, colecções e equipamentos do Ministério da Cultura actualmente localizados naquele espaço.
Nestes termos e tendo em conta os dados e considerandos anteriores, informamos ainda V. Exa. que entendemos lançar um apelo urgente a todos os cidadãos de boa vontade para que se mobilizem mais uma vez, no dealbar do século XXI, debaixo das mesmas consignas que já Herculano lançava na primeira metade do século XIX, ou seja, contra a política do camartelo, contra os “Hunos modernos”, à solta num país que não obstante a mudança do tempo e dos regimes continua a estar “desamparado de Deus e da Arte”.
Em concreto e para além do apoio prestado aos trabalhadores do Ministério da Cultura que permanecem das instalações onde se pretendem começar as obras de demolição preparatórias do novo Museu dos Coches, afirmando a nossa solidariedade activa em relação a todas as acções de resistência cívica que entendam desencadear, informamos V. Exa. que iremos convocar uma Concentração pública de Protesto, a ter lugar no dia 18 de Março, pelas 18,00 horas, junto às instalações onde se pretende vir a construir o novo Museu dos Coches.
Temos esperança que, advertido para o magno problema cultural e os nefastas efeitos sociais acima enunciados, possa V. Exa. intervir a tempo, como lhe compete, para bem dos nossos museus e dos nossos monumentos. Neste sentido, ficamos ao dispor para prestar todos os esclarecimentos adicionais julgados úteis e manifestamos a nossa abertura para colaborar em quaisquer soluções entendidas como respeitadoras da causa maior que nos motiva, a saber, a salvaguarda e conservação do Património Cultural do País. Quando a sociedade civil se mobiliza nestes termos e para estes efeitos, não pode ser considerada como força de bloqueio, mas antes como agente potenciador do futuro. Sabemos a responsabilidade que temos e é nesse sentido que desejamos intervir. Assim V. Exa. o compreenda também.


Luís Raposo
Pelo Secretariado Permanente da Plataforma pelo Património Cultural


Paulo Ferrero
Pelo Fórum Cidadania LX


José Morais Arnaud
Pelos promotores da petição “Salvem os Museus dos Coches e de Arqueologia e a Cordoaria Nacional”

3 comentários:

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  2. "Será melhor António Costa perguntar a Rui Rio as noites que passou sem dormir e o que teve de “engolir” para segurar a miséria de projecto de reabilitação que lhe fizeram, para a Av. dos Aliados, com a justificação que era de autor consagrado, contra todo o povo que defendia o património da Avenida.
    Só depois da obra feita é que percebeu o que devia ter percebido em projecto: que foi uma GRANDE ASNEIRA.
    E já se desculpou ao povo, que não lhe perdoa, pois já ninguém vai devolver aquilo que lá se perdeu, e fazia parte da nossa cultura; o que alí destruiram – pavimentos, árvores, contexto, sentido espacial próprio e o hábito de frequência que o povo lá tinha; e fazia também parte da nossa memória do local.
    Isto só para colocarem lá: “a sua cultura”!"

    Também não se permitiu nesse caso qualquer discussão pública directa; foi dissimulada com o estudo do metro!
    E quando o povo se impôs... ditadurialmente fizeram ouvidos moucos, como nos querem agora fazer, os "iluminados".
    Quando se juntaram cinco mil assinaturas contra aquela imbecilidade para os Aliados, nem na Assembleia da República deram ouvidos!!! E ia bem a tempo - não quiseram saber, os nossos políticos - E PERDEMOS PATRIMÓNIO, apenas em favor dos bolsos dos intervenientes directos. Mais ninguém ganhou com isso. A Avenida ficou árida, impessoal como era perfeitamente previsivel pelo projecto, e se tentou de todas as formas travar.

    Por isso, não esperemos novo crime cultural para perceber que o foi.
    Que o governo e em especial o Dr. António Costa percebam isso a tempo de o evitar, e não como aconteceu com o Rui Rio - Que agora já aprendeu - olhem o Bolhão! Já dá mais ouvidos ao povo.

    Que todos os interessados ponderem efectivamente que o povo está a ver o que vão deitar a perder ao país, apenas para impôr os seus esquemas e as mais valias que daí conseguem, seja ao nível das influências, do relacionamento directo ou mesmo indirecto, da compartilha de favores, ou mesmo vantagens económicas explícitas.

    Isto terá que ser devidamente identificado e julgado.

    Um erro tão grande à vista de todos, sem discussão pública conforme as disposições legais, nivela a incultura do povo pelo patamar dos ditadores que o impôem.

    Neste caso temos técnicos, políticos e agentes turísticos de todo o mundo, assim como todas aquelas muitas centenas de milhar de pessoas que já passaram pelo museu dos coches, A APONTAR O DEDO A ESSA TROPA MAL FORMADA E DITADORA, que quer dar cabo desta jóia preciosa, apenas por proveitos pessoais, e não pode ser por outra coisa.

    É um escândalo.

    Não venham dizer que é um facto consumado, pois a obra ainda não está feita!
    Os projectos servem para isto: para não se fazerem asneiras nas obras.
    Ainda só há projecto (se o há de facto). Ainda se poupam muitos milhões, e A VERGONHA A TODO UM POVO que não merece tal incultura, apenas por se deixar manobrar por quem não é pessoal de bem.

    Vamos manter o museu dos coches, custe o que custar, pois não somos um povo tão labrego como nos querem fazer.

    Apenas o imobilismos de todos nós aceita e permite que estas cabeças duras andem a mandar no país.

    Ou começam a perceber minimamente daquilo que andam a fazer, ou assumem explicitamente a parceria no roubo do dinheiro e da cultura do povo, com as inerentes consequências...

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  3. Se lá no Porto já conseguiram segurar o mercado do Bolhão, nós aqui também temos que segurar os nossos museus e reabilitar o património, pois não faltam por aí palácios abandonados.
    O António Costa será ainda mais cabeça dura que o Rui Rio?
    Grande comentário o que antecede,
    vale bem o tempo que leva a ler.
    Não mexam no Museu dos Coches.

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