13/07/2020

Projecto Quarteirão da Suíça - Pedido de esclarecimentos ao atelier Contacto Atlântico


A/C Atelier CONTACTO ATLÂNTICO

C.C. PCML, AML. JF, DGPC e media

Exmos. Senhores 

No seguimento de notícia publicada há dias pelo Diário Imobiliário, dando conta da elaboração pelo v/atelier de um projecto de reabilitação para o quarteirão da antiga Pastelaria Suíça, no Rossio, doravante designado por “Rossio Pombalino”, e congratulando-nos, desde já, pelo anúncio aí feito de que será preservada in situ a “Pérola do Rossio”, que não sendo “pombalina” é de facto uma loja histórica desta cidade, solicitamos a melhor atenção de V. Exas. para o seguinte: 

1.Gostaríamos de saber quais os elementos que, conforme é adiantado pela v/representante, serão objecto de uma “intervenção contida e fiel à memória dos elementos originais, mantendo aqueles em que é reconhecível valor arquitectónico e patrimonial”, porque, a acreditar na imagem virtual que é publicada (foto1), a cobertura Mardeliana actual (foto2) é imensamente desvirtuada, uma vez que as célebres paredes corta-fogos, que são elemento primordial do Cartulário Pombalino.
Sendo este quarteirão dos raríssimos que ainda mantêm a geometria original das coberturas pombalinas, com todos os seus elementos identitários (telhado com elegante perfil curvo Mardeliano, águas furtadas também de desenho pombalino e as paredes corta-fogo separando unidades prediais), não vislumbramos justificação para serem substituídas por coberturas mais contínuas e ampliadas desproporcionalmente, aliás.
Esta uniformização, e supressão de empenas corta-fogo, que se propõe, é claramente um empobrecimento da autenticidade pombalina deste quarteirão.

2. Alertamos V. Exas. para a necessidade de preservação e restauro da bela pintura do tecto e dos armários da antiga loja da Manteigaria União (fotos 3 a 6), no piso térreo da fachada do lado da Rua do Amparo, e que serão sempre uma mais-valia seja qual for o negócio que venha a ser aberto nesse espaço.
Tal como será imprescindível a preservação dos cunhais em cantaria da Ourivesaria Portugal e no lado oposto à antiga manteigaria.
Bem como a pequena pala Arte Nova do antigo hotel (fachada do lado do Rossio) e, obviamente, as escadas pombalinas com revestimento a azulejo pombalino (obrigatoriamente, a escada principal que está mais bem conservada) e as chaminés também de origem.  

3. Em relação à memória da antiga Pastelaria Suíça, sugerimos que ponderem uma solução alternativa à do anunciado mural azulejar, quiçá a colocação no interior do futuro espaço comercial, de uma fotografia de grandes dimensões, retratando a referida pastelaria aquando do seu esplendor e, se possível, a colocação dos seus letreiros a néon. Isto porque as recentes experiências de feitura de murais de azulejo, na sua esmagadora maioria, têm-se revelado de um profundo mau gosto e em tudo desnecessárias, contribuindo isso sim para o empobrecimento do resultado final.
Aliás, cremos que a melhor homenagem à Suíça será o restauro rigoroso das suas fachadas comerciais, mantendo todos os seus elementos: caixilharias, vãos, portas e dispositivos publicitários, desde logo os seus néons.

4. Em relação aos interiores dos espaços que não aquela pastelaria, solicitamos que nos esclareçam qual o destino dos inúmeros painéis de azulejos, pombalinos, século XIX, Arte Nova e até modernistas, que ainda existem nos vários edifícios e escadas do conjunto do quarteirão (foto9), apesar de outros tantos já terem sido roubados, como, por exemplo, nos espaços relativos ao antigo Hotel Francforte, e armazéns de tecidos, em que também existem tectos estucados em estilo rococó, inclusive (foto9).
Fazem parte da História deste quarteirão os interiores de qualidade do século XIX, uma realidade patrimonial que não devemos desvalorizar, pois representam uma mais valia para o futuro uso para os edifícios.
Igualmente nos questionamos quanto ao destino a dar ao que resta do projecto de arquitectura de interiores de Conceição e Silva para a Casa da Sorte, e ao painel de azulejos de António Lino. (foto10/LCH, CML)

 ~ 5. Queremos ainda saber o que pretendem V. Exas. fazer em relação aos inenarráveis azulejos que foram colocados na fachada do quarteirão do lado da Praça da Figueira, não só uma operação aberrante tendo em conta o tratamento dado às fachadas dos edifícios na era de Pombal, como uma operação irregular à luz do clausurado em vigor em matéria de Plano de Pormenor e Salvaguarda da Baixa Pombalina.
Contem V. Exas. com o nosso apoio no sentido da remoção desses azulejos e da pintura adequada de todas as fachadas do quarteirão, no estrito respeito pelo Cartulário Pombalino.

6. E ainda no que respeita às fachadas, gostaríamos de chamar a atenção para a placa evocativa a Alfredo Guisado, poeta do Orpheu, ali colocada pela CML já no ano 2000, e para a necessidade de a manter.

7. Finalmente, solicitamos que nos esclareçam sobre o destino a dar aos achados arqueológicos, que serão certamente muitos no local. Serão simplesmente retirados, como é infelizmente regra, ou serão preservados in situ para fruição do público?
Recordamos que além da fachada do antigo Hospital Real de Todos-os-Santos (escadaria encontrada no Restaurante Irmãos Unidos, em 1953), ali existiu a cerca e horta do Convento de São Domingos (com respectivo cemitério), onde foram encontrados vestígios da necrópole romana da Praça da Figueira e também do urbanismo desta zona na Idade do Ferro, amplamente divulgados após os trabalhos arqueológicos dirigidos por Bandeira Freire e Irisalva Moita, no início dos anos 60, e mais tarde pelo Serviço de Arqueologia do Museu da Cidade (hoje Centro de Arqueologia de Lisboa), em 1999/2001. A maior concentração destes achados era precisamente na área da Praça da Figueira, Rua do Amparo e Rua D. Antão de Almada.

Não queremos deixar de referir ainda o seguinte: o conceito de "loja âncora", hoje muito em voga em Lisboa, mas em desuso na maior parte das cidades europeias onde foi implementado, há 25-30 anos, tem acarretado um custo para a Lisboa histórica, traduzido pela abertura de grandes lojas de cadeias internacionais, onde a massificação é por demais evidente, e com forte impacte na arquitectura dos interiores onde são abertas, designadamente pela introdução de escadas-rolantes, e nas fachadas com decorações de janelas e portas de profundo mau gosto. 

Na expectativa, apresentamos os nossos melhores cumprimentos

Paulo Ferrero, Bernardo Ferreira de Carvalho, Miguel de Sepúlveda Velloso, Fernando Jorge, Virgílio Marques, Beatriz Empis,Carlos Boavida, Rui Pedro Martins, Júlio Amorim, Fátima Castanheira, Eurico de Barros, Maria do Rosário Reiche, Fátima Castanheira, Pedro Cassiano Neves, João Oliveira Leonardo, Pedro Machado e António Araújo

1 comentário:

Anónimo disse...

Muito obrigado por agirem!