01/11/2011

Ana Gomes quer taxar mais-valias urbanísticas para combater a corrupção


Promotores imobiliários acusados de controlar poder autárquico


Ana Gomes quer taxar mais-valias urbanísticas para combater a corrupção
Sofia Rodrigues in Público

Numa audição pública promovida por Ana Gomes, especialistas em corrupção alertaram para a “cabala” entre o sector imobiliário e o poder local
A eurodeputada do PS Ana Gomes vai pedir uma audiência ao ministro das Finanças e à comissão parlamentar de acompanhamento das medidas da troika para propor a taxação das mais-valias urbanísticas e acabar com as isenções de IMI dos fundos imobiliários fechados como forma de combater a corrupção e promover a justiça social. Estas são algumas das propostas que Ana Gomes ouviu por parte de especialistas no combate à corrupção e a favor de uma maior transparência do Estado, durante uma audição pública por si promovida ontem, em Lisboa.

“No momento em que o Estado está a tomar medidas drásticas – muitas delas injustas – há alternativas e uma delas é ir buscar receita na taxação das mais-valias urbanísticas, em vez de se taxar o rendimento e o consumo”, disse ao PÚBLICO a eurodeputada, no final da audição sobre Criar riqueza, transparência e justiça social para sairmos da crise: soluções fiscais e urbanísticas. O BE já propôs essa taxação no Parlamento, mas foi chumbada.

Pedro Bingre, investigador na área de ordenamento do território e urbanismo, sustenta que o Estado devia reter mais-valias da conversão de um terreno agrícola para um terreno urbanizável. Essa renúncia, segundo Pedro Bingre, acabou por permitir que entre 1990 e 2010 os alvarás de loteamento gerassem uma riqueza equivalente a 120% do Produto Interno Bruto concentrada nas mãos de muito poucos, tendo em conta a valorização dos terrenos nos perímetros urbanos. Para o investigador, o cenário abre a porta a que os promotores imobiliários “corram todos os partidos, escolham os presidentes das concelhias mais adequados”, como forma de controlar o poder autárquico a seu favor.

“Com o parecer jurídico certo e com o número de votantes suficientes nas assembleias municipais podese suspender o PDM [Plano Director Municipal], construir a urbanização e depois voltar a entrar em vigor”, exemplifica.
Pedro Bingre defende mesmo que o Ministério Público “devia criar uma divisão para investigar o que se passou no imobiliário nos últimos 20 anos”.

Teresa Goulão, da Transparência Integridade Associação Cívica (TIAC), aponta o “labirinto” da legislação – há cerca de três mil requisitos urbanísticos e 600 diplomas legais — como “promotor da corrupção”. A construO grupo de trabalho da AR sobre o enriquecimento ilícito vai começar amanhã a tentar chegar a um texto final com base nas propostas do PSD/CDS, PCP e BE. Hugo Velosa (PSD), coordenador do grupo, admite que os sociaisdemocratas podem fazer “ajustamentos” à sua proposta inicial, mas não quer avançar para já com detalhes. Depois de terem sido ouvidos Germano Marques da Silva e Magalhães e Silva ainda está em aberto a possibilidade de chamar Costa Andrade. Se não se chegar a um consenso na comissão, as propostas são votadas em plenário. ção ilegal, diz a especialista, “é uma cabala das câmaras, empresas municipais e até do sector empresarial do Estado – como a Estamo — que foram aves de rapina” do solo português.

O ex-autarca do PSD Paulo Morais observa que a legislação “é feita em três escritórios em Lisboa, que ganham milhares a fazer leis com excepções para amigos e que são os mesmos que depois dão pareceres e vendem aos privados os alçapões que meteram na lei”.

Outro especialista convidado da audição, Luís de Sousa, também membro da TIAC, fez uma leitura do programa de Governo, do documento verde da reforma do poder local — que “não tem uma palavra sobre o assunto” — e das intervenções da ministra da Justiça. E concluiu: “Não me deixam tranquilo sobre uma mudança de rumo ou de paradigma no combate à corrupção”.

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