Por Alexandra Guerreiro, Público de 5 Mar 2014
Foto de Enric Vives-Rubio
A calçada portuguesa como hoje a conhecemos surgiu em 1842 pela
mão de reclusos e pela mente do Governador de armas do Castelo de São Jorge, em
Lisboa. A ideia do engenheiro militar Eusébio Furtado era fazer um pavimento de
pequenas pedras pretas e brancas, em ziguezague, na fortaleza e nos arredores
do castelo.
Uma
irreverência na época que fez sucesso. Rapidamente a calçada propagou-se pela
cidade. Em 1848, foi aprovado o projecto da autoria deste tenente-general, que
visava revestir toda a Praça do Rossio com a calçada portuguesa. Ao fim de 323
dias, uma área de 8712 metros quadrados a que se chamou Mar Largo, com desenhos
a homenagear os descobrimentos portugueses, ficou concluída. Daqui partiu-se
para cobrir os passeios e mais ruas de toda a capital com a calçada portuguesa.
Em 1867, foi o Largo de Camões; em 1870 o Príncipe Real; em 1876 a Praça do
Município; em 1877 o Cais do Sodré; o Chiado em 1894; e a Avenida da Liberdade
em 1879.
Nesse ano, a novidade inspirou o poeta Cesário Verde. Em
Cristalizações, este autor descreve o trabalho dos calceteiros que "De
cócoras, em linha (…), Com lentidão, terrosos e grosseiros, Calçam de lado a
lado a longa rua".
Actualmente existem cerca de 20 calceteiros em Portugal. Apesar
de a Câmara de Lisboa ter criado, em 1986, a Escola de Calceteiros “devido à
preocupação de perder os conhecimentos sobre calcetar”, lê-se no site do
município, o número de profissionais tem vindo a diminuir acentuadamente. Entre
os anos 40 e 50 eram 400. É uma profissão especializada que é feita por poucos
em muitos locais.
De Norte a Sul, pisa-se a calçada portuguesa. Apesar de Lisboa
ser a cidade-modelo, muitas ruas e praças do país têm este chão histórico. No
Norte, nas cidades de Guimarães, Aveiro, Porto, nasceram diversos apontamentos
nas ruas históricas. No Centro, em Coimbra, Castelo Branco, Santarém. A Sul, do
Alentejo ao Algarve, de Sines a Lagos, Portimão, Faro e Tavira, existem ruas
que, de uma ponta à outra, não escaparam à calçada. Nos Açores e na Madeira, as
pedras cúbicas também chegaram e mantêm-se nas ilhas. Além fronteiras, por onde
os portugueses passaram, também se deixou esta marca no solo. Brasil, Cabo
Verde, Angola, Moçambique e Macau têm até hoje a calçada portuguesa em pontos
de algumas das suas ruas.
Pelo mundo, a calçada tem diferentes cores e desenhos
geométricos. Quando nasceu no século XIX, a matéria-prima era o basalto. Mas
por ser de difícil corte passou a ser utilizado o calcário. Em redor de Lisboa
nasceram várias explorações, atingindo as 80 pedreiras só nas proximidades da
capital. Hoje, os principais locais de extracção situam-se no distrito de
Leiria e Santarém, e na orla Algarvia, existindo cerca de 300.
Pretos, cinzentos-claros, cinzentos-escuros, cor-de-rosa e
brancos, os calcários desenham várias formas. De superfície lisa e brilhante, a
pedra torna-se mais cintilante em dias de chuva, e por vezes escorregadia. É
uma característica que não agrada a todos e que tem provocado discussões
políticas e sociais entre quem defende o início do seu fim e de quem a defende
como património histórico que deve ser preservado.
1 comentário:
Gostei de ler :-) Pena que qq dia só vai haver lá fora
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