21/02/2017

Petição contra o desvirtuar irreparável da Praça das Flores


PETIÇÃO

Salvar a Praça das Flores e a identidade de Lisboa


Para: Ex.mo Sr. Presidente da Câmara Municipal de Lisboa; Ex.mos Deputados da Assembleia Municipal de Lisboa

Os assinantes desta petição vêm manifestar-se contra a demolição de um edifício histórico e a construção de um edifício dissonante na Praça das Flores n.ºs 10 a 14, licenciada no âmbito do Processo 384/EDI/2015, por Despacho de Sr. Vereador Manuel Salgado a 20 de Julho de 2016.

Em causa está, por um lado, a perda de identidade de Lisboa, ao permitir-se a demolição de um edifício que, embora anónimo, contribui para a harmonia de uma das praças mais emblemáticas da cidade e, por outro lado, a construção de um edifício dissonante, sem nenhuma relação com a cultura arquitectónica e urbanística do centro histórico onde se insere, e que prejudica fortemente a imagem da Praça das Flores.

De referir que, apesar de todas as informações técnicas desfavoráveis, este mesmo processo tem Alvará de Construção emitido a 06-12-2016, estando eminente a sua demolição, já se encontrando afixado no edifício a publicidade da empresa de construção que terá a obra a seu cargo.

Mais se informa que foram enviadas, por correio expresso, cartas para o Ministério Público, Provedoria da Justiça e Ordem dos Arquitectos a 10/02/2017, apresentando queixa/denúncia relativamente a este Processo, com base nos seguintes fundamentos:

1. A 20 de Julho de 2016, foi aprovada pela Câmara Municipal de Lisboa, a demolição do edifício sito no n.º10 da Praça das Flores e a construção de um novo edifício neste lote e no logradouro contíguo, conforme denunciado pelo Jornal Público a 21/02/2016.

2. O projecto licenciado, da autoria do Arquitecto Souto Moura, é em tudo idêntico a um outro seu, construído na Rua do Teatro, na Cidade do Porto o que desde logo atesta a falta de preocupação em realizar uma proposta que tenha qualquer referência com a Cidade de Lisboa, no geral, e com a Praça das Flores, em particular.

3. Na informação técnica, onde se propõe o indeferimento do processo, pode ler-se que o edifício a demolir “possui características arquitectónicas com relevância tais como a composição simétrica, a trapeira com grande presença, o beirado à portuguesa, os cunhais de pedra, os vãos de sacada com varanda, etc, que garantem uma integração equilibrada no conjunto homogéneo das edificações que definem urbanisticamente a Praça das Flores”. Já em relação ao projecto em apreciação, refere-se na mesma informação que “o desenho proposto para o alçado, o último piso recuado, as dimensões e características dos vãos e dos dispositivos de ensombramento, assim como as varandas reentrantes, não possuem qualquer relação com a linguagem arquitectónica dos edifícios confinantes, nem referências nas composições arquitectónicas dominantes no conjunto da Praça das Flores em termos morfológicos e tipológicos”.

4. O parecer afirma ainda que a proposta contraria “o disposto no nº 1 do artº 42º do Plano Director Municipal” (PDM) que impõe que “as obras de construção, ampliação e alterações têm que se enquadrar nas características morfológicas e tipológicas dominantes no arruamento em que o edifício se localiza e contribuir para a respectiva valorização arquitectónica e urbanística”, bem como outras imposições legais, como os alinhamentos de pisos e vãos com os edifícios confinantes, a ocupação do logradouro e os requisitos da admissibilidade de demolições.

5. A referida informação (30575/INF/DPEDI/GESTURBE/2015) recebeu a concordância dos chefes de Divisão e do Departamento de Projectos Estruturantes da Câmara Municipal de Lisboa.

6. Não obstante a evidente perda de património em causa, o processo - que propõe um edifício de 5 pisos, com vidro a toda a largura da fachada, assente numa estrutura de betão armado revestida com perfis de ferro, lâminas de alumínio para ensombramento e telas de rolo - acabou por ser aceite pela Direcção-Geral do Património Cultural (DGPC) - chamada a pronunciar-se devido ao local se situar na Zona de Protecção Especial do Bairro Alto, classificado como Conjunto de Interesse Público.

7. Seguidamente, e contrariando a proposta de indeferimento dos serviços camarários, o projecto foi aprovado pela CML, tendo por base uma informação do Director Municipal Catarino Tavares onde este refere que “na arquitectura, como em qualquer outra arte, (…) podemos ter vários olhares e todos eles válidos” e um despacho de aprovação do Vereador Manuel Salgado, datado do mesmo dia e sem nada acrescentar.

8. É este o critério usado para justificar o injustificável e legalizar o ilegal.

9. A propósito de critérios, vale a pena referir que este mesmo local foi alvo dos Processos 20/EDI/2008 (entrada na CML em 04.01.2008); 1449/EDI/2008 (entrada na CML em 14.11.2008); e 633/EDI/2009 (entrada na CML em 08.05.2009), sendo que só este último foi deferido, após sanadas as questões que foram sendo levantadas nos processos anteriores e garantida a manutenção e boa integração da fachada do edifício existente no n.º10 aquando da sua ampliação.

10. Quanto ao deferimento do Processo n. 384/EDI/2015, refira-se que está em causa não apenas o impacto desta intervenção em concreto, mas também a abertura de um precedente que retira à CML qualquer legitimidade para reprovar intervenções semelhantes, na Praça das Flores ou noutras praças e ruas de igual cariz, com prejuízo para a imagem e património da Cidade de Lisboa.

11. Isto se, por acaso, o pretender.

12. Na verdade, apesar do Regulamento do PDM de Lisboa, no seu artigo 45º, deixar claro só ser possível a demolição de edifícios existentes em situações manifestamente excecionais (conforme se pode ver) são já muitos os edifícios de arquitectura tradicional e que garantem a harmonia do local onde se inserem, cuja demolição e posterior substituição se vê aprovada, sem que sejam compreensíveis os critérios. [...]

17. Finalmente vale a pena referir que é frequente a CML inviabilizar demolições totais ou parciais de edifícios cujo interesse, individual ou para o conjunto em que se inserem, é bem menos evidente, o que mais reforça a nossa surpresa quanto aos critérios utilizados na apreciação de processos.

Face ao exposto, solicita-se a intervenção de V. Exa., de modo a garantir que a Câmara Municipal de Lisboa, coloque o interesse público acima dos interesses privados, aja em conformidade com a lei, incluindo a administrativa e penal, sendo anulado o Processo licenciado para os n.ºs 10 a 15 da Praça das Flores. Solicita-se ainda que sejam investigados os processos relativos aos casos apresentados no ponto 14 supra e outros que, do mesmo modo, têm vindo a lesar o património e a identidade da Cidade de Lisboa.

Atentamente.

11 comentários:

Anónimo disse...

Estranhamente ou talvez não, a CML e a DGPC, de mãos dadas, em decisões que são tudo menos consensuais. Na verdade quem decide, já nem consegue distinguir as suas competências das competências da DGPC. É impossível garantir que não haja contaminação das decisões. Uma coisa é certa, a CML, põe as suas competências na gaveta, em nome dos interesses dos particulares e em prejuizo do interesse público, a seu belo prazer.

Anónimo disse...

Como é possível o arquiteto usar a mesma receita, no Porto e em Lisboa? Haja vergonha! É o completo desprezo pelo contexto urbanístico. A especulação imobiliária elevada ao mais alto nível. É preciso descaramento. Abre-se uma ferida em pleno coração da cidade, por via de uma decisão mal fundamentada? E o PDM? Para que serve afinal?

Anónimo disse...

Inacreditável como pode estar em marcha este enorme atentado urbanístico. Lisboa está a saque. Já nem escapam os lugares emblemáticos da cidade.

Anónimo disse...

Não há dúvida que a decisão é irregular, mas enquanto existir um todo o poderoso que defende os interesses dos particulares, acima de todos os outros, o que se poderá esperar? Já começa a ser mais que visto. Gostaria de ver referidos todos os outros processos em situação idêntica bem identificados. Será interessante comparar arquitetos e promotores e haverá certamente muitas coincidências, ou talvez não!

Anónimo disse...

A bem da imagem de Lisboa era bom que não se executa-se esta obra. A Praça da Flores fica seguramente a ganhar. Já o projeto do ilustre arquiteto, pode ser executado em qualquer outro lugar, no Porto ou noutro lugar qualquer, mas de preferência, sem subtrair valor. E para variar seria bom os instrumentos aplicáveis terem alguma eficácia. Mão pesada, para quem finge que não existem regras, mas apenas diferentes olhares, todos eles válidos. Mas só um é que decide. Afinal não são todos válidos. A esta prática chama-se abuso de puder.

Anónimo disse...

Mais uma vez se comprova que os actuais arquitectos são incapazes de intervir na cidade consolidada.

luis disse...

:A construção avança, apesar dos protestos, e em 2078 o prédio passa para outro proprietário, que pretende demoli-lo e adaptar a arquitectura do mesmo, à da praça. Cai o Carmo e a Trindade porque os vizinhos não querem que se destrua um edifício marcante da arquitectura portuguesa da segunda década do século XXI em Lisboa:

Bem-vindos a Lisboa.

Rodrigo disse...

Vale tudo! Ate comentários idiotas dissimulados e cheios de desonestidade intelectual, como o comentário das 3:29 do luis.

Anabela disse...

Como é que um arquitecto da craveira do Arqto Souto Moura não tem capacidade para sentir a mágoa que se tem ao ver aquela parte da Praça destruída com uma peça tão banal é tão despropositada? É uma verdadeira tristeza!!

Anónimo disse...

Cara Anabela, a resposta para essa sua pergunta está aqui:

http://www.jornaldenegocios.pt/weekend/detalhe/eduardo_souto_de_moura_faco_as_casas_para_mim_o_cliente_e_um_heteronimo


Esta gente/classe profissional vive num mundo à parte.

Anónimo disse...

Ganha-se o Pritzker e parece que vale tudo. Pena é que não lhe retirem o prémio. Fizesse ele isto na Ribeira do Porto e queria ver.