(in Público, 10.07.2008, Catarina Prelhaz)
Peritos defendem que direito de preferência na permuta da Feira Popular violou o interesse público
«A laranja dá aquele sumo? Não, a laranja não dá aquele sumo. O ex-director-geral da Empresa Pública de Urbanização de Lisboa (EPUL) para a área de intervenção do Parque Mayer entre 2003 e 2004, Bernardo Pinto, não vacilou na metáfora: da laranja Parque Mayer, propriedade da Bragaparques, jamais poderia sair um sumo de 50 mil m2 de construção de forma a legitimar a troca com o "terreno mais valioso de Portugal", um lote camarário de 61 mil m2 de área edificável em Entrecampos.
Professor na área de Promoção Imobiliária no Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa (ISCTE), Bernardo Pinto logo justificou a tirada ao colectivo de juízes, arrumando as ideias por partes, metáforas e números. Primeiro, a área máxima de construção permitida pelas normas urbanísticas em vigor (Plano Director Municipal) não chega a metade do valor envolvido no negócio (cerca de 22 mil m2). Segundo, porque sendo o Parque Mayer um espaço sobretudo afecto a equipamentos culturais, não é equiparável em termos de preço a um terreno "limpo e livre" como o da Feira Popular de Entrecampos. "O valor da laranja é o valor do sumo que ela vai dar. Esse é o único método que existe em finanças empresariais. Acreditar que um teatro tem rendimento equivalente a um apartamento de luxo é algo que nunca vi", ironizou Bernardo Pinto durante a segunda sessão do julgamento da acção movida pelo vereador José Sá Fernandes contra o município de Lisboa, a EPUL e a Sociedade Parque Mayer (Bragaparques) com vista à anulação do negócio de 2005, que ontem decorreu no Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa.
A resposta do ex-dirigente da EPUL não satisfez a advogada da ré Sociedade Parque Mayer, Rita Matias, que contrapôs, sem resposta: "Quer dizer então que, se os equipamentos culturais dão custos negativos, o privado teria ainda de pagar à câmara para que ela lhe ficasse com os terrenos?".
Parte II: o "bolo às fatias"
"E vender o bolo inteiro dá mais dinheiro? Não, às fatias é melhor." A convicção é de Bernardo Pinto, para quem a decisão da Câmara de Lisboa em vender em hasta pública de uma só vez o único lote remanescente da Feira Popular atribuindo direito de preferência à Bragaparques fez com que "o interesse público não fosse minimamente salvaguardado".
As outras testemunhas de Sá Fernandes ontem ouvidas pelo colectivo de juízes presidido por Silva Ribeiro corroboraram a opinião do ex-dirigente da EPUL. "Quem tem o direito de preferência num processo destes pode sempre guardar-se para exercer essa prerrogativa mais tarde. Não vai a jogo e espera pela última licitação para cobrir o valor. Caso esse direito não existisse, o principal interessado ia a jogo e o valor dos terrenos subia", argumentou Bernardino Aranda, economista e assessor de Sá Fernandes. Da mesma forma, explicou o ex-director de Planeamento e Gestão Urbanística da autarquia, António Cardoso, vender o lote nos 15 blocos mais pequenos que o constituíam teria atraído mais interessados e, como tal, potenciado maiores licitações.
Numa sessão em que o advogado do município (que agora também defende a nulidade da permuta), João Correia, voltou a insistir no carácter opinativo dos cinco depoimentos, Rita Matias optou por questionar as testemunhas acerca da exequibilidade da venda em 15 lotes, persistindo em perguntar se não seria inviável construir um número igual de entradas e saídas de estacionamento para a Av. da República ("há mais três frentes que podem ser utilizadas para isso", notou uma das testemunhas) e se não seria melhor para o interesse público o planeamento homogéneo da área (os questionados anuíram).
Parte III: números díspares
A discrepância entre as avaliações feitas aos terrenos foi outro dos aspectos enfatizados. Segundo Bernardo Pinto, que saiu da EPUL em 2006 na sequência de um processo disciplinar, os estudos realizados por entidades externas à câmara apresentaram resultados com disparidades de 50 (o Parque Mayer chegou a ser avaliado em 10 milhões de euros pela Benege e em 60 pela consultora Richard Ellis) e 69 milhões de euros (o valor de Entrecampos atingia os 39 milhões num estudo do engenheiro António Camarinhas e 108 numa análise da Richard Ellis). Ainda assim, frisou, as principais consultoras imobiliárias reconhecem que o preço de um escritório ou de uma habitação na Av. da Liberdade ou em Entrecampos é semelhante ou superior nesta última localização.»
Mas não há quem ponha mão nesta Bragaparques?
ResponderEliminar"o valor de Entrecampos atingia os 39 milhões num estudo do engenheiro António Camarinhas e 108numa análise da Richard Ellis.."
ResponderEliminarHumm....e estes tipos são pagos a preço de ouro. Uma pequena diferença de 69 milhões. Ou houve aqui um incompetente bem pago......ou dois ??
JA