Por Inês Boaventura, Público de 23 Abril 2014
Este troço da muralha foi descoberto no decurso das obras de reforço estrutural dos edifícios do Banco de Portugal
Foto de José Maria Ferreira
O único troço colocado a descoberto da Muralha de D. Dinis,
mandada construir há mais de sete séculos para proteger a população de Lisboa
dos ataques vindos do Tejo, pode ser visitado a partir desta quarta-feira. Para
ver de perto os 31 metros deste monumento nacional que foram musealizados, há
que descer ao subsolo da sede do Banco de Portugal (BdP), no Largo de São
Julião, em Lisboa.
Este troço da muralha foi encontrado em 2010,
durante as obras de reabilitação do quarteirão que se estende entre aquele
largo e a Rua do Ouro e que integra um conjunto de oito edifícios e a antiga
Igreja de São Julião, todos propriedade do BdP. O objectivo inicial da
intervenção era fazer o reforço estrutural do edificado, mas o seu âmbito
acabou por ser alargado com a decisão de ali se instalar o Museu do Dinheiro e
com as descobertas arqueológicas entretanto realizadas.
Para chegar ao Núcleo de Interpretação da Muralha de D. Dinis é
preciso descer um lance de escadas e entrar numa zona à qual o projecto inicial
de reabilitação não previa que os visitantes pudessem aceder. O director do
Departamento de Serviços de Apoio do BdP, Eugénio Gaspar, sublinha que este foi
um processo feito de “vários compromissos”, que permitiram “tornar compatível”
a função actual do espaço com o acesso público a um monumento nacional.
Numa primeira área é possível ficar a conhecer, enquanto se
ouvem músicas escritas e compostas por D. Dinis, o contexto em que foi mandada
construir, em 1294, a muralha e alguns dos principais factos que marcaram o
reinado do monarca. Depois disso, os visitantes são convidados a percorrer um
corredor, com uma largura reduzida, no fim do qual surge finalmente o troço
descoberto daquela construção.
Mas antes de lá chegar há 25 peças, de várias épocas, para conhecer,
incluindo botões de punho do séc. XIX, estacas de madeira do séc. XVIII, um
azulejo do séc. XVI, vários objectos do quotidiano da época islâmica e
artefactos romanos ligados ao mar. O arqueólogo Artur Rocha sublinha que esta é
apenas “uma pequena amostra” de tudo o que foi encontrado, e que “não chega a
ser um milésimo do total”.
À escolha desta amostra, explicou o arqueólogo, presidiu a ideia
de “dar uma visão diacrónica, da época romana até à actualidade”, mas também a
de revelar a “ligação do rio à cidade”.
Quanto à muralha, Artur Rocha sublinha que esta foi “a primeira
vez em que apareceu num ambiente de escavação arqueológica controlada
cientificamente”. Nos anos 30, recorda, houve notícias da descoberta de um
outro troço, que não foi conservado nem alvo de um registo fotográfico.
Nos trabalhos arqueológicos que se iniciaram no princípio de
2010 e se prolongaram por 11 meses, foi também encontrada “uma grande
quantidade de materiais osteológicos, restos humanos”, acrescentou o
arqueólogo, explicando que esses vestígios serão de “pelo menos 580
indivíduos”, enterrados no local “na primeira metade do séc. XIX”.
O acesso ao Núcleo de Interpretação da Muralha de D. Dinis é
gratuito e pode ser feito de terça a sexta-feira, entre as 10 e as 18h. A responsável
pelo espaço, Sara Barriga, anunciou que entre 17 de Maio e 4 de Setembro,
período durante o qual haverá em simultâneo uma exposição de arte contemporânea
com peças da colecção do Banco Europeu de Investimento, o local estará também
aberto ao sábado.
Segundo Eugénio Gaspar, o BdP realizou um investimento de 450
mil euros para tornar a muralha visitável. O designer Francisco Providência,
responsável pela museografia, não tem dúvidas de que a inauguração deste espaço
trará “novos argumentos de visita à Baixa”.
Museu do Dinheiro só abre em 2015
A sua inauguração chegou a ser anunciada para 2013, mas afinal o
Museu do Dinheiro, que vai ficar instalado no espaço da antiga Igreja de São
Julião, só deverá abrir as portas “no terceiro trimestre de 2015”. A nova data
foi avançada pelo director do Departamento de Serviços de Apoio do Banco de
Portugal, que explicou que esta “reprogramação” se deve ao facto de a
instituição ter decidido “dar prioridade” ao Núcleo de Interpretação da Muralha
de D. Dinis.
Ainda assim, “os dois primeiros núcleos” do futuro museu estão
já acessíveis ao público, apresentando cada um deles uma figura que representa
Hermes, o deus grego do comércio. Numa dessas figuras é possível assistir a uma
animação que dá a conhecer o traçado urbanístico da zona da Baixa antes e
depois do terramoto e noutra os visitantes podem, usando os seus bilhetes de
entrada no espaço, simular acções de troca com Hermes e ficar a conhecer as
várias formas que o dinheiro assumiu ao longo do tempo.
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