17/05/2012

Ritz Clube. O chão da histórica sala de espectáculos volta a abanar



Depois de 12 anos de portas fechadas, o Ritz Clube reabre hoje com três novos sócios e DJ sets de Zé Pedro e Luís Varatojo

Por Clara Silva, publicado em 17 Maio 2012 in i (jornal) online

Manuel João Vieira lembra-se de ter assistido a um “espectáculo felliniano” na primeira vez que foi ao Ritz Clube. “Deve ter sido no final dos anos 80/princípio dos anos 90”, conta o músico dos Irmãos Catita. “Aquilo era um sítio parecido com o Maxime antigo, até mais interessante, com mais variedade de espectáculos.” Manuel João Vieira recorda-se de uma cantora em particular. “Não me lembro do nome da senhora. Sei que cantava canções antigas e até me lembro que parou de cantar e disse que não se estava a sentir bem, que tinha de tomar comprimidos. Parecia que estávamos em 1960. Até havia um travesti que tirava a cabeleira e depois era careca.”

Quando o músico Vitorino era um dos sócios do espaço, Manuel João Vieira tocou lá “umas 30 ou 40 vezes”, com os Ena Pá 2000 e com os Irmãos Catita. “O Vitorino ajudou-nos em imensa coisa. Ele usava a parte de cima como sala de ensaios e a determinada altura também chegámos a ensaiar num espaço lá em baixo. Aliás, várias bandas faziam o mesmo, acho que os Peste & Sida também... Era um sítio do caraças.”

Na quinta-feira, 31 de Maio, Manuel João vai voltar a subir ao palco do Ritz. Ontem foi a vez de Sérgio Godinho, outro dos músicos emblemáticos da casa, na festa de inauguração por convite. Hoje é a vez de Zé Pedro, dos Xutos e Pontapés, com um DJ set de Luís Varatojo, na inauguração pública.

Depois de doze anos com as portas fechadas, a emblemática sala de espectáculos de Lisboa reabre hoje. Ana Batel, Eduardo Duarte e Rui Gonçalves são os novos sócios do espaço (com capacidade para 400 pessoas) que, apesar de remodelado, mantém algumas características antigas, em particular a mezzannine da sala principal. “Tentámos manter tudo ao máximo, até a localização dos balcões”, adianta Ana Batel, que trabalha “há muitos anos em produção”. Os outros dois sócios já geriam um espaço nocturno, o MUV, que abriu em Santos em Dezembro de 2010.

Ana lembra-se de ter ido pela primeira vez ao Ritz quando tinha 18 anos. “Sem dizer nada aos pais fui de Setúbal no mini de uma amiga para ver um concerto”, conta. Agora, à frente do Ritz, sabe de cor a história do espaço que abriu pela primeira vez em 1908 como Tuna Comercial de Lisboa – como aliás ainda se lê na fachada do edifício, no número 57 da Rua da Glória, remodelada durante a presidência de João Soares. “Durante uma série de anos foi o Cabaret Montana, depois foi o Dancing Concha e depois o 13 da Glória, o único casino que Lisboa teve no centro da cidade... Só a partir dos anos 50 se tornou Ritz Clube”, conta. Nessa altura, em plena ditadura, “havia coisas fantásticas e impensáveis para a época a acontecerem aqui”, continua. “Como transexuais que vinham de Espanha para actuar.”

Até ao fim do mês, o Ritz Clube, que vai funcionar de terça a domingo, vai manter uma programação quase só assente em artistas nacionais. “Achámos que faria todo o sentido chamar pessoas que passaram por cá nos anos 90”, diz Ana. Em Junho, chegam os artistas internacionais, como Matt Elliott e Lydia Lunch.

Além de Manuel João Vieira, Sérgio Godinho e Zé Pedro, Jorge Palma é outro dos artistas a marcar presença no primeiro mês de vida do novo Ritz, com um concerto amanhã, às 23h00. “Também vamos apostar em bandas nacionais que estão agora a dar cartas [como os Linda Martini, no dia 25], já que o Ritz sempre foi impulsionador de novos artistas.”

Os Da Weasel foram uma das bandas nacionais que se afirmaram naquela sala. “Demos lá um dos concertos mais importantes da nossa carreira”, recorda Carlão (Pacman). Em meados dos anos 90, o concerto teve convidados como Sérgio Godinho e Boss AC. “Foi numa altura em que os Da Weasel ganharam um equilíbrio como banda e junto da crítica e do público.”

Carlão lembra-se bem da sala, “com muita alma e muito carisma”. “Lembro--me que o Kadhafi, que tomava conta do Ritz na altura, estava com medo porque o chão estava todo a tremer no fim do espectáculo, aquilo quase ia abaixo.”

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