Por Fernando Nunes da Silva, Público de 15 Fev 2014
(Vereador da Mobilidade da CML no mandato 2009/13)
Quando em 2011 foi aprovada a alteração dos estatutos da EMEL, alargando o seu objecto de actuação à mobilidade em geral e aos modos suaves (peão e bicicleta) em particular – com a correspondente alteração de designação para Empresa Municipal de Mobilidade e Estacionamento de Lisboa –, deu-se um passo decisivo para que esta empresa municipal passasse de facto a actuar como um importante apoio da Câmara Municipal de Lisboa (CML) na concretização da sua política de mobilidade.
De facto, estando o município de Lisboa afastado do planeamento da oferta e da concessão da operação às empresas de transporte colectivo que servem a cidade (ao contrário do que se passa em todos os outros municípios do país que não os pertencentes às áreas metropolitanas de Lisboa e Porto, com a excepção do Barreiro), a actuação municipal no domínio da mobilidade urbana fica assim limitada às áreas do estacionamento, da gestão da via pública, aos modos suaves e aos sistemas complementares de transporte público (como sejam o “Lisboa Porta a Porta” e o transporte escolar), para além do que conseguir articular com os projectos urbanísticos. Manter a actuação da EMEL confinada ao domínio do estacionamento (tal como se verificava desde a sua fundação em 1996), significava por isso amputar a CML de um importante instrumento de intervenção noutros aspectos que influenciam o modo como a mobilidade se processa na cidade, os quais cabem por inteiro na sua esfera de atribuições e competências.
Neste novo contexto, e sem prejuízo de outras acções e projectos que foram desenvolvidos no domínio do estacionamento (como por exemplo a introdução da tarifa diária junto às interfaces de transportes colectivos (TC), a concretização do bilhete integrado de estacionamento e TC, a fiscalização por leitura de matrículas ou o pagamento por telemóvel, para além do alargamento da área de intervenção da EMEL a bairros residenciais sujeitos a forte procura de estacionamento de utentes exteriores), a CML deu orientações precisas à EMEL para avançar com um conjunto de importantes projectos nesta sua nova área de actuação, nomeadamente no que se refere às infra-estruturas de apoio à mobilidade pedonal e à mobilidade eléctrica partilhada. São exemplos do primeiro tipo de projectos a construção do elevador na passagem superior de peões na Rua de Entrecampos, a reabilitação do elevador do bairro de Santos sobre a linha ferroviária de Cintura no Rego, o elevador entre a Av. 24 de Julho e o Museu Nacional de Arte Antiga ou os novos acessos pedonais assistidos à colina do Castelo (entre a Praça do Martim Moniz e a Rua da Costa do Castelo e entre Santa Apolónia e o Largo das Portas do Sol), além do recentemente inaugurado elevador do Castelo, que liga a Rua dos Fanqueiros à Rua da Madalena. No que se refere à mobilidade eléctrica, desenvolveu-se um sistema inovador de bicicletas eléctricas de uso público partilhado – cuja apresentação e teste do protótipo de bicicleta e estação de recarga ocorreu na última Semana Europeia da Mobilidade, na Praça do Comércio – e um sistema de car sharing, também ele inovador, dado que permite o acesso e largada do veículo eléctrico em qualquer ponto da cidade (ao contrário dos que estão em funcionamento noutras cidades, em que o acesso ao veículo só se pode processar nas estações de recarga) e uma gestão em tempo real das utilizações e do posicionamento de cada veículo.
Todavia, se o principal problema foi resolvido com a alteração dos estatutos (até porque o executivo não dispunha de maioria na assembleia municipal, onde estes tiveram de ser aprovados), a resistência à mudança por parte da direcção da EMEL – mau grado o empenho e os esforços dos dois vogais do seu conselho de administração – conduziu ao sucessivo protelamento da concretização de todos estes projectos. Apesar da invejável saúde financeira da empresa, a EMEL preferiu optar por depósitos a prazo em vez de realizar estes projectos, ao mesmo tempo que se furtava ao pagamento anual da renda de concessão à CML.
Não foi por conseguinte por falta de meios e de apoio político da CML que a EMEL não aproveitou ao máximo, como lhe competia, as novas atribuições e competências que os novos estatutos lhe conferiram. Tratou-se, isso sim, de prosseguir uma visão ultrapassada das funções da empresa e do seu papel na mobilidade da cidade, procurando por todos os meios não assumir compromissos em áreas de actuação que não se afiguram rentáveis no sentido empresarial estrito, mas que são fundamentais para o bom funcionamento da cidade e de uma mobilidade mais sustentável. Há quem veja nesta atitude uma forma de “engordar” a empresa para a tornar mais apetecível num hipotético cenário de privatização da sua actividade principal, a gestão e exploração do estacionamento na via pública. Não partilho desta opinião, até porque isso iria contra tudo o que tem sido dito e assumido pelo executivo da CML, além de inviabilizar uma possível contribuição para a operação do serviço de TC da cidade, caso o município aí venha a desempenhar o papel que lhe compete. No entanto, é bom não esquecermos que o contrato de prestação de serviços com a Spark (subsidiária da Empark, principal operador de estacionamento em estrutura na cidade de Lisboa e na Península Ibérica) cessa em 2015, e já há quem se posicione para, face às implicações que isso trará à EMEL, colocar a concessão do estacionamento de superfície como uma solução, até porque as dificuldades financeiras da CML são conhecidas e a obtenção de novas receitas – ainda para mais sem ter os custos que a função social de uma empresa municipal sempre acarreta – é uma necessidade incontornável.
A mudança necessária para a EMEL terá por isso de passar pelo reforço da sua intervenção nas outras áreas que não na do estacionamento na via pública, seja na construção de parques em áreas residenciais onde o défice de lugares é mais notório, seja no apoio aos modos suaves. Prosseguir na postura que pautou a actuação da empresa no último ano, só poderá significar que a CML abdicou de levar por diante as novas missões para que os estatutos da empresa apontam.
Diz-se aqui que a EMEL deve fazer outras coisas, para além de tratar do estacionamento. Faz-me lembrar o que dizia um chefe meu: «Deixem-se de fantasias, e comecem por fazer - e bem - aquilo para que vos pagam».
ResponderEliminarE digo isso porque nem a função básica a EMEL faz bem.
À minha porta vejo, a toda a hora, fiscais a fecharem os olhos ao estacionamento selvagem.Pior: bloqueiam, sem apelo nem agravo, carros que têm o pagamento não regularizado, e nada fazem contra outros que, ali ao lado, estacionam em passeios, rotundas ou paragens da Carris, prejudicando centenas de pessoas.
Um bom repositório de situações dessas (umas revoltantes, outras apenas absurdas) pode ser visto [AQUI].
O que eu gostava de saber é porque a EMEL atua na minha rua, excetuando-se um pequeno largo em frente ao meu prédio, onde quem quer estacionar fugindo ao pagamento, e roubando lugares aos moradores, vem esconder o seu carro aqui. É uma zona pública, faz parte da rua e é passagem pública. Porque não atua a EMEL nestes casos?!
ResponderEliminarAnónimo das 5h39m,
ResponderEliminarNo meu comentário refiro isso mesmo, e até indico um link para uma colecção de situações dessas.
Pode comprovar-se, por inúmeros exemplos, que a EMEL não actua em determinados locais - como cafés, restaurantes, talhos, cervejarias, stands de automóveis, etc.
Uma boa auditoria e meia dúzia de processos disciplinares permitia pôr no olho da rua os que "fecham os olhos". Mas suspeito que isso abrangeria mais gente do que simples fiscais "ceguetas"...