15/09/2005

Água a dobrar na Avenida: poluição para metade ou dobro do desperdício?

Anunciar que a Avenida da Liberdade será lavada duas vezes ao dia, em vez de uma, e que por isso as partículas poluidoras aderentes ao asfalto passarão a ir parar aos esgotos em vez de aos pulmões de quem lá passa, é uma notícia estapafúrdia, a que o apoio manifestado por pseudo-ambientalistas dá o necessário toque de surrealista.

Água a dobrar sobre o asfalto significará em primeiro lugar desperdício de água, em ano de seca, e numa cidade em que o Jardim Botânico, o Zoo e os canis e gatis de Lisboa têm sistematicamente imensa falta de água. Mas significa também o dobro da água que costuma confluir para as sarjetas da Avenida, tradicionalmente hiper-entupidas, o que só por si significa passeios inundados. Mas imaginando que as sarjetas estão desentupidas, mesmo aí a dupla lavagem do asfalto significará meter o lixo dentro do Tejo. Por isso, esta medida pomposamente anunciada pela CML só significa uma coisa: as partículas poluidoras podem ficar satisfeitas pois poderão tomar banho duas vezes ao dia!!

Mais valia que a CML e as entidades ligadas ao ambiente se preocupassem em resolver o problema da poluição na Avenida da Liberdade, propondo medidas concretas de actuação a montante e a jusante, designadamente a criação de parques de estacionamento dissuasores ao redor de Lisboa, a construção de linhas de metro de superfície até à periferia, o restabelecimento de linhas de eléctricos nos principais eixos de Lisboa (neste caso Restauradores-Saldanha-Campo Grande) e fechando, pura e simplesmente, parte significativa do trânsito que ali circula, deixando apenas livre o trânsito transversal.

3 comentários:

Fernando disse...

Calma, é só durante 15 dias.

Anónimo disse...

Bons dias.

Toda a indignação com a medida é não apenas legítima como francamente positiva por mostrar que, felizmente, a cidade de Lisboa tem munícipes com espírito crítico e preocupados com as suas estratégias de desenvolvimento.

A questão da medida relativa ao aumento da frequência de lavagens de rua, em especial na Avenida da Liberdade (onde os níveis de partículas em suspensão são DEMASIADO elevados), deve ser vista no contexto em que surgiu, isto é no contexto de um conjunto de políticas e medidas destinadas a melhorar a qualidade do ar não só na cidade de Lisboa mas em toda a Área Metropolitana.

A medida avaliada isoladamente ignora que o documento ("Os Planos e Programas para a Melhoria da Qualidade do Ar na Região da LVT", disponível para consulta em http://www.ccdr-lvt.pt/content/index.php?action=detailFo&rec=466) tem outras dezenas de propostas, as quais são muito mais estruturantes e que incidem precisamente sobre as questões infra-estruturais e organizativas ligadas à melhoria das acessibilidades por Transporte Colectivo à cidade. No entanto, as medidas de fundo demoram algum tempo (muito mais do que deveriam, aliás) a ser concretizadas e, sendo assim, convém salvaguardar a saúde pública no entretanto mesmo que com medidas cuja implementação se quer apenas no curto prazo, como é o caso do aumento da frequência das lavagens de ruas na Av. Liberdade. Exemplos das outras medidas? P.ex. a criação da linha das colinas do Metropolitano de Lisboa (ML), fundamental para ligar em diferentes pontos centrais da cidade as diferentes linhas que constituem o ML... Afinal com tempos de viagem muito elevados nos Transportes Colectivos, o automóvel continuará
a reinar. Outro exemplo? A instalação de filtros de partículas nas frotas, sejam de táxi sejam de transportes colectivos (já que as frotas fazem um número anual de quilómetros elevadíssimo e sempre na cidade).

Faltará referir a questão do consumo de água. É evidente que se trata dum aumento do consumo deste recurso tão escasso nos dias que correm. Por isso mesmo o grupo de trabalho da Universidade Nova de Lisboa responsável pelo trabalho citado anteriormente refere que a água deverá provir de outros usos, seja através de um armazenamento excepcional de água pluvial seja água após ter recebido tratamento numa das Estações de Tratamento de Águas Residuais da cidade. O aumento do consumo foi um problema aflorado e não esquecido.

Fico grato pelas observações críticas, as quais penso que eu próprio faria, especialmente tendo visto apenas a notícias das lavagens na Avenida da Liberdade. Todavia mesmo quando as medidas parecem estapafúrdias, como parece a medida das lavagens vista isoladamente (e contra mim falo, dado que integrei o grupo de trabalho que desenvolveu "Os Planos e Programas para a Melhoria da Qualidade do Ar na Região da LVT"), temos a obrigação de perceber como surgiu a ideia e em que contexto. Que os jornais ou as televisões não o façam, não dêem as notícias de forma completa e no seu contexto por questões de tempo, percebe-se... Mas não num blog, onde o tratamento noticioso pode ter diversos contributos.

Espero ter dado o meu. Resta-me continuar a acompanhar o vosso blog e as vossas indignações que, tantas vezes, são também as minhas. Bom trabalho!

Hugo Tente

Anónimo disse...

Bom dia e muito obrigado pelos seus comentários, a que não posso deixar os meus, que passo a enumerar:

1. Perfeitamente de acordo em que a lavagem deve ser incrementada (não só na Avenida como em Entre-Campos, Av.EUA, Av.Brasil, etc., etc.) e ser parte integrante de um bolo maior, como refere. Simplesmente, esta lavagem anunciada é um mero acto publicitário da CML, em alturas de pré-campanha, nada mais. Tal como o "Dia sem Carros", ou a "Avenida sem Carros". Demagogia pura, terceiro-mundista, portanto, já que a CML e o Governo nada fazem no que respeita ao resto do bolo ... O que é grave é que ambientalistas a patrocinem, de algum modo.

2. As medidas de fundo, como diz, e muito bem, demoram tempo demais. Eu diria antes: quando formos velhinhos, de bengala, ou já estivermos no outro mundo, os nossos netos ainda hão-de ouvir os políticos municipais e nacionais dizendo que "é preciso criar parques dissuasores; é preciso criar linhas de metro de superfície dentro e fora da cidade", etc., etc..

3. O "Metro das Colinas"?

a) Depois dos recentes erros grosseiros da nossa engenharia na construção do túnel do T.Paço, na colocação do ventilador no Rossio e na ligação do elevador de Stª Justa ao Carmo, julgo que nunca mais porei as minhas mãos no fogo por obras de risco em Lisboa.

b) Qto aos objectivos dessa hipotética linha de Metro, para além de já se saber que para além do «lobby» da construção civil, e do respectivo gabinete de engenharia que o desenhará, pouca gente beneficiará dessa linha. Muito menos o Estado. O que tem que se fazer são coisas simples:

- Avançar com a re-abertura de linhas de eléctrico, nos percursos que já houve em Lisboa (Alm.Reis-Av.Gago Coutinho; Restauradores-Saldanha-Cap.Grande; Cais do Sodré-Rato-Amoreiras; Madre Deus-Paiva Couceiro-Graça/Pç.Chile), e que foram mutilados ou fechados por razões que tiveram a ver com tudo menos com a qualidade de vida dos lisboetas;

- Avançar com a criação de linhas de metro ligeiro de superfície que levem e tragam as pessoas desde inter-faces criados nas entradas de Lisboa, até a parques dissuasores, na periferia (Póvoa Sta.Iria, Loures, Amadora, Jamor) distribuindo as pessoas em paragens estratégicas até lá;

- Avançar com a criação de mais elevadores, funiculares e outro tipo de solução (por ex.escadas rolantes dentro do edificado) para obviar ao isolamento das colinas com piores acessos (Castelo, Sto.Amaro, Penha de França).

Isso e mais a restrição efectiva ao trânsito automóvel em cada vez mais bairros (Graça, Alvalade, Bairro Azul, Campo de Ourique, por ex.), e proibição total de trânsito em certas zonas (T.Paço-Restauradores) e fortemente condicionado noutras (Av-Marquês); transportes públicos não poluentes (quantos dos veículos da Carris, e quantos dos táxis de Lisboa seriam aprovados para andarem numa cidade do lado de lá dos Pirinéus? Até em Espanha, os autocarros de Cáceres ou Saragoça são a gás!!); mais estacionamento para quem vive realmente em Lisboa, e fiscalização/punição exemplar de quem estaciona em cima do passeio, etc.; e teremos resolvidos os problemas de trânsito e qualidade do ar em Lisboa!

Abraço e volte sempre. Visite-nos e deixe sempre com os seus comentários.

Paulo Ferrero