In Público (4/12/2006)
José António Cerejo
"JUROS DA DÍVIDA SOBEM 148 POR CENTO
Se não conseguir vender o que quer, tal como tem acontecido nos últimos anos, a Câmara de Lisboa ficará sem dinheiro para pagar grande parte das suas despesas
A proposta de Orçamento da Câmara de Lisboa para 2007, que hoje vai ser discutida pelo executivo municipal, aponta para uma redução das despesas da ordem dos 11 por cento, em relação ao orçamentado para o ano em curso. Mesmo assim, para fazer face às despesas, a câmara terá de conseguir obter 311 milhões de euros com a venda de património - coisa que não deverá ser fácil, já que, este ano, a previsão inicial de 350 milhões para receitas desse tipo caíu para 120 milhões e nada garante o seu cumprimento.
O total das despesas camarárias programadas para o próximo ano ascende a 799 milhões de euros, um valor que contrasta com os 897 milhões deste ano e com os 821 milhões de 2005. Entre estes números e a realidade vai, porém, uma grande distância, uma vez que no ano passado, por exemplo, a despesa efectivamente feita não chegou aos 627 milhões. No ano em curso a situação poderá melhorar ligeiramente, mas ainda assim - segundo os números oficiais, citados pelo gabinete municipal do Bloco de Esquerda - a taxa de execução, relativamente às despesas orçamentadas, ainda ia em 42 por cento no final de Setembro.
Por grandes áreas, a despesa orçamentada para 2007 contempla os chamados "serviços gerais da administração pública", onde avultam os vencimentos do pessoal, com 352 milhões de euros (44 por cento do total) e a "habitação e serviços colectivos" com 178 milhões (22,3 por cento). Nesta última categoria integram-se rubricas como a habitação propriamente dita (43 milhões), o ordenamento do território (88 milhões), o saneamento (14 milhões), os resíduos sólidos (16 milhões) e a protecção do meio ambiente e conservação da natureza (17 milhões). Numa outra área aparece a cultura com 28 milhões de euros e o desporto, recreio e lazer com 15 milhões.
Encargos da dívida quase que triplicam
Particularmente significativa, em matéria de despesas, é a verba atribuída aos juros e encargos com a dívida acumulada aos longo dos anos e que passa de 14 milhões no ano em curso para 34,8 milhões no ano que vem. De acordo com o vereador das Finanças, Fontão de Carvalho, este aumento de quase 148 por cento no serviço da dívida prende-se, fundamentalmente, com o facto de muitos empréstimos contraídos há vários anos só agora começarem a ser amortizados, devido aos períodos de carência negociados.Do lado das receitas previstas sobressai o facto de as receitas correntes não irem além de 59 por cento das receitas totais e de o remanescente corresponder, em grande parte, à previsão de venda de património. As receitas correntes somam 471 milhões de euros e as esperadas com a venda de terrenos e prédios aponta para 311 milhões (39 por cento do total). Um dos aspectos menos credíveis da proposta corresponde precisamente a esta estimativa, já que a câmara, tal como o Governo, não tem nos últimos anos, nem de perto nem de longe, conseguido obter as receitas programadas com a venda de património. Procurando contrariar a ideia de que esta proposta - sendo de contenção sobretudo em matéria de investimento, já que grande parte das despesas correntes são incomprimíveis - não inviabiliza o financiamento de novos projectos, Fontão de Carvalho afirma que eles serão desenvolvidos com meios exteriores ao orçamento. Segundo disse à Lusa, está a ser desenvolvido um projecto global de reabilitação urbana cujo financiamento será assegurado pela banca logo que o Governo o autorize, no quadro da lei das Finanças Locais. Uma situação semelhante, acrescentou, está em estudo para a reabilitação do parque escolar, que poderá ser conseguida com recurso a uma pareceria público-privada.
Quem não parece convencido com as explicações e com as opções de Fontão de Carvalho e de Carmona Rodrigues são os vereadores da oposição, que parecem dispostos a mostrar um cartão vermelho ao executivo - nomeadamente por não verem na proposta uma estratégia capaz de fazer face ao endividamento do município, que poderá ultrapassar já os mil milhões de euros, 200 dos quais de dívidas a curto prazo. A salvação da proposta poderá estar na vereadora Maria José Nogueira Pinto, embora a opinião que subscreve nesta página não vá propriamente nesse sentido. Em todo o caso, a autarca do PP já pediu a Carmona Rodrigues para que o orçamento não seja hoje votado, por forma a que se possam discutir eventuais alterações no sentido do seu aperfeiçoamento. Se o veredicto final da oposição vier a decidir o chumbo do orçamento, a situação criada será semelhante àquela que ocorreu em 2004, quando a assembleia municipal, então com uma maioria de esquerda, inviabilizou a proposta do executivo PSD/PP. Nessa altura, o município foi gerido por Carmona Rodrigues, tal como acontece todos os anos em diversas câmara do país, com base em duodécimos do orçamento do ano anterior."
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Sem comentários:
Enviar um comentário