09/08/2012

Metropolitano mantém monumento fluvial ao abandono há um ano.



Metropolitano mantém monumento fluvial ao abandono há um ano
Por Ana Henriques in Público.
Transportadora não tem dinheiro para reabilitar estação fluvial de Sul e Sueste, projectada por Cottinelli Telmo, que continua fechada. Empreitada foi financiada por fundos europeus, mas está longe de ficar pronta
A escassos metros da rede branca tipo galinheiro, os turistas apreciam a espectacular Praça do Comércio. Há quem esteja só de biquíni no Cais das Colunas, a contemplar o rio. Debaixo da rede branca, acumulam-se os detritos de toda a espécie, e por entre os tapumes agarrados à antiga estação fluvial de Sul e Sueste há mantas sujas, sacos e outros pertences de sem-abrigo. Parou nas 6h10 o relógio do terminal dos barcos desenhado por Cottinelli Telmo: partiram-lhe o mostrador redondo.
Enganam quem passa os andaimes no interior do histórico edifício: o monumento de interesse público nunca chegou a entrar em obras - a não ser que se considerem obras o arranque dos enormes painéis de azulejo com os brasões de várias cidades alentejanas e algarvias que decoravam o átrio. De há perto de um ano a esta parte que quem parte e chega do Barreiro usa o novo e reluzente terminal fluvial, ali pegado.
Paredes-meias com o Terreiro do Paço, a histórica estação dos barcos, considerada um exemplar pioneiro da arquitectura modernista em Portugal, permanece ao abandono, apesar de ter sido aprovada uma candidatura a fundos europeus para a sua reabilitação. Mas o desperdício não fica por aqui: dos cinco pontões de atracagem existentes, que custaram ao erário público um milhão cada um, três nunca funcionaram por este terminal fluvial se encontrar fechado (ver caixa).
Apesar de se tratar de uma infra-estrutura destinada a servir as carreiras regulares de transporte fluvial geridas pela Transtejo e pela Soflusa, a reabilitação do monumento de Cottinelli Telmo ficou a cargo do Metropolitano de Lisboa, tal como a construção da nova estação dos barcos mesmo ao lado. Aqui começou, como diz uma auditoria do Tribunal de Contas à Transtejo em 2010, o desacerto: "Para além de as obras não terem sido autorizadas por qualquer dos órgãos sociais da Transtejo, estes desconheciam formalmente o seu custo, não tendo, consequentemente, sido constituída uma provisão nas contas para fazer face a esse encargo". No valor de 26,6 milhões comparticipados pelo Fundo de Coesão, a empreitada, ganha por um consórcio liderado pela Alves Ribeiro, seria desenvolvida em duas fases: primeiro a construção do novo terminal fluvial e a seguir o restauro e o reforço estrutural do antigo. Mas depois de abrir a nova estação dos barcos, em Setembro passado, a antiga fechou sem que a anunciada reabilitação tivesse começado.
O Metropolitano, apesar dos contactos do PÚBLICO, não deu qualquer esclarecimento. Mas o mais recente relatório e contas da empresa dá algumas pistas: "O início desta fase da empreitada encontra-se prejudicado pela necessidade de contenção do volume de investimento e pela prioridade dada à conclusão dos trabalhos da linha vermelha", até ao aeroporto. O documento aponta também um desencontro de contas entre as duas transportadoras: a Transtejo estava obrigada a pagar um milhão de euros anuais ao metro, por conta da construção de outro terminal fluvial, no Cais do Sodré, mas em 2011 não lhe deu um tostão.

Esperanças na câmara

O consórcio mantém os restos do estaleiro no local, à espera que o metro decida retomar ou desista dos trabalhos. Nesta última hipótese, é provável ter de indemnizar os empreiteiros que ganharam o concurso. "A situação não se pode arrastar muito mais tempo", diz Luís Vaz, da Alves Ribeiro. "Só nos foram pagos dez a 12 milhões de euros, está em falta outro tanto".
Neta de Cottinelli Telmo, a arquitecta Ana Costa lamenta o abandono. "A estrutura do edifício sofreu muitos danos com a construção do novo terminal e temo que não aguente muito tempo no estado em que se encontra", observa a autora do projecto de reabilitação. Luís Vaz assegura que não é assim: "As deformações e assentamentos foram monitorizados e o edifício encontra-se no mesmo estado que antes - muito debilitado, mas com um reforço estrutural provisório". Daí os andaimes. Retirados para a obra começar, os azulejos foram guardados em caixas. "Temo que desapareçam", diz Ana Costa. Preocupada, a arquitecta vira agora as suas esperanças para a Câmara de Lisboa. "Estão a tentar arranjar interessados em explorar o espaço a nível turístico", revela.
Uma vendedora ambulante de gelados espera pelos passageiros do próximo barco. "Um dia, as obras no Terreiro do Paço hão-de acabar", vaticina, como quem recita uma má sina. "E esta também".

Três milhões inúteis
Pontões sem uso
Três dos cinco pontões de atracagem de barcos existentes no Terreiro do Paço estão sem uso - por estarem ligados à estação fluvial desactivada. Custaram um milhão de euros cada um. "O impasse nestas obras compromete a utilização de três pontões", confirma a Transtejo, acrescentando que o problema compromete a reposição da ligação Cacilhas-Terreiro do Paço e o retorno da ligação Montijo-Lisboa ao Terreiro do Paço. Sobre o resto a empresa não se pronuncia.

6 comentários:

  1. Alves Ribeiro? Indemnizações? Fundos comunitários? Onde é que já vi isto??

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  2. POR FAVOR COLOQUE ESTA NOTICIA PARA LEVANTAR A MORAL DOS LEITORES E A ESPERANÇA! ESTÃO A TORNAR HABITO A COLOCAÇÃO CONSTANTE DE ARTIGOS E ASSUNTOS DEPRESSIVOS, PRECISÃO DE COLOCAR TAMBÉM EXEMPLOS POSITIVOS QUE EXISTEM EM SOBRA NESTA CIDADE, SENÃO CORREM O RISCO TER TEREM CADA VEZ MENOS LEITORES, É A OPINIÃO DE VÁRIOS SEGUIDORES E ADMIRADORES DO VOSSO TRABALHO!

    http://www.dn.pt/inicio/portugal/interior.aspx?content_id=2707552

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  3. Isto é demais !!!!!

    Um golpe para o Turismo e a Economia, em pleno Terreiro do Paço.

    Somos governados por INCOMPETENTES.

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  4. Este Edifício Magnífico precisa de pintura e RESTAURO, com um custo mínimo, nada de encher os bolsos a esses arquinegociantes. Vejam a Central Station de Nova Iorque, intocada .

    só em entrarem lá turistas, por exemplo para um posto de turismo NACIONAL, ficaria a obra paga NUM MÊS

    Viva a ANA HENRIQUES do PÚBLICO

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  5. E não só.

    Todo aquele amplíssimo espaço junto à estação é uma aberração. Uma enorme superfície inóspita, nesta altura do ano sob um sol abrasador, sem qualquer arranjo ou utilidade, isto mesmo ao pé do Terreiro do Paço, onde os visitantes são mais que muitos.

    E da última vez que lá passei vi que estava por ali anunciada a partida de cruzeiros no Tejo. Se eu fosse turista com a intenção de fazer o tal cruzeiro, dava imediatamente meia-volta.

    E quer "isto" ser uma capital europeia...

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  6. Custa-me perceber porque é que um edifício pertencente à REFER está á espera de intervenções pelo Metropolitano de Lisboa.

    Entretanto esperemos que os painéis de azulejos ainda não tenham sido desviados para vendas menos lícitas e colecções privadas.

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