05/11/2010

Investimento no Orçamento Participativo ficou aquém dos dez milhões anunciados

In Público (5/11/2010)
Por Inês Boaventura

«Pelo menos três obras, valorizadas em 1,6 milhões de euros, não foram pagas pelo Orçamento Municipal. Os projectos vencedores de 2010-2011 são conhecidos hoje


Há projectos que ainda não saíram do papel

Nos últimos dois anos, a Câmara de Lisboa anunciou que reservaria para o Orçamento Participativo cinco milhões de euros, mas o investimento em empreitadas sugeridas e votadas pelos lisboetas tem ficado aquém desse valor, pelo menos no que diz respeito à primeira edição. Na de 2008-2009, por exemplo, alguns projectos foram pagos por outras entidades, que se substituíram à autarquia no pagamento de investimentos que rondam os 1,6 milhões de euros.

É o caso da pista ciclável, entre o Vale de Chelas e o Parque das Nações, para a qual a autarquia tinha anunciado 625 mil euros do orçamento camarário. Afinal o projecto custou 767 mil euros e foi pago pela ANA - Aeroportos de Portugal, como contributo para a "existência de condições de acesso dedicado a peões e bicicletas ao Aeroporto de Lisboa".

Algo semelhante aconteceu com a pista ciclável entre a Avenida Calouste Gulbenkian e o Parque Eduardo VII, na qual, dizia a câmara, iria gastar 650 mil euros. Já com o projecto em execução, a autarquia veio dizer que esta era uma "obra efectuada no âmbito de protocolo de contrapartidas com a REN" e, mais tarde, no Relatório de Gestão 2009, afirmou que a empreitada tinha sido concluída "no âmbito do protocolo com a EDP".

A EDP, através do gabinete de comunicação, negou ao PÚBLICO a autoria da obra. Já a REN confirmou, através da sua agência de comunicação, que executou a ciclovia, no âmbito de um pacote de "medidas compensatórias", com um valor global de "um milhão de euros", acordado com a autarquia aquando da construção de uma subestação eléctrica em Monsanto.


EDP e APL pagam pista

Mais confuso é o caso da pista ciclável entre Belém e o Cais do Sodré. Segundo um protocolo de Setembro de 2008 (portanto anterior ao primeiroOrçamento Participativo), assinado pela Câmara e Administração do Porto de Lisboa (APL), a obra estava avaliada em 650 mil euros e seria financiada, em partes iguais, pelo munícipio e pela APL.

Dois meses depois, o projecto "construção de pistas cicláveis na cidade de Lisboa" obteve 244 votos na primeira edição do Orçamento Participativo e a autarquia decidiu, então, que a ciclovia na frente ribeirinha seria incluída nesse pacote eleito pelos cidadãos. No Relatório de Gestão 2009, a câmara indicava que tal empreitada foi concluída ao abrigo "do protocolo estabelecido entre a CML/APL/EDP".

O gabinete de comunicação da EDP confirmou ao PÚBLICO que a ciclovia entre Belém e o Cais do Sodré "foi executada pela EDP Distribuição, dado tratar-se de uma obra particularmente exigente em termos de iluminação e circuitos eléctricos associados". A mesma fonte acrescentou que "o valor pago (cerca de um milhão de euros) resultou de um pagamento em espécie, no âmbito das rendas devidas no Contrato de Concessão da Rede de Distribuição em Baixa Tensão". A APL, por seu lado, disse que a sua participação na obra "foi muito reduzida, limitando-se ao pagamento do projecto e do arranjo de jardins e de espaços verdes" e recusou indicar qual o valor em causa.

O PÚBLICO perguntou repetidamente à Câmara de Lisboa quais foram os projectos do Orçamento Participativo de 2008-2009 e de 2009-2010 que, contrariamente ao que foi anunciado, não foram pagos pelo Orçamento Municipal, mas não obteve resposta. Somando os valores que a autarquia se tinha comprometido a destinar às três ciclovias que a ANA, a REN, a EDP e a APL admitem ter financiado, obtém-seo valor de 1,6 milhões de euros.

As dúvidas em relação a que percentagem dos cinco milhões de euros foi efectivamente gasta pela autarquia adensam-se com o Relatório de Gestão 2009, no qual se diz que o Orçamento Participativo teve uma dotação de 2,721 milhões de euros, valor do qual pouco mais de 20 mil euros foram de facto executados.»

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