A problemática da construção em altura, levantada pelos projectos para a zona ribeirinha de Lisboa, centra-se sobretudo na questão do papel dos planos de ordenamento, de vários níveis, e na questão dos procedimentos de decisão e de participação dos cidadãos.
Não obstante as formas de planeamento que o Estado pode assumir – dirigista, regulador ou supletivo – a prática demonstra que os princípios orientadores são desvirtuados pela aplicação dos mesmos, tendo em conta que, em Portugal, são os planos regionais e metropolitanos que se adaptam à especificidade dos Planos Directores Municipais, muitos deles conflituantes e imbuídos de egoismo bairrista, subvertendo uma lógia racional, autistas de uma visão espacial mais alargada que os limites do concelho. È o que se passa nas áreas metropolitanas, sobretudo em Lisboa, onde o conceito de cidade há muito ultrapassou as suas fronteiras, mas é gerida compartimentadamente.
Com a criação das novas autarquias supra-municipais o procedimento de decisão complica-se, dado que em oposição ao poder autárquico, eleito democraticamente, há poder metropolitano, mais abrangente, mas sem legitimidade para impor a visão racional da gestão alargada do espaço.
Os planos em Portugal são pouco assertivos e imperativos, onde a decisão surge afastada da necessária participação dos cidadãos, muitas vezes confrontados com o facto consumado e o seu direito transformado em mero pro forma ou subvertido numa garantia contencioso, ou seja, apenas poderão atacar decisões, não apenas generalistas ou colectivas, mas também violadoras de directos individuais consagrados constitucionalmente, pela via contenciosa, provocando gastos dispensáveis e acabando, também eles, por colidir com interesse público – vejam-se os custos da paragem de uma obra pública.
Ao invés do que acontece na Europa, em que o planeamento vai sendo cada vez menos imperativo, por existir uma consciência cívica esmagadora, em Portugal, o facilitismo administrativo não é remédio para um enorme deficit de cidadania e rigor, que também atinge a classe dirigente.
Hoje, discute-se o que nos é colocado e não que devia ser discutido, quando a participação dos cidadãos constitui-se como uma forma de colaboração e controlo da administração e como acréscimo de legitimação, sendo em si um limite aos cidadãos, por também não permitir que sejam co-decisores.
A construção em altura é uma questão específica e diferenciada da discussão dos PDMs e Planos, pois induz mais intervenção, possui mais elementos subjectivos, sobretudo o estético e o emocional.
A falta ou excesso de informação nestes casos também faz corer o risco de inquinar a participação, dificultando os consensos, sobretudo com o referendo local, que, nestes casos, se afirma como clara desresponsabilização do processo de tomada de decisão. Ao reduzir a complexidade da questão, entre o sim e o não, elimina as nuances, as perspectivas necessárias e o dever da administração de liderar, conscientemente, a criação do seu conceito de cidade e demonstrar que, como acontece na maioria dos casos, não está refém dos lobbys imobiliários, sacrificando algo que lhe é anterior e superir: a história e a alma de uma cidade.
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