St. António dos Capuchos está entre os hospitais a serem encerrados
Por José António Cerejo in Público
Mais de 30 hectares de terrenos públicos poderão ser urbanizados. Câmara garantiu quatro imóveis para o município. Oposição nada sabe
O presidente da Câmara de Lisboa, António Costa, assinou em Maio do ano passado um protocolo com a Estamo, imobiliária de capitais exclusivamente públicos, que abre as portas, ainda que indirectamente, à aprovação de dez grandes projectos imobiliários, parte dos quais aquela empresa não conseguiu viabilizar no passado. Ao mesmo tempo, o município assegurou a cedência pela Estamo de quatro dos seus imóveis para escolas e equipamentos públicos.
O protocolo, cuja existência era até agora desconhecida de todos os vereadores da oposição, não consagra, nem a lei o permite, o compromisso camarário de aprovação dos projectos da Estamo em troca dos imóveis pretendidos pelo município. O que o documento prevê é que à medida que a câmara for licenciando as urbanizações da empresa, esta lhe transmita aqueles imóveis, a título de "pagamento em espécies das compensações legalmente devidas", nomeadamente taxas relativas às infra- -estruturas dos empreendimentos.
Imóveis reservados
Caso a autarquia pretenda entrar na posse de alguns desses espaços antes da aprovação dos projectos da Estamo, a sua cedência ficará dependente da celebração prévia de um contrato entre as partes. É isso que deverá acontecer, em data ainda desconhecida, com o antigo Convento do Desagravo, junto à Feira da Ladra, onde a autarquia quer começar a construir várias escolas ainda este ano. Em termos de compromissos concretos, apenas a Estamo assume a obrigação de "não dispor" dos quatro imóveis destinados à câmara até Maio de 2014 - "ou até que o município decida se pretende adquirir a sua propriedade por via do pagamento em espécie" das compensações devidas pela aprovação municipal dos empreendimentos da empresa.
A viabilização destes projectos, diz o texto do acordo, "depende da aprovação de planos municipais" e de outros instrumentos de ordenamento, entre os quais avulta o Plano Director Municipal (PDM). Na altura em que o protocolo foi assinado, 27 de Maio de 2011, o processo de revisão do actual PDM - que impede a aprovação da maior parte dos projectos da Estamo - estava praticamente concluído, tendo a sua discussão pública sido concluída uma semana antes.
A versão saída dessa revisão, em que algumas das pretensões da Estamo não foram contempladas, aguarda ainda aprovação na Assembleia Municipal, mas permite a concretização de todos os dez projectos previstos no protocolo. Para efeitos de acerto de contas entre as partes, os imóveis que passarão para a propriedade do município, em troca das taxas que lhe forem devidas pela Estamo, serão contabilizados pelo valor que possuem nas contas da Estamo, "atento o fim público a que se destinam".
O Convento do Desagravo possui assim um valor de oito milhões de euros. As outras parcelas a ceder à autarquia são o Quartel do Cabeço da Bola (8,2 milhões), onde ainda está instalada a GNR e a câmara quer fazer escolas, em frente ao Hospital da Estefânia; os edifícios da Av. 24 de Julho (sete milhões) onde funcionou até há cerca de um ano a Direcção- -Geral da Administração Pública e que a autarquia pretende demolir para criar um largo integrado no conjunto do projectado Centro Cultural África.cont.; e o Complexo Desportivo da Lapa, na Rua Almeida Brandão (10,2 milhões). Neste último espaço, a Estamo ainda tentou que o novo PDM permitisse a construção de edifícios, mas, segundo o presidente da empresa, Francisco Cal, a câmara recusou- -se a retirar-lhe o uso desportivo.
O complexo pertencia ao Instituto do Desporto de Portugal antes de ser adquirido pela Estamo com o mesmo objectivo com que adquiriu todos os imóveis de que é proprietária: revendê-los a privados por um valor muito superior, gerando assim receitas para o Estado, seu único accionista. Logo que o Instituto do Desporto se retire do local, a Estamo deverá contratualizar a sua gestão com a câmara, independentemente da sua futura integração no património municipal.
Os dez projectos da Estamo
Nos termos do protocolo, o município reconhece a "relevância para o desenvolvimento da cidade" dos projectos que a empresa tem em preparação e compromete-se a "cooperar para a sua concretização". Para lá da urbanização de dois terrenos com um total de mais de 10,3 hectares, junto ao Lar Maria Droste (Segunda Circular) e na Av. Alfredo Bensaúde, o documento refere os projectos a construir na Av. de Berna (onde está a Universidade Nova) e nos terrenos da Penitenciária. No caso da Segunda Circular, a Estamo poderá vir a reforçar a capacidade construtiva que o PDM atribui aos seus terrenos, adicionando-lhe os direitos de construção de uma parcela camarária contígua, que poderão servir para pagamento do Convento do Desagravo.
Além destes projectos, o novo PDM permite a construção nos cinco hospitais e no Convento de Santa Joana (Rua de Santa Marta), de que a empresa é proprietária no centro de Lisboa. Dois deles já estão desactivados (Miguel Bombarda e Desterro) e os outros três (São José, Santa Marta e Capuchos) deverão ser encerrados quando for construída a nova unidade hospitalar prevista para Chelas. A urbanização destes recintos terá, porém, de se submeter às condicionantes ditadas pela existência de imóveis classificados no seu interior. A solução para todos eles está a ser estudada pela câmara e pela Estamo numa perspectiva de conjunto, que deverá dar origem ao projecto designado por Colina de Santana, que o município ainda não tornou público.
Câmara recusou protocolo
A existência do protocolo entre a câmara e a empresa nunca foi objecto de nenhuma informação por parte do executivo camarário e era desconhecida até quarta-feira passada. Na reunião da vereação desse dia, em resposta a uma pergunta do PCP, o vice-presidente da câmara, Manuel Salgado, fez-lhe uma referência superficial, causando a surpresa da oposição. Um eleito do PSD, Victor Gonçalves, pediu então que o documento fosse distribuído aos vereadores, mas não obteve resposta. Ao PÚBLICO, o social-democrata disse achar "inadmissível" que o presidente da câmara assuma compromissos desta importância "sem eles serem discutidos ou ratificados" pela vereação. No mesmo sentido se pronunciou Rúben Carvalho, do PCP, que também desconhecia o texto e que considerou "inquestionável" que ele devia ter sido discutido na câmara. Tanto mais, frisou, que "as relações entre a Estamo e o município em matéria imobiliária são das coisas que mais discussão têm dado na câmara ao longo dos anos". António Carlos Monteiro (CDS) afirmou, por seu lado, que "estranhava" a existência de um acordo deste género. "Temos as maiores reservas quanto a protocolos assinados sem irem a reunião de câmara, mesmo que sejam com o Estado", sublinhou.
O PÚBLICO pediu ao gabinete de António Costa que lhe fosse fornecida uma cópia do acordo e fez várias perguntas sobre o assunto. A resposta dada através do Departamento de Comunicação foi a seguinte: "A câmara declinou entregar o documento e responder às perguntas colocadas."
Ocasionalmente, todavia, o PÚBLICO descobriu o documento, perdido entre dezenas de contratos e protocolos subscritos pelo município nos últimos anos e arquivado no site da autarquia.
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Perante a gravidade dos factos e circunstâncias descritas … deixo aqui testemunho de louvor, respeito e admiração pelo profissionalismo, tenacidade e acutilancia de José António Cerejo … O seu trabalho jornalístico sempre ao serviço da Verdade, constitui um contributo sistemático para a Democracia, a Cidadania, a Cidade de Lisboa e Portugal !
António Sérgio Rosa de Carvalho.
Mafiosos!!
ResponderEliminarO Vereador da Educação Manuel Brito prometeru recentemente que o projecto do Convento do Desagravo ia mesmo avançar este ano. Se isso não acontecer, vão mais de 600 crianças continuar em condições degradantes.
ResponderEliminarPortanto, esperamos que, de uma maneira ou de outra, este processo pouco claro avance, pelo menos no que diz respeito ao Convento do Desagravo.