Isto, só em Lisboa. No resto do País há mais
Há dias, numa surreal conferência de imprensa, advogados e funcionários da Bragaparques fizeram ao País o favor de distribuir à comunicação social uma série de documentos inócuos para chegarem à brilhantíssima conclusão de que não sabiam o que era isso de haver um «caso Bragaparques». Um dos presentes terá mesmo afirmado aos jornalistas não perceber por que é que se fala de um «caso Bragaparques».
Estas pessoas devem ser as únicas do País a desconhecer que há mesmo um «caso Bragaparques»m melhor: dois «casos Bragaparques» – isto, só em Lisboa, porque no resto do País já há mais e eles até nascem como cogumelos, por acaso: cada vez parece haver mais «casos Bragaparques».
Para que nada fique em branco, vou elucidar aqueles funcionários da mais tristemente famosa empresa destas semanas sobre os dois aludidos casos. E dispenso-me de citar o caso de Coimbra, bem como os casos que estão a nascer em Braga – que, segundo me contam, podem multiplicar-se noutras terras do Norte, designadamente do Minho e de Trás-os-Montes.
Falo só dos dois casos até agora detectados em Lisboa – dois casos com ilegalidades pelo meio, quero dizer. Estes dois estão confirmados e estão a ser investigados. De outros casos, não sei. É que há mais oito ou nove «situações Bragaparques» em Lisboa – mas até agora nada me diz que venham a ser conhecidas mais situações ilegais: mas também não poria as mãos no fogo. E o leitor, poria? Tenho a certeza de que não.
Vamos então aos «casos»: dois negócios, dois casos em investigação. Provavelmente (é que não sei nem ninguém por aqui sabe o que é que o Ministério Público e o DIAP estão a investigar, mas deduzo que tudo passa por aqui e por mais dois ou três negócios – de outras empresas – em Lisboa).
Caso um
A troca de um chouricinho (o Parque Mayer) por um porco inteiro e enorme (metade dos terrenos da «antiga» Feira Popular, a Entrecampos)
Depois de muitos malabarismos, desde 2002 até ao início de 2005, a Bragaparques (BrP) consegue «finalmente» («Finalmente!», elogiou Vasco Franco, à data vereador do PS na CML, em artigo famoso, no jornal ‘Público’ de 12 de Fevereiro de 2005…) o famigerado acordo, conseguido com o apoio do PSD, do CDS e do PS na CML, e que mais tarde veria ratificado na Assembleia Municipal (só votaram contra o PCP e os Verdes, tendo o Bloco, estranhamente, votado a favor – passe o ruído que agora faz para apagar essa nódoa que sempre lamentei).
Que acordo é esse? É o de trocar o Parque Mayer por metade da Feira Popular.
Dizem os advogados da BrP que não há aqui nada de estranho: é ela por ela. Mas há. E há algo muito estranho, o que agora começa a ficar claro para toda a gente: é que ninguém podia à data saber o que valia cada um dos terrenos em causa, pela simples razão de que não havia – como ainda não há – planos que permitam calcular os respectivos valores. A primeira coisa a fazer era elaborar os planos. Depois, sim, calcular os valores de um e do outro terrenos e depois trocá-los, pagando a diferença se a houvesse quem tivesse de compensar a outra parte (Município ou BrP).
Dir-me-á o leitor: mas então até pode acontecer que a BrP esteja prejudicada. Em tese, sim. Na prática, claro que não: a zona de protecção do Jardim Botânico e a qualidade de património protegido do Capitólio limitam em muito a aptidão construtiva do Parque Mayer. Essa é a verdade. E a diferença – que conheceremos quando houver planos – deve ser abismal, favorável ao Município. Só que é de esperar que nessa altura os tribunais já tenham anulado os negócios em causa. Eu, assim o espero.
Eis o primeiro caso: permuta de um local por outro sem suporte legal de avaliação. Ou melhor e mais grave: com avaliações feitas a esmo e cada qual com seu valor, cada um mais díspar dos outros… porque calculados «sem rede» nenhuma.
Caso dois
A aquisição da outra metade dos terrenos da «antiga» Feira Popular em hasta pública mais estapafúrdia de que há notícia em Portugal
A esta hasta pública concorrem seis empresas. A BrP é a 4ª em matéria de preço que oferece pelos terrenos. Mas o estranho acontece: as duas primeiras empresas com preço mais favorável (mais alto) desistem de imediato. É o primeiro choque. As duas chamam-se Barcelos e qualquer coisa. Barcelos, penso hoje, é tão perto de Braga… A terceira empresa deixa-se ultrapassar pela BrP, quando esta alega direito de preferência por já ter adquirido o terreno do lado (ver parágrafos anteriores). Mas a lei não funciona dessa forma.
Ora o direito avocado só funcionaria se a CML e a AML tivessem deliberado que a BrP tinha esse direito de preferência. E isso não aconteceu. Não havia direito de preferência. Mas foi atribuído na prática esse direito e, muito estranhamente, a terceira empresa, a Sociedade de Construções João Bernardino Gomes, não levantou qualquer problema. Hoje, esta empresa vem explicar que não é sua política agir judicialmente nestes casos. Argumento curto, para mim.
Então, aí está o segundo caso: a atribuição de um direito de preferência que não foi aprovado por nenhum dos órgãos que podiam aprovar esse direito (CML, AML).
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2 comentários:
A comédia de Lisboa
As boas intenções de Carmona Rodrigues serviram para demonstrar a inconsistência técnica, a incapacidade de gestão e a inabilidade política.
Carlos Marques de Almeida
O Município de Lisboa é a nova morgue da capital. Com um presidente da Câmara politicamente morto, os vereadores da cidade reunem-se para uma avaliação do grau de decomposição. As boas intenções de Carmona Rodrigues serviram para demonstrar a inconsistência técnica, a incapacidade de gestão e a inabilidade política. Aliás, politicamente o presidente da Câmara nunca chegou a existir. Cúmplices activos de um velório, os vereadores da Oposição pretendem adiar um destino mais do que evidente – a demissão de Carmona Rodrigues e a convocação de eleições antecipadas.
No entanto, o cálculo político impõe um compasso de espera. Uma espera que só tranforma a agonia em espectáculo público. A agonia de um projecto político falhado, iniciado por Santana Lopes e terminado sem cor ou glória por Carmona Rodrigues. Mas também o descalabro de uma oposição fútil e parasita, que se limita a exibir o esplendor próprio das figuras secundárias. O PS, orfão do Filósofo-Rei, divide-se numa “liderança bicéfala” enquanto aguarda por um sinal do Governo. O CDS-PP inventa a obscura intenção de constituir uma “junta de salvação municipal”. Na realidade, o novo “comité exploratório” de Paulo Portas com vista à “estabilização” do CDS-PP garante desde logo a inibição do partido. Quanto ao PCP e Bloco de Esquerda, depois das denúncias, aguardam pacientemente pela miserável recompensa dos pequenos. Passado o descalabro da Direita, a perspectiva de uma “grande coligação” das forças de Esquerda liderada pelo PS surge no estreito e medíocre horizonte da cidade. Entre as duas margens, Lisboa caminha tranquila para a ruptura.
Enquanto Lisboa apodrece politicamente, Marques Mendes recomenda “sangue-frio e determinação”. Para além da natureza piedosa dos votos, a inacção e a paralisia do PSD projectam a “mística” da derrota. E de caminho, por muitos e bons anos, entregam os destinos de Lisboa no “progressista e fraternal” regaço da Esquerda.
Em recentes declarações, Marques Mendes denunciou a falta de “ímpeto reformista” no Governo. O ‘powerpoint’ seria a grande reforma do Governo. Em repetidas declarações, ficou bem visível a ausência de “rumo” no PSD. O ‘powerpoint’ será a nova alma da Oposição.
As "Bragafraudes", são, e sempre foram uma realidade nacional. De vez em quando, lá se levanta "um bentinho", normalmente para levar mais areia prós olhos do pessoal.
JA
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