27/01/2009

Deputados municipais tentam impedir António Costa de vender palácios

In Público (27/1/2009)
Ana Henriques

«Assunto já tinha sido discutido em privado entre sociais-democratas e socialistas. Gabinete do presidente da autarquia lisboeta diz que PSD tem de "honrar o acordo feito" em segredo


O projecto da Câmara de Lisboa de vender seis palácios para que privados os transformem em hotéis de charme, encaixando as respectivas receitas, pode estar comprometido: a comissão de habitação e reabilitação urbana da Assembleia Municipal de Lisboa está contra esta intenção. Tendo em conta que neste órgão o PSD tem maioria, poderá não ser fácil ao presidente da autarquia, António Costa, concretizar a alienação do património, que iria à praça por 12,7 milhões de euros.

Na actual conjuntura económico-financeira, vender poderá não ser a melhor opção, uma vez que não haverá ofertas suficientemente boas, argumentam os deputados que compõem a comissão, da qual fazem parte duas representantes do PS.
Foi só ontem, depois de saber do problema, que o gabinete de António Costa reagiu desvendando um segredo até aqui bem guardado: a maioria socialista que governa a câmara reuniu-se há algum tempo com os dirigentes autárquicos sociais-democratas para chegar a um entendimento sobre o assunto. Sobre o que terá acontecido no encontro, as versões divergem: segundo os socialistas, alcançou-se, de facto, um acordo relativamente aos palácios que poderiam ser vendidos e o PSD tem de o honrar; de acordo com os sociais-democratas, da lista faziam parte vários outros imóveis, e apenas houve consenso acerca daqueles que deveriam continuar nas mãos da autarquia, tendo sido remetida para mais tarde uma decisão sobre os seis palácios em questão.
Critérios díspares
A discussão do caso estava marcada para hoje, para a assembleia municipal, mas pode vir a ser adiada. O líder da bancada do PSD, Saldanha Serra, que partilha de algumas das objecções da comissão de reabilitação urbana, salienta que ainda faltam os pareceres de mais três comissões, não sendo certo que tenham ficado prontos até hoje. Também na comissão das finanças poderá haver objecções, acrescenta, uma vez que foram usados critérios díspares na avaliação dos imóveis.
A comissão de reabilitação urbana, dirigida por Pedro Portugal Gaspar (PSD), sugere que se analisem "outras opções políticas, designadamente o arrendamento dos palácios a outras instituições, ou mecanismos de parceria e mecenato, pelos quais a autarquia não prescinda da propriedade dos mesmos".
Em causa estão os palácios Braam-camp, Pancas Palha, Machadinho, Visconde do Rio Seco, Benagazil e o edifício do Passo da Procissão do Senhor dos Passos da Graça. A comissão só admite a alienação do Benagazil, por causa do seu estado degradado. Mas também aqui parece haver um problema: Saldanha Serra diz que há uma associação de pilotos a queixar-se de que o edifício lhe foi prometido. No caso do Palácio Visconde Rio Seco, no Bairro Alto, a comissão quer saber por que motivo quer a câmara levar à praça um imóvel que comprou há uma década, quando poderia transformá-lo numa residência universitária, por exemplo.
O Palácio Pancas Palha, em Santa Apolónia, esteve dez anos em reabilitação, e por isso os deputados questionam a venda, exigindo ao mesmo tempo saber se o valor-base da hasta pública, cerca de quatro milhões, cobre o custo das obras. Saldanha Serra recusa-se a avançar o sentido de voto da sua bancada: "Decidiremos palácio a palácio".
a Depois de ver aprovado o seu orçamento para 2009 viabilizado pelos sociais-democratas na primeira reunião da assembleia municipal do ano, António Costa acabou por sair disparado porta fora com a sua equipa, por entender que não tinha de ceder ao aumento do controlo da actividade camarária pretendido, como contrapartida da viabilização, pela bancada "laranja". O abandono intempestivo da reunião foi pretexto para os deputados do PSD enveredarem por uma greve de zelo que lhe poderá sair cara: o esquadrinhamento minucioso de toda e qualquer proposta de António Costa que lhes chegue às mãos. Com as eleições a aproximar-se, o presidente da câmara precisa de ver aprovados os seus projectos para poder mostrar obra. Mas depois de ter deixado de contar com o beneplácito da presidente da assembleia municipal, a social-democrata Paula Teixeira da Cruz, com quem mantinha excelentes relações no início do mandato, começou há pouco tempo a ter de se confrontar precocemente com o seu rival nas autárquicas. É que os autarcas do PSD já pedem orientações a Santana Lopes sobre as votações mais relevantes, sendo que algumas delas têm por objectivo alterar projectos lançados por ele próprio enquanto presidente da câmara. A transferência do Museu da Moda e do Design de Santa Catarina para a Baixa, a ser apreciada em breve pela assembleia, é um desses casos. Compreende-se o fair play de Santana ao permitir a Costa ter um orçamento. Afinal, sabe que tem os socialistas na mão.»

O que está aqui em causa é que a proposta tem que ser reformulada, pois cada caso é um caso. Como é óbvio. E há, a meu ver, um caso grave, que é o da casa de São João de Brito, no Largo Rodrigues de Freitas. E um estranho, que é o do Pancas Palha.

Por outro lado, a experiência da CML em vender património deste gabarito tem-se saldado pelo fracasso, quando não pelo escândalo (basta recordar o Palácio da Rosa, que já devia ser um hotel a esta hora e que o promotor nunca cumpriu o acordo, exigindo ainda à CML pequenos lotes próximos como medida compensatória).

Por princípio, ainda, a venda de património é um acto extremo e não deve ser uma regra. Além de que a maior parte desses imóveis pode ser transformado em hotéis, e continuarem na posse da CML como senhorio, ou não?

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