In Público (9/9/2009)
Por Inês Boaventura
«Dono de prédio do Bairro da Liberdade viu-se privado das rendas que cobrava e a autarquia nunca mais o deixou arrendar. Motivo: ia fazer obras e agora quer reordenar a zona
Com lágrimas nos olhos e a voz embargada, Manuel Costa vai desfiando a triste história que vem vivendo desde que em 2004 a Câmara de Lisboa decidiu mandar desocupar todos os imóveis de um dos lados da Rua Inácio Pardelhas Sanches, na encosta do Bairro da Liberdade, incluindo um prédio de que é co-proprietário.
As rendas que recebia, e que a autarquia se comprometeu a pagar como forma de compensação, deixaram de ser entregues ao fim de 18 meses (ou 24, na versão da porta-voz do município). O imóvel, que tinha sofrido obras recentes, foi "pilhado e vandalizado" e acabou por ser emparedado, impossibilitando os proprietários de acederem ao seu interior.
Em desespero de causa, e convicto de que está a ser alvo de uma profunda injustiça, Manuel Costa resolveu agora afixar em duas das frentes do prédio três faixas denunciado a situação que classifica como "inacreditável". "Câmara de Lisboa não funciona", "Câmara de Lisboa devedora" e "Câmara de Lisboa não cumpre" são as acusações que o reformado de 67 anos vinha confidenciando a quem o ouvia e que desde anteontem se tornaram públicas e visíveis para todos os que passam no Bairro da Liberdade e no Eixo Norte-Sul.
"Isto traz-me completamente destruído. É de uma falta de consideração que nunca vi", desabafa Manuel Costa, lembrando que, segundo a autarquia, a desocupação dos prédios era coisa para durar uns oito meses, tantos quantos os que levariam as obras de sustentação da encosta. Outra promessa que ficou por cumprir foi a de que as rendas (cerca de três mil euros mensais) seriam pagas pela câmara.
O pagamento até foi feito, mas só até Dezembro de 2005, fazendo Manuel Costa e o irmão perderem qualquer coisa como 128 mil euros. No início deste ano, durante uma visita de António Costa ao Bairro da Liberdade para assistir à demolição de algumas habitações e apresentar uma proposta de intervenção na zona, o proprietário ficou a saber que um despacho do tempo de Santana Lopes dizia que as rendas seriam pagas durante um período máximo de 18 meses. Uma novidade que o reformado estranhou, já que a renda da loja que existia na base do seu prédio continua a ser paga.
Cinco anos depois da desocupação forçada, Manuel Costa diz que continua impedido de arrendar os andares e acrescenta que já nem sequer pode entrar neles, porque depois de uma onda de pilhagens a câmara optou por emparedar os edifícios (oito segundo Manuel Costa) dos quais não conseguiu tornar-se proprietária. "Ofereceram-me um valor irrisório", conta, afirmando que só quer justiça e que não quer "complicar a vida da câmara nem os projectos" para o bairro.
As faixas de protesto anteontem colocadas são apenas mais um acto da luta ao estilo David contra Golias que Manuel Costa vem travando nos últimos anos. Depois de bater a muitas portas da Câmara de Lisboa e de enviar cartas (mais de 50) a todas as entidades públicas de que se foi lembrando, esta é uma tentativa desesperada para vencer o gigante que acusa de, na prática, lhe ter confiscado a propriedade sem qualquer contrapartida. »
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