27/04/2012

Mouraria. Lisboa investe 77,5 mil euros para travar drogas e prostituição




Por Pedro Rainho, publicado em 27 Abr 2012 in (jornal) i online
Lisboa aposta em “soluções inovadoras” para reabilitar o bairro

A autarquia lisboeta pretende dar uma nova vida a um bairros histórico da capital, para mudar o estigma de má imagem a que está associado. O In Mouraria é um dos projectos integrantes do Plano de Desenvolvimento da Mouraria (PDCM) – aprovado ontem por unanimidade em reunião de câmara, chegando a receber elogios de partidos da oposição. A ideia passa por apoiar “trabalhadores do sexo e pessoas que usam drogas” na “transição para novas formas de vida”. A notícia de que a Câmara Municipal de Lisboa (CML) pretendia avançar com uma safe house, algo como um local seguro para a prática de sexo, no bairro gerou polémicas. Ao i, João Meneses, responsável pelo Gabinete de Apoio ao Bairro de Intervenção Prioritária (GABIP) da Mouraria e coordenador do PDCM, explica que “a única coisa que se ponderou foi a possibilidade de criar uma equipa de trabalho que estudasse essa hipótese”.

TRÊS DIMENSÕES A ideia caiu por terra para dar lugar ao In Mouraria, um espaço de “encontro e convívio”, projectado a pensar naqueles grupos, para que possam, progressivamente, abandonar os seus modos de vida e optar por outros que sejam socialmente mais inclusivos. O projecto vai actuar em três dimensões: a primeira, ao nível do emprego e do empreendedorismo dos trabalhadores do sexo e toxicodependentes, possibilitando a migração para outras áreas profissionais, com a aquisição de novas competências.

Em segundo lugar, na área da saúde, através da “prevenção e encaminhamento”. E em terceiro, no reforço cívico das pessoas, através da “melhoria da qualidade de vida e um maior acesso a direitos”. Como explica João Meneses, no caso das mulheres que se prostituem “a maior dificuldade para que consigam mudar de vida é o período transitório entre a vida actual e a futura”. É aqui que o In Mouraria entra.

O projecto ficará a cargo do GAT (Grupo Português de Activistas sobre Tratamentos de VIH/sida) e da Obra Social Irmãs Oblatas. O In Mouraria tem um orçamento previsto de 77 500 euros e surge no âmbito do Plano de Dinamização Comunitária da Mouraria (PDCM), que nasceu numa candidatura ao Orçamento Participativo da capital, em 2011. É da autarquia que vai chegar a maior fatia das verbas, para aplicar em obras sociais. A outra parte, bastante menor, chega pelo QREN Mouraria e vai ser utilizada na recuperação do património urbano. No total será disponibilizado um milhão de euros, a repartir a meias pelos dois anos de duração do PDCM (2012 e 2013), mas a intenção passa por alargar o volume de verbas disponíveis, captando novos investidores.

O In Mouraria será apenas uma parte da nova vida do bairro: a próxima etapa é a assinatura de um protocolo entre a autarquia e as instituições que participam nos vários projectos para o arranque da terceira fase dos trabalhos, “o que se espera que aconteça no início de Maio”, refere João Meneses.

PDCM Desde que foram dados os primeiros passos para a reabilitação da Mouraria, em Outubro de 2010, o plano de desenvolvimento do bairro contou com o apoio de mais de 40 instituições de acção social que actuam no território. Com o “desenvolvimento integral dos indivíduos e comunidades” em mente, as instituições trabalharam para garantir que “as pessoas que aqui habitam ou poderão vir a habitar tenham melhores oportunidades de emprego, maior atracção de clientes – no que toca ao comércio –, menos problemas com a saúde e um nível geral de maior bem-estar. Tudo isso é desenvolvimento”, define João Meneses, um desenvolvimento que se consegue com mais e melhor formação da comunidade.

Para colmatar o défice social detectado ao nível da educação, o PDCM vai promover acções de formação junto dos habitantes da Mouraria, aproximando os cidadãos dos valores de “empreendedorismo e inovação”, para além do reforço de competências dos actuais comerciantes locais.

Para João Meneses, o objectivo é que “este território crie condições para melhorar a vida dos que cá habitam, mas também atrair novos públicos, quer para habitar quer para visitar”. Para que tal aconteça, vão ser estimuladas as competências locais (nas áreas de costura e olaria), mantendo as diferenças culturais que fazem hoje parte da vida do bairro. Dos cursos que em breve devem arrancar, espera-se que saiam novas oportunidades de negócio, que vão poder contar com um apoio financeiro para microcréditos, resultado de uma parceria entre a CML e um banco. No primeiro ano do PDCM, pretende-se que 700 habitantes da Mouraria sejam directamente beneficiados.

PERFIL SOCIAL Numa fase embrionária do PDCM, a autarquia fez um levantamento da realidade social do bairro. As conclusões do relatório sublinham o facto de que “o estigma de degradação urbana e social é limitador do potencial da Mouraria para atrair novos investidores, visitantes e habitantes”. O mesmo estudo mostrou que “os elevados índices de pobreza e exclusão social são cerceadores da felicidade, da liberdade (de escolha), da participação e da mobilidade social dos actuais habitantes da Mouraria”.

No bairro, lê-se no relatório, há “um elevado número de pessoas em situação de prostituição (181), toxicodependência (200) e/ou sem-abrigo (23)”, que vêm juntar-se a uma comunidade em que, dos 5824 habitantes, 918 pessoas (18% da população) são beneficiárias de algum tipo de prestação social. Estes dados contribuem para a “imagem negativa” atribuída ao bairro.

O relatório evidencia uma outra fragilidade quando aponta para uma taxa de analfabetismo da comunidade na ordem dos 8% e uma formação que não foi além do ensino básico para 51% da população. Se a estes números se juntar o de habitantes do bairro sem qualquer formação escolar, chega-se às 4504 pessoas (78% da comunidade) sem competências específicas para qualquer actividade profissional.

O PDCM foi aprovado como experiencia inédita de revitalização social, mas a autarquia vê-o ainda como uma experiência que poderá vir a ser aplicada em outros bairros da cidade.

1 comentário:

Luís Serpa disse...

Alguém me consegue explicar por que raio de carga de água a coisa se vai chamar In Mouraria e não, por exemplo, Na Mouraria?

Que nojo me faz esta utilização do inglês em tudo, absolutamente tudo!