A deslocalização dos ministérios do Terreiro do Paço para Chelas, na zona oriental da cidade (freguesia de Marvila), foi ontem anunciada no âmbito da apresentação da futura Cidade Administrativa. De acordo com José Luís Arnault, ministro das Cidades, Administração Local, Habitação e Desenvolvimento Regional, a expectativa é a de que "dentro de seis anos (em 2011) os ministérios estejam todos reinstalados". Esta notícia vale o que vale em tempo de campanha(s). Para mim vale zero; mais, é um disparate completo. Desde o local (vale de Chelas, freguesia de Marvila), à data (2011), começando pelo próprio conteúdo (cidade ministerial).
Pois se é certo que há demasiados ministérios ocupando demasiados palácios, demasiados locais turísticos, etc., também é verdade que não sendo eles a fazê-lo será difícil arranjar outros ocupantes que não "hotéis de charme", o que já aborrece - não só porque o que aparece tem muito pouco charme, como as negociatas por detrás dessas "deslocalizações" costumam ser chorudas.
Uma coisa é desanuviar o Terreiro do Paço de carga burocrática e administrativa (contra-senso?) que o sufoca e degrada, outra coisa seria arrasar com o vale de Chelas. Seria um repasto para o sector da construção civil (de cujas contribuições muitas campanhas dependem quase integralmente...), reconheço, mas colidiria com a mais-valia que ainda existe naquele espaço desanuviado, como alertam cabeças sábias como a do "nosso" Arqº Ribeiro Telles. Uma "cidade ministerial" antes fosse uma cidade da "Lego", Senhor Ministro, mas não é.
Por outro lado, a data de 2011 é, no mínimo, "naïf". Construir prédios (que é disso que se trata, Senhor Ministro, e não de "uma componente habitacional e de serviços que contribuirá para a sua requalificação social" ... alguém me faz crer que a Expo não é somente um negócio de construção civil?); deslocalizar milhares de funcionários, serviços e nomenclaturas; dotar o local de transportes, comércio e serviços de apoio aos deslocalizados e apostar em 2011 é pura ficção-científica, mais adequada a Fialho de Almeida do que a Verne, "quand même". Por isso, no caso de ser uma notícia "a valer" eu apostaria antes para 2111, mais ao jeito de Aldiss, por exemplo.
E que dizer da afirmação do sr. Pedro Neves (assessor do ministro das Cidades) que "com esta operação, Chelas, agora cidade/dormitório seria palco da criação de 22 mil postos de trabalho e da chegada de mais 31.500 residentes"? Bom, a ser verdadeira e testada a aritmética, eu diria que outras partes de Lisboa perderiam 22 mil postos de trabalho e veriam partir mais de 31.500 residentes.
Senhor Ministro, apesar de toda a boa vontade e espírito de missão que apraz registar, mormente o esforço de "engenharia financeira" (um tipo de engenharia para que o português parece especialmente dotado e fadado) que serviria de suporte a essa mega-operação, aconselho-o a ver a lição de Jacques Tati, que é "Playtime", e a deixar o vale de Chelas em paz, na pacatez que ainda tem.
PF
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