29/05/2012

Desbloqueadores

Secretas. Silva Carvalho usou Maçonaria para apressar reabilitação de prédio da Ongoing

in http://www.ionline.pt/  - 29 Maio 2012. Por Sílvia Caneco
O ex-espião contactou António Reis, então Grão-Mestre do GOL, para desbloquear a situação junto do IGESPAR


Jorge Silva Carvalho, o ex-director do Departamento de Informações Estratégicas de Defesa (SIED) acusado de violação de segredo de Estado e corrupção passiva no processo das secretas, usou os contactos que tinha na Maçonaria para tentar desbloquear um processo de reabilitação de um prédio da Ongoing que necessitava de aprovação do IGESPAR (Instituto de Gestão do Património Arquitectónico e Arqueológico).
O grupo dirigido por Nuno Vasconcellos, o segundo arguido no processo acusado de corrupção activa e que revelou ontem que vai pedir a abertura de instrução do processo, tinha um prédio no Chiado, onde funcionou o hotel Braganza, que pretendia reabilitar para habitação. O grupo pediu um estudo de reabilitação, mas em Setembro de 2010 a proposta apresentada acabou informalmente rejeitada pelo IGESPAR. A Ongoing apresentou uma nova proposta, mas no início de 2011, continuaria pendente. Perante o entrave, Silva Carvalho pôs mãos à obra e envia a 30 de Janeiro de 2011 um email com a descrição detalhada da situação não directamente ao IGESPAR (a entidade responsável pela aprovação das intervenções), mas a António Reis, historiador e à data grão-mestre do Grande Oriente Lusitano (GOL), da Maçonaria irregular.
No fim do email, o ex-super-espião resumia o objectivo da narrativa: obter uma orientação informal do IGESPAR sobre se valeria a pena apresentar a proposta formalmente para reabilitar o prédio. Um dos pontos de conflito, explicaria ainda no email que consta do processo, estaria relacionado com o estacionamento, já que seria essencial para a Ongoing o estacionamento privativo. Um dia depois, António Reis reencaminhava o email de Silva Carvalho para Elísio Summavielle, então secretário de Estado da Cultura e alegado membro da Maçonaria, a pedir ajuda para destravar o processo. Desde que, sublinhava o historiador que viria a abandonar o GOL, a maior obediência maçónica portuguesa em Setembro de 2011, esse pedido de “orientação informal” fosse uma prática “aceitável” à luz da lei e do funcionamento dos serviços.
A 3 de Fevereiro, o então secretário de Estado da Cultura e actual director do IGESPAR, informava por email que já tinha comunicado a situação a Gonçalo Couceiro, então director do Instituto. E sublinhava que este estaria sempre disponível para falar com o administrador da Ongoing e dar a necessária orientação. A corrente de emails termina nesse mesmo dia com António Reis a dar conta a Jorge Silva Carvalho da resposta “simpática” de Summavielle.
Contactado pelo i, o historiador confirma ter recebido aquele email a relatar “um processo em curso no IGESPAR” e ter falado com Elísio Summavielle, porque dentro dos seus contactos era a pessoa mais próxima do IGESPAR. O professor acrescenta ainda que conheceu Silva Carvalho “em 2008 ou 2009” mas que este pedido de ajuda “foi uma coisa pontual”. “Nem sei qual foi o resultado desta diligência”, afirmou.
Já Elísio Summavielle, apanhado de surpresa por o seu nome aparecer nos emails que contam do processo das secretas, sublinhou ser amigo de António Reis, mas que não tem qualquer relação com Silva Carvalho. “Não me lembro de ter recebido esse email, mas recebia muitos pedidos. A minha rotina é reencaminhar para a pessoa em questão. Deve ter sido isso que fiz.” Sublinhou ainda não ter sofrido ou exercido qualquer pressão para desbloquear o processo ou favorecer um parecer prévio do IGESPAR.
Este é mais um episódio sobre uma possível relação triangular Maçonaria/Secretas/Ongoing, defendida pelo relatório da I comissão parlamentar sobre as irregularidades nas secretas. Não faltam na agenda de Silva Carvalho referências aos encontros da Mozart 49, da Grande Loja Legal de Portugal, no Hotel Ritz. Nem almoços ou cafés com maçons. Nem sequer expressões maçónicas nos emails e sms enviados ou recebidos pelo ex-espião, como a referência à passagem do malhete ou o TAF - tríplice abraço fraternal- da despedida.

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