A inauguração de um hotel em Albufeira fez notícia e reportagem curiosíssima na SIC. No meio de toda aquela excitação e flutes de 'Porto Bay', e elogios de parte a parte (que país este!), eis que surge o seguinte protesto contra a CML - calcule-se, por, desta vez, estar a zelar por um dos bairros resistentes de Lisboa, o Bairro Barata Salgueiro (que, aos ignorantes, convém informar que é o primeiro bairro a ser construído no pós-Avenida da Liberdade, destinado à classe média da altura e composto por quarteirões elegantes, bem desenhados e com prédios de autor; e que se encontra, apesar de tudo, ainda mais ou menos íntegro e homogénio). Reza assim:
«António Trindade, presidente do Grupo Porto Bay, responsabiliza a Câmara Municipal de Lisboa dos sucessivos atrasos no processo de licenciamento do hotel de 4-estrelas que a rede quer construir no centro da capital portuguesa e admite que já “teria desistido do hotel se estivesse noutra fase”.
O hotel está previsto para a Rua Rosa Araújo, perto da Avenida da Liberdade, mas o processo tem vindo a arrastar-se durante vários anos, levando o presidente a afirmar que “Lisboa tem sido um dossier muito difícil”.
Há “três anos e meio que estamos à espera para arrancar”, referiu, depois de sublinhar que o projecto já foi aprovado, mas o processo continua a sofrer sucessivos atrasos na Câmara Municipal.»
Refira-se que o projecto em causa é da autoria, ao que se sabe, do Arq. Valsassina, e terá este aspecto (fotos), na linha, aliás do 'frenesi travesti' que insistem em metamorfosear aquela que foi a avenida mais bonita do país:
Já os prédios em que os Srs. Trindade (já que o que é de pai será de filho, ou não é assim?) pretendem construir, esses estão devolutos há anos, há muitos mais que três anos, e, numa cidade decente, corrijo, numa capital decente, a edilidade e/ou o governo, teria intimado os seus proprietários a fazer obras e a reabilitá-lo.
Muito menos imagino um projecto destes em pleno boulevard nobre de Paris, Roma ou Madrid. O portugués despreza, realmente, o pouco que tem. Viva o 'pugresso'.
O terceiro andar de um dos edifícios em causa, o n.º 6, foi ocupado ao longo de quarenta anos por aquela que chegou a ser uma das mais activas instituições musicais da cidade de Lisboa.
ResponderEliminarNo final do século, a Juventude Musical Portuguesa chegou a adquirir todo o imóvel, exercendo o direito de preferência enquanto inquilina do anterior proprietário.
E Pedro Santana Lopes, cujo escritório de advocacia fica no «mono» da esquina, ao tempo presidente da Câmara Municipal de Lisboa, chegou a dar uma entrevista dizendo que conhecia de cor os prédios devolutos, citando esse mesmo n.º 6... quando era o edifício gémeo, o n.º 4, que tinha apenas um inquilino e estava em pior estado, e o nº 8 estava já emparedado
Depois, o n.º 4 viria efectivamente a ser alvo de obras de recuperação -- o que não deixou de causar estranheza, pois que vazio ficou --, e a Juventude Musical Portuguesa vendeu o seu imóvel, que estava «ensanduichado» num projecto imbecil qualquer.
Adivinhava-se o pior. O andar de baixo foi murado, a Rua Rosa Araújo -- o nome de um dos presidentes da Câmara que mais árvores plantou, segundo me consta -- ficou mais pobre.
Quanto mais não fosse, porque lá se vão outras das mais belas janelas de Lisboa.
Só mais uma coisa, quanto às imagens do arquitecto:
ResponderEliminarÉ impressão minha, ou a primeira coisa a fazer é deitar abaixo as árvores que já lá estão?
E desde quando é que uma rua absolutamente lotada por carros, com estacionamento em espinha (mas só de dia, porque à noite não vive lá ninguém e a rua está entregue aos morcegos do Jardim Botânico), vai passar a ter apenas dois carrinhos topo-de-gama a ladear o passeio?
é caso para dizer que a cidade está entregue à bicharada
ResponderEliminarOs únicos bichos são vocês! Raros felizmente!
ResponderEliminarSe não fosse este tipo de projectos a cidade estaria bem pior.
Que tonto!
ResponderEliminarBichos são essas térmitas que, deleitando-se no esterco da especulação e na medíocridade dos seus projectos, vão "comendo" o que resta da Lisboa romântica, destruindo o nosso património e a nossa história!!!
ResponderEliminarÉ claro que podia ser bem pior, mas isso não significa que tenhamos de ficar deleitados com a manutenção de fachada.
ResponderEliminarAliás, tanto quanto sei, pelo menos um dos edifícios tinha um preço absolutamente ridículo por metro quadrado... Mesmo antes da duplicação de andares e de projectos faraónicos.
Isso é especulação. E é também uma opção.
è sempre o mesmo que anda nestas andanças; ele é autor do "calhau" do Largo do Rato, ele é autor desta "capeline", ele anda metido no projecto do "Jardim Botânico"...
ResponderEliminarMais tratar da publicidade nas revistas da especialidade...
Bem, o homem não pode conseguir dormir a pensar nisto tudo.
Mau de mais
ResponderEliminarManuel Correia Fernandes, Arquitecto
De acordo com os dicionários, a palavra "fachada" significa "aspecto de pessoa ou coisa que não corresponde à realidade, à verdade, que é falso ou postiço". A expressão "é só fachada!", que usamos com frequência, exprime essa mesma ideia, que também se aplica à arquitectura e com o mesmo significado.
Do ponto de vista dos princípios, um edifício é um todo e não pode ser amputado de nenhuma das suas partes sob pena de perder a sua coerência. No essencial, um edifício é originariamente concebido para cumprir uma dada "função" e, por isso, tem uma determinada "forma". Significa isto que um edifício pensado para um determinado fim jamais pode ser útil noutra qualquer função? Claro que não.
Todos sabemos que a história dos edifícios, sobretudo daqueles que melhor resistem ao uso e ao tempo, é feita de muitas mudanças. Por vezes, muda a função, mas mantém-se a forma, outras vezes muda apenas a forma e outras, ainda, muda tudo. Alias, nesta matéria, não há lugar a qualquer fundamentalismo. A questão não é a de aceitar ou não a mudança mas, antes, a de saber que mudança se pode ou deve fazer em cada momento. Uma coisa é certa em Arquitectura, não há receitas. Receitas, só na farmácia e, mesmo aí, sabemos que a prática acompanha a evolução do conhecimento.
No entanto, um edifício não é apenas "forma e função". Um edifício é muitas outras coisas e tem muitas outras partes e elementos que são conjugados de muitas e diferentes maneiras para produzir os diferentes complexos construídos que são as edificações. Uma edificação também tem, por exemplo, dentro e fora, cimo e baixo, frente e traseira (tardoz), infra-estrutura e superstrutura e assim por diante. A arte de construir é a arte de conjugar todos estes factores, o que torna a Arquitectura numa arte de grande complexidade que é necessário compreender para com ela se poder lidar tal como acontece com qualquer outra actividade de qualquer outra área do conhecimento.
Evidentemente que, parafraseando um dito popular conhecido, se pode dizer que "de arquitecto e de louco todos temos um pouco" e, por isso, muitos se atrevem a ter opinião sobre matérias que não conhecem. Claro que todos podemos ter opinião sobre a Arquitectura que é uma coisa sem a qual nenhum de nós pode viver. Contudo, uma coisa é ter opinião sobre o que usamos ou utilizamos no nosso dia-a-dia e outra, bem diferente, é ser capaz de fazer ou produzir isso que usamos. Gostamos do nosso carro, do nosso relógio ou da nossa mesa, mas isso não quer dizer que sejamos capazes de fazer qualquer desses objectos, de os reparar ou de os transformar sem lhes retirar as qualidades que reconhecemos e gostamos de ver neles.
"Recuperar" ou "reabilitar" é, no entanto e sempre, um acto de "transformar". É por isso que intervir num edifício para, pretensamente, o "recuperar" ou "reabilitar" (para a mesma ou para qualquer outra função) requer a consciência e a responsabilidade que só o conhecimento proporciona. Ora, não se pode "transformar" quando não se conhece nem se compreende o que se pretende transformar. Por outro lado, tomar a parte pelo todo é sinal de ignorância e só por milagre não resulta num acto de pura "destruição". No entanto, está a tornar-se "política" corrente e - pior ainda - aceitável, utilizar o expediente tosco de "conservar a fachada" que é apenas parte dum todo para fazer o que, vulgarmente, se designa por "recuperação" (de edifícios). Nestes casos, podemos dizer que estamos perante uma opção que, por ser falsa e postiça, "é só fachada" e, portanto, literal e culturalmente, errada e mentirosa. Mau de mais para ser aceitável.
in Jornal de Notícias de 16-5-2008
Esta sim é uma solução muito satisfatoria para os prédios antigos que abundam na cidade de Lisboa. É claro que o nosso desejo seria que a CML reconstruisse todos esses mesmos prédios, e que todas essas recuperações fossem feitas por arquitectos, com o mínimo de cultura ...e um pouco de amor pela cidade de Lisboa. Acho que a ideia é muito positiva, recuperar a fachada do edificio, e tentar dinamizar novamente a zona. Agora lanço uma pequena questão, muitos prédios estão a ser demolidos, outros são totalmente recuperados, e alguns prédios, (poucos) como este, podemos ver que houve um estudo, uma analise, e uma decisão de manter a fachada do prédio e contruir de raíz um edificio novo; com o fim de voltar a dar vida ao prédio que de certeza mais tarde ou mais cedo podia acontecer o pior. No meu ponto de vista acho que foi formidável esta acção.... fossem assim todas...
ResponderEliminarO beijo do vampiro tem os seus encantos, mas o da parasita...
ResponderEliminarTudo isto se deve à falta de regulamentos camarários e à inexistência de planos de pormenor. O empresário tem razão quando afirma que é impensável que decisões como esta levem mais de três anos a serem resolvidas. Das duas uma: ou é possível uma construção deste tipo ou não, é numa zona protegida como é o caso. Qualquer investidor deveria saber, à priori, se era possível ou não construir um projecto destes. Ou seja, saber quais as regras do jogo para fazer a sua opção. Coisa que, infelizmente, a autarquia é incapaz de elucidar.
ResponderEliminar