In Público (10/2/2010)
Por Ana Henriques, Inês Boaventura e Carlos Filipe
«Sem orçamento municipal ou avanços visíveis em projectos estruturantes, a coligação que venceu as autárquicas na capital fica para já marcada por polémicas como a Red Bull Air Race
Tiveram mais trapalhadas do que seria desejável os primeiros 100 dias de governação de António Costa na Câmara de Lisboa. A confortável maioria absoluta que nem o próprio acreditava alcançar não o resguardou de casos um pouco mal explicados, como o empenhamento na dispendiosa corrida de aviões Red Bull e o abate de árvores na remodelação do jardim do Príncipe Real. E o relacionamento com a Igreja também lhe trouxe alguns dissabores neste início de mandato, por via da aceitação de homossexuais nos Casamentos de Santo António, de que teve de desistir. Cauteloso, o líder da maior autarquia do país. remeteu-se ao silêncio quando estalou a polémica provocada pela construção da igreja de Troufa Real no Restelo, uma obra aprovada pelos seus antecessores.
Já na planeada extensão do terminal de contentores de Alcântara marcou pontos, ao impor à concessionária Liscont uma série de condições para a obra ser feita - contornando assim o facto de o Governo ter ignorado a opinião da cidade nesta matéria.
Tema de aceso debate na campanha eleitoral, a situação financeira do município passou para segundo plano, apesar de o PSD insistir em que se assiste a "um significativo crescimento da despesa corrente, sem qualquer tendência de abrandamento". Só que o imprevisível apagamento de Santana Lopes enquanto líder da oposição tem minorado o impacto das críticas sociais-democratas. Pagas ou renegociadas, as dívidas a fornecedores já não são, neste mandato, motivo de vergonha para quem governa a autarquia.
O mesmo não se pode dizer dos problemas relacionados com o trânsito. Depois de, no mandato anterior, ter anunciado uma tolerância zero para com o estacionamento irregular - objectivo que nunca conseguiu levar por diante -, António Costa resigna-se agora a prometer, através do seu vereador da Mobilidade, Nunes da Silva, um combate às segundas filas, concentrando a luta nos "eixos fundamentais de Lisboa".
Já o orçamento para 2010 ainda não foi entregue para discussão e o ano já vai no segundo mês. Em comparação, em 2009, as linhas mestras das finanças camarárias foram divulgadas no final de Novembro.
No seu primeiro mandato, António Costa lançou um ambicioso programa que prevê a modernização de praticamente toda a rede pública do pré-escolar e primeiro ciclo do ensino básico, algo que, segundo o autarca, vinha sendo negligenciado há mais de uma década. Neste momento, são seis as obras em curso, entre as quais se inclui a construção de quatro novos estabelecimentos, mas o presidente já anunciou que há mais seis em fase de concurso e 13 em projecto.
Com programa de acção e a contratação de um empréstimo de 120 milhões de euros aprovados, a batalha pela reabilitação urbana da cidade, envelhecida e degradada, poderá contribuir para algum sucesso do programa de habitação. Um e outro contribuiriam para travar a debandada de novos casais para os concelhos vizinhos, onde viver fica mais em conta, e estancariam a desertificação do centro histórico. A requalificação da Mouraria (sete milhões de euros)e o rejuvenescimento dos outros bairros históricos (Bairro Alto, Baixa-Chiado, Alfama e Castelo, Madragoa e Marvila) incluem-se nas 345 empreitadas previstas. A autarquia admite que este programa pode criar cerca de 5000 postos de trabalho em Lisboa. Objectivos ambiciosos que não caberiam, naturalmente, em 100 dias de governação.
Notas positivas e negativas
"Está a ser articulado um trabalho para quatro anos, e se de fachada pouco ainda se vê, ele desenvolve-se nos gabinetes, com as freguesias, para maior proximidade às populações. Reitero o apoio e a minha total confiança ao presidente António Costa."
Carlos do Carmo, fadista, mandatário de campanha
"É uma óptima equipa, com governação moderna, cosmopolita e corajosa. A Carta Estratégica é uma constituição para a cidade e é corajoso o investimento que tem sido feito nas escolas e jardins e não as parvoíces de túneis. Ainda há muito caminho a percorrer, mas a procissão já deixou o adro."
João Seixas, geógrafo, comissário da Carta Estratégica de Lisboa
"A falta da consciência da importância da reabilitação urbana do centro histórico é o mais grave problema e o melhor exemplo é a decrepitude da Baixa.
O único raio de luz vem da sociedade civil, que está a reagir. Nos jardins de São Pedro de Alcântara e do Príncipe Real uma espécie de síndroma da tosquia vitimou muitas árvores em nome da criação de terreiros.
António Sérgio Carvalho, historiador de arquitectura
"Coisas positivas, só se for a criação de lugares de estacionamento para motociclos, o que é caricatural.
A criação de ciclovias foi um desastre, pois foram mal feitas e comeram espaço dos passeios e paragens de autocarro."
Manuel João Ramos, antropólogo, ex-vereador na CML
"Não é perceptível qualquer mudança para uma resolução estruturada dos problemas da capital: degradação do parque habitacional; mau estado do espaço público; aceleração da destruição do património; trapalhadas do Red Bull e os casamentos de Santo António. A igreja do Restelo e o Jardim do Príncipe Real são duas realidades emblemáticas da impotência e prepotência da CML.
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Helena Roseta precisa urgentemente, de se demarcar desse Titanic...
ResponderEliminarA opinião do sr. fadista Carlos do Carmo é de fartar de rir: a câmara está a trabalhar, sim, mas nos gabinetes!
ResponderEliminarCom tanto problema de Lisboa identificado e com soluções mais que conhecidas, a câmara trabalha nos gabinetes e a gente fica toda contente.
Já agora, a Red Bull Air Race também está a ser tratada nos gabinetes, eh eh eh
Foi bonito ver o senhor geografo João Seixas à boleia das várias cores politicas se auto elogiar.
ResponderEliminarAntónio Sérgio Rosa de Carvalho, Manuel João Ramos: criticam.
ResponderEliminarUau, que independência!
Onde é que já ouvimos falar destes senhores?
Manuel João Ramos foi eleito vereador mas não chegou a meio do mandato, não foi?
ResponderEliminarÉ que mandar bocas não custa nada, é bem mais fácil que ter pelouros e apresentar trabalho.
Francamente...
Estes políticos de aviário partidário, que não passam de pintinhos, chegam ao poder e querem vestir as plumas de pavões. Só assim se compreende a devoção com que adoram rocks em rio, red bulls e eventos sociais do género. O que é que a cidade ganha com isso? Mais buracos tapados? Mais casas reabilitadas? Mais espaços verdes? Melhor iluminação pública? Melhores escolas? Mais creches e lares? Mais transparência na administração? Porque é que teimam em dar circo ao povo se o povo, neste momento de crise, só reclama a esmola do pão?
ResponderEliminarEsteja descansado: independência é apoiar a treta de executivo que temos, já percebemos.
ResponderEliminarBobagem da semana esse artigo
ResponderEliminarRealmente, procurei o orçamento 2010 e não está publicado no site. Apesar da decalagem em virtude das eleições de Outubro 2009, já devia estar aprovado.
ResponderEliminarSó para comparar, a Câmara do Porto elaborou o seu "orçamento 2010" em Dezembro/2009 e aprovou-o nos primeiros dias de Janeiro.
Não será por falta de orientações estratégicas.
ResponderEliminarA Carta Estratégica de Lisboa (2010 - 2024), da qual participei em algumas sessões e dei contributos através do e-mail, é um bom documento de orientação para o que se quer ou se pode fazer pelo futuro da cidade. Podia ser mais ambicioso? podia, mas nas sessões que eu participei vi poucos cidadãos interessados, poucos deputados municipais da oposição, poucos presidentes de juntas (da minha junta, nem presidente nem secretários nem nada).
O Plano Local de Habitação (PLH), com o qual também concordo e avalio positivamente apresenta também boas orientações estratégicas para o futuro.
O PIPARU e o empréstimo para o financiar já foram ambos aprovados.
A carta estratégica está para apreciação nas diversas comissões da AM e o PLH, segundo penso saber, já foi aprovado na AM.
Do que estarão à espera para se porem a trabalhar?