João Marcelino (DN) e Paulo Baldaia (TSF)
...Uma das marcas do discurso inaugural de José Sócrates no congresso foi a campanha negra, que ele diz existir, a propósito do caso Freeport. Acha que há aqui uma campanha negra contra o primeiro-ministro?
Eu já levo muitos anos de actividade política e sei, muitas vezes, que a publicação de determinadas notícias em determinadas alturas não é completamente inocente. Isso acontece. Agora, quem está na política tem que saber viver com isso. Quem não deve não teme, e portanto, não há campanhas negras. Pode haver alturas em que a pessoa apanha com muitas notícias desagradáveis, mas tem que ser capaz de as enfrentar. Acho que uma coisa dessas não pode condicionar a actividade política. Não somos ingénuos, sabemos que essas coisas existem. Agora, no caso Freeport, não acho que tenha a ver nada com campanha negra. O que é negro no caso Freeport é o tempo que isto demorou e está a demorar. Isso é que é negro! E é negro para o País e para toda a gente. O caso Freeport é exemplar de tudo que não deve ser feito. Não deve ser feita uma aprovação de uma alteração do ordenamento de território nas condições em que aquela foi feita; não devia ter sido produzida uma decisão no tempo em que o governo estava em gestão; não deviam ter sido feitas aquelas pressas de aprovar para facilitar a situação, mesmo que o presidente da câmara assim o pedisse; nunca deveria ter sido feita a transformação do uso que não era urbano - que era um uso reservado - para a construção de um centro comercial. Há aqui uma série de erros! Se isto fosse em Espanha, ao abrigo da actual legislação que considera o crime contra o território, essa aprovação teria sido um crime! Independentemente agora de saber se houve luvas, se não houve luvas. A polícia está a investigar, o Ministério Público também, descubram as coisas. As alterações do território, feitas muitas vezes de forma muito codificada, muito pouco transparente através da administração municipal e central, e até das CCDR, sem que os cidadãos sequer se apercebam do que é que se está a passar, têm levado a que haja enriquecimentos súbitos, de pessoas que tinham terrenos rústicos que de repente passaram a valer fortunas! Passam a valer fortunas porque houve uma câmara ou um governo que decidiu que ali se pode construir. E este enriquecimento não é apropriado pelo poder público, é apropriado pelo privado.
Acha que a lei alguma vez será alterada?
Tem que ser alterada, porque nós somos uma excepção! Em todos os países da OCDE, estas mais valias urbanísticas, por definição, ou são integralmente públicas ou são parcialmente públicas. Mesmo nos liberais Estados Unidos, estas mais valias são apropriadas pelo Estado, uma parte, pelo menos! Em Espanha suponho que é cerca de 20%, e é por lei que terá que vir à mão do estado. Em Portugal não, 100 por cento pode ir para o privado! Os PIN, Projectos de Interesse Nacional, feitos em zonas de reserva natural, por exemplo. Estou a pensar um no Algarve: suspende-se um plano director para, numa zona de reserva, se fazer um hotel de seis estrelas e depois diz-se que aquilo é um projecto de interesse nacional? Um hotel de seis estrelas?! Estão a brincar comigo! E aquilo representou uma multiplicação de valor que é da ordem que eu vos disse. Pode ser uma multiplicação de 200, 300, 1000 por cento, de um dia para o outro! Isto é um escândalo em Portugal! Eu fiz as contas de todo o território português que de 1985 até 2000 era rústico e passou a ser construído, deduzindo as estradas e os equipamentos públicos, quanto é que isto valeu em termos de mais valias, e cheguei à conclusão de que entre 1985 e 200 a transformação do território por esta razão representou 4% do PIB. Foi este o enriquecimento que foi parar à mão de particulares, porque temos uma lei absolutamente iníqua!
...Eu já levo muitos anos de actividade política e sei, muitas vezes, que a publicação de determinadas notícias em determinadas alturas não é completamente inocente. Isso acontece. Agora, quem está na política tem que saber viver com isso. Quem não deve não teme, e portanto, não há campanhas negras. Pode haver alturas em que a pessoa apanha com muitas notícias desagradáveis, mas tem que ser capaz de as enfrentar. Acho que uma coisa dessas não pode condicionar a actividade política. Não somos ingénuos, sabemos que essas coisas existem. Agora, no caso Freeport, não acho que tenha a ver nada com campanha negra. O que é negro no caso Freeport é o tempo que isto demorou e está a demorar. Isso é que é negro! E é negro para o País e para toda a gente. O caso Freeport é exemplar de tudo que não deve ser feito. Não deve ser feita uma aprovação de uma alteração do ordenamento de território nas condições em que aquela foi feita; não devia ter sido produzida uma decisão no tempo em que o governo estava em gestão; não deviam ter sido feitas aquelas pressas de aprovar para facilitar a situação, mesmo que o presidente da câmara assim o pedisse; nunca deveria ter sido feita a transformação do uso que não era urbano - que era um uso reservado - para a construção de um centro comercial. Há aqui uma série de erros! Se isto fosse em Espanha, ao abrigo da actual legislação que considera o crime contra o território, essa aprovação teria sido um crime! Independentemente agora de saber se houve luvas, se não houve luvas. A polícia está a investigar, o Ministério Público também, descubram as coisas. As alterações do território, feitas muitas vezes de forma muito codificada, muito pouco transparente através da administração municipal e central, e até das CCDR, sem que os cidadãos sequer se apercebam do que é que se está a passar, têm levado a que haja enriquecimentos súbitos, de pessoas que tinham terrenos rústicos que de repente passaram a valer fortunas! Passam a valer fortunas porque houve uma câmara ou um governo que decidiu que ali se pode construir. E este enriquecimento não é apropriado pelo poder público, é apropriado pelo privado.
Acha que a lei alguma vez será alterada?
Tem que ser alterada, porque nós somos uma excepção! Em todos os países da OCDE, estas mais valias urbanísticas, por definição, ou são integralmente públicas ou são parcialmente públicas. Mesmo nos liberais Estados Unidos, estas mais valias são apropriadas pelo Estado, uma parte, pelo menos! Em Espanha suponho que é cerca de 20%, e é por lei que terá que vir à mão do estado. Em Portugal não, 100 por cento pode ir para o privado! Os PIN, Projectos de Interesse Nacional, feitos em zonas de reserva natural, por exemplo. Estou a pensar um no Algarve: suspende-se um plano director para, numa zona de reserva, se fazer um hotel de seis estrelas e depois diz-se que aquilo é um projecto de interesse nacional? Um hotel de seis estrelas?! Estão a brincar comigo! E aquilo representou uma multiplicação de valor que é da ordem que eu vos disse. Pode ser uma multiplicação de 200, 300, 1000 por cento, de um dia para o outro! Isto é um escândalo em Portugal! Eu fiz as contas de todo o território português que de 1985 até 2000 era rústico e passou a ser construído, deduzindo as estradas e os equipamentos públicos, quanto é que isto valeu em termos de mais valias, e cheguei à conclusão de que entre 1985 e 200 a transformação do território por esta razão representou 4% do PIB. Foi este o enriquecimento que foi parar à mão de particulares, porque temos uma lei absolutamente iníqua!
(extrcto da entrevista á TSF)
Relativamente ao que se passa a nível de ordenamento territorial, haja finalmente alguém que, publicamente e sem rodeios, denuncia o que se passa:
A transformação das reservas do nosso território em zonas construídas (ou destruídas), não podem ser mais toleradas, como instrumento politíco para resolução de situações pontuais. Tem que se perceber que estas alterações, que só servem os interesses especulativos imediatos, irão esgotar, mais ano menos ano, as potencialidades turisticas do país e a sua transformação num lamaçal urbano, devido ao desaparecimento da sua beleza natural e ao desordenamento urbano. Com este tipo de atitudes compromete-se irremediávelmente o seu futuro, afastando-o defenitivamente da europa civilizada.
Antes que seja demasiado tarde, há que introduzir na legislação portuguesa, a figura do crime urbanístico.
Parabéns Helena Roseta!Luis Marques da Silva
INQUALIFICAVEL OPORTUNISTA
ResponderEliminarGrande Helena Roseta!
ResponderEliminarTem dado provas, pela sua coerência de discurso e de acção, que sabe do que fala e factos são factos.
Não sei o que é feito da proposta legislativa para acabar com a apropriação privada das mais-valias urbanísticas, promovida pela Ordem dos Arquitectos, mas gostava de saber. Era bom que fosse para a frente ou que pelo menos se falasse disso.
A opinião pública não está minimamente informada quanto aos problemas relativos ao ordenamento do território e às repercussões que as más políticas nesta área têm na nossa vida. Pense-se no valor exorbitante que o Estado Português deixou e continua a deixar de "encaixar", para deixar que alguns sortudos, quais vencedores de lotarias, enriqueçam.
Parabéns por abordarem o tema.
Cumprimentos.