Ruas de Lisboa 'entupidas' por três mil carros abandonados

In Diário de Notícias (18/10/2010)
por ISALTINA PADRÃO


«Na base de dados da Polícia Municipal há 1605 carros largados na rua, mas serão o dobro e vão para o Depósito Municipal do Vale do Forno, que dá para 600 e está lotado

"Porque estão a levar o meu carro?" O Opel Corsa já se encontrava atrelado ao reboque quando a proprietária surgiu e questionou a equipa da Polícia Municipal (PM), que naquele momento tinha por missão rebocar três carros abandonados na freguesia de Benfica. Para este caso, a explicação oficial dada pela PM foi: "O seu carro encontra-se em estado de abandono e estacionamento abusivo."

No final de Setembro, encontravam-se registados na base de dados da Polícia Municipal 1605 veículos abandonados em Lisboa. No entanto, o número está muito aquém da realidade. Ao DN, o comandante da PM de Lisboa, André Gomes, admitiu "existir pelo menos o dobro de carros abandonados na via pública da capital". André Gomes atribui este cálculo ao facto de muitos casos não serem denunciados. E ainda porque "quando a PM faz o levantamento das denúncias de carros abandonados - que podem ser feitas por anónimos, juntas de freguesia, polícia e outros - ao chegar ao local, os agentes policiais vêem sempre mais carros em condições de serem removidos". E, mais cedo ou mais tarde, são removidos, mesmo sem serem denunciados.

Como medida de comparação, André Gomes disse: "Todos os anos removemos da via pública uma média de carros abandonados que daria para encher um campo de futebol." O DN acompanhou três das mais recentes aquisições para "esse relvado". Todas elas provenientes da freguesia de Benfica, onde, a 30 de Setembro, estavam registados na base de dados da PM 94 veículos abandonados.

O destino destes automóveis é o Depósito Municipal do Parque do Vale do Forno, onde ainda há lugar para alguns, mas o espaço começa a ser escasso para albergar carros que têm por fim o desmantelamento com a respectiva separação de materiais (plásticos para um lado, metais para outro, etc.)

Este terreno, em Carnide, e ao qual muitos já chamam "o cemitério dos carros" tem capacidade para 600 veículos, mas como o DN pôde comprovar, está praticamente lotado. De tal forma, que as duas equipas de remoção de carros da PM encarregadas quase exclusivamente da remoção de veículos largados na via pública quase têm de se conter na recolha.

"Em média, removemos nove carros por dia [não contam fins-de-semana nem feriados]. Se continuarmos a esta velocidade e se os veículos removidos não forem saindo do parque para serem desmantelados, não vai haver espaço para os armazenar", disse ao DN o chefe Procópio Chapa, da PM. Mas se não há dúvidas quanto ao número de carros que, de um modo geral, são removidos da via pública, já as cifras correspondentes aos que saem do parque para abate não são totalmente claras. Certo é que o parque começa a rebentar pelas costuras. Enquanto isso, aglomeram-se veículos (sobretudo velhos e em mau estado) nos parqueamentos, passeios e nas pracetas. Em Benfica, como testemunhámos, acontece isso.

Pirilampos ligados, a moto abre caminho à grua, ao reboque e ao carro policial desde a sede da Polícia Municipal (na zona da Praça de Espanha) rumo a Benfica. "Perante a denúncia, o agente fiscalizador, no caso eu, veio confirmar a denúncia em Maio ou Junho", disse o agente fiscalizador José Besteiro, que se deparou com sinais claros de abandono de três carros.

O Ford Escort, o Opel Corsa e o Renault 5 tinham os mesmos indícios: selo da inspecção e de seguro fora da validade há anos; pneus em baixo; vegetação a crescer em redor; muita sujidade; enfim, abandonados. Verificou-se que os carros estiveram no mesmo lugar e nestas condições durante mais de 30 dias. Perante isto, chegou a vez de os levar para o "cemitério dos carros". Um após outro, foram transportados para o parque, onde aguardam ainda que os donos os resgatem (ver caixa).»