In Público (7/4/2011)
Por Ana Henriques, Victor Ferreira
«O que querem os lisboetas para a sua cidade, quais devem ser as prioridades urbanísticas? Quem tem respostas ou até perguntas para acrescentar a estas tem, a partir de hoje, oportunidade de pôr as cartas em cima da mesa. Dezasseis anos depois, a capital portuguesa volta a discutir o seu Plano Director Municipal (PDM), cuja proposta de revisão já passou pela câmara e está, desde hoje, em debate público.
A cidade continua a desenvolver-se segundo o PDM de 1994 (Foto: Enric Vives-Rubio)
O documento de hoje já não é o mesmo que, em Outubro do ano passado, causou arrepios ao arquitecto paisagista Gonçalo Ribeiro Telles, que considerou "uma anedota em termos de planeamento" a ideia inicial de facilitar a construção nos logradouros lisboetas. Meio ano depois, a proposta de revisão está diferente. Não mudou nem de filosofia nem revolucionou as ferramentas, e manteve os objectivos estratégicos. Mas teve em conta os 31 pareceres legalmente previstos - 15 deles apontaram a necessidade de mexer na proposta inicial.
Houve uma reviravolta na questão dos logradouros, mas continuam no ar dúvidas e preocupações, como as que a própria vereadora Helena Roseta, do movimento Cidadãos por Lisboa, expressou, quando pôs em causa o modelo de compactação da cidade, que permite aumentar a capacidade construtiva nas áreas consolidadas. "Tenho dúvidas sobre esse modelo. Aceitá-lo-ia se houvesse contrapartidas ao nível da reabilitação urbana, mas não é isso o que vejo", disse Roseta, em Novembro. Manuel Salgado, arquitecto e vice-presidente da câmara, deu a cara pela primeira versão da proposta de actualização do PDM, aprovada em Novembro pelo PS e PSD no executivo (um vereador "laranja" absteve-se) e continua a defender aquela que passou por reuniões de concertações com as 15 entidades que levantaram questões em relação à versão inicial.
Salgado continua a defender o sistema de créditos que a proposta prevê considerando que "é inovador mesmo a nível internacional".
Créditos para recuperar
O também vereador do Urbanismo abriu mão de uma promessa eleitoral de peso: obrigar os promotores imobiliários a reservar uma parcela dos seus empreendimentos para habitação a custos controlados. Agora quer convencê-los a aderir a um sistema de créditos. "Se o promotor reabilitar um edifício antigo e se, depois das obras, mantiver lá a morar todos os agregados familiares que anteriormente lá residiam, tem direito a créditos para construir noutro lado." Isso significa que pode, nesse segundo local, urbanizar para além do que lhe seria permitido: numa zona da cidade onde o índice de construção de referência - ou seja, o quociente entre a área de construção e a dimensão do terreno - é de 1,7, por exemplo, passa a poder construir até um máximo de 2.
Os créditos para construir variam consoante a zona da cidade - "um crédito gerado na Av. da Liberdade não tem o mesmo valor do que um gerado na Ameixoeira" - e não se restringem à habitação. "Se o promotor imobiliário fizer três caves para estacionamento num edifício onde só é obrigado a construir duas, e se reservar a terceira cave para estacionamento público com tarifas idênticas às praticadas pela Empresa Municipal de Estacionamento de Lisboa, também tem direito a um crédito", frisa Manuel Salgado. "O mesmo acontecerá se transformar um quarteirão com uma fabriqueta no meio num logradouro de uso público. Ou se restaurar um edifício que está integrado na carta municipal do património sem subir a cércea [altura]". Dotar os empreendimentos imobiliários de equipamentos sociais, como creches ou lares, também dará direito a créditos, o mesmo sucedendo com o reforço da segurança sísmica ou com a manutenção de lojas de comércio tradicional durante obras de restauro de um imóvel.
"Tudo o que pudermos fazer através de incentivos, em vez de imposições, tornar-se-á mais eficaz. Se assim fosse, parte dos edifícios da carta do património não estaria no estado degradado em que se encontra". E acrescenta: "Tenho andado a estudar o que se faz no Japão, na Holanda e noutros países, e este é um regulamento muito inovador". É, também, um dos principais pontos de discórdia com os partidos da oposição. A medida apenas beneficia os grandes construtores, dizem os comunistas. "Se a maioria das pessoas rejeitar este sistema, não terei outro remédio senão meter a viola no saco".
Contrariado, o vereador do Urbanismo também teve de ceder na questão dos logradouros. "Os logradouros de Alvalade, do bairro Lopes e da colina do Castelo ficaram todos defendidos, e isso acho bem. Mas noutros casos foi-se demasiado longe, ao fixar num máximo de dez por cento a área impermeabilizável. Uma regra cega como esta é errada, porque as pessoas têm direito a ter carro. Também é importante ter estacionamento para residentes na cidade". Preencher o que está vazio
Quanto à possibilidade de a câmara construir silos automóveis, Manuel Salgado fala das dificuldades de o fazer nas zonas históricas: "Há poucos edifícios de grande porte e parte dos que existem não pode ser demolida porque tem valor patrimonial".
O autarca rejeita as críticas que lhe têm sido feitas de que este PDM irá servir para expulsar os mais pobres para os subúrbios, por via do licenciamento de obras de reabilitação que aumentarão necessariamente o valor das rendas: "É exactamente o contrário", assegura.
"Vamos procurar ter habitação a custos acessíveis. Um T2 pode vir a custar entre 400 e 500 euros por mês, consoante a zona". O cenário nunca foi tão propício à recuperação das casas antigas: "Noventa por cento das obras licenciadas pela câmara já são de reabilitação urbana". Numa altura em que "82 por cento da cidade estão urbanizados", o objectivo é recuperar o que já está construído "e preencher o que está vazio" nos espaços urbanizados.»
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A primeira grande questão é: Lisboa tem futuro?
Lisboa tem futuro, claro que sim... Pergunta que não se faz.
ResponderEliminarLi no outro dia que era a "bela adormecida da Europa", só temos por isso de "acordá-la" :)
Novo PDM....muito bem! Mas eu começaria por discutir se o novo é só para cumprir....ou também para violar?
ResponderEliminarPorque sem ter essa questão bem clarinha....continuamos só a perder tempo.
Esta expressão "as pessoas têm direito a ter carro" até pode ser verdadeira, mas não implica estacionamento grátis ou a qualquer custo!
ResponderEliminarQuanto ao valor das rendas, só com uma nova lei de arrendamento!
Lisboa e o País, mesmo com o FMI, têm futuro.
ResponderEliminarImporta no entanto uma profunda mudança de hábitos, devendo começar pelos direitos e deveres.
Ter carro não é um direito, é uma opção a qual acarreta determinadas obrigações!
Comprar casa não é um direito, é uma opção!
Ir de férias não é um direito, é uma opção!
Beneficiar de um empréstimo bancário não é um direito, é uma opção condicionada à capacidade financeira!
O espaço público é de todos e não é de ninguém!
O que dá vida a uma cidade são as pessoas. Tudo o resto é complementar....
um mês é manifestamente insuficiente para os cidadãos contribuirem para a versão final do PDM. O documento é tão grande e ecompllexo que para o comum dos mortais levaria um mês só para o ler... É importante que a CML aumente o periodo de discussão pública se de facto está interessada em receber contributos dos munícipes.
ResponderEliminarNão é a Cidade de Lisboa que estará "...adormecida" são os lisboetas que estão adormecidos e quando acordarem vão ter um pesadelo.
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