26/06/2006

GUERRA ABERTA ENTRE O PORTO DE LISBOA E A CÂMARA MUNICIPAL

In Público (25/6/2006)
Por João Pedro Henriques e Diana Ralha

"Indiferente aos protestos camarários, a Administração do Porto de Lisboa prossegue a elaboração do seu plano de desenvolvimento estratégico. Quer a autarquia queira quer não queira, a vocação portuária de cargas e descargas do porto será mesmo reforçada, sobretudo em Alcântara. Para melhorar a movimentação de cargas, a APL tenciona aposta num novo meio: enormes barcaças com capacidade até 150 contentores que percorrerão o estuário.

A Administração do Porto de Lisboa (APL) tenciona prosseguir a elaboração do seu novo plano estratégico, independentemente de todos os protestos que têm vindo da câmara da capital. Assumidamente, a elaboração do plano ignora projectos a longo prazo que a autarquia tem vindo a pensar: por exemplo, fortes limitações ao trânsito na zona do Terreiro do Paço, ou o rebaixamento para o subsolo das linhas ferroviárias de Alcântara.

Os protestos da autarquia de Lisboa estão relacionados com a intenção da APL de reforçar substancialmente, nos próximos anos, a componente portuária da zona ribeirinha de Lisboa, ou seja, de movimentação de cargas pesadas. Actualmente, segundo uma fonte da direcção da APL, o porto de Lisboa movimenta meio milhão de contentores por ano. A prazo, a intenção é triplicar essa movimentação, concentrando-se a principal zona de cargas e descargas em Alcântara (um milhão por ano) e o restante meio milhão em Santa Apolónia.

Em Alcântara, a intenção é demolir três edifícios para aumentar a capacidade de armazenamento. Ao mesmo tempo serão dali retirarados os cais dos cruzeiros de férias, transferindo-os para a zona de Santa Apolónia. O projecto exclui, simultaneamente, a possibilidade de a zona portuária avançar para Santos - hipótese que a Câmara de Lisboa tem agitado. E não pretende também reforçar na sua capacidade para as chamadas "cargas ro-ro" (roll on/roll off), ou seja, para cargas e descargas de automóveis, actualmente bastante centralizada em Setúbal.

Quando ao reforço da capacidade de movimentação das cargas de e para os cais, a APL planeia avançar por duas vias: por um lado, aumentar bastante a circulação ferroviária na linha junto aos bares das chamadas Docas, previsivelmente até 20 viagens por dia (actualmente são três); por outro, apostar no transporte marítimo das cargas entre as duas margens do Tejo (evitando que tenham de circular por terra), através de barcaças compradas para o efeito.

Suponha-se, por exemplo, um transporte de contentores por barcaça de Alcântara até Castanheira do Ribatejo. A viagem demora mais ou menos um dia e meio, incluindo operações de carga e descarga, e transportam-se 150 contentores. Para fazer esse serviço por terra (44 quilómetros) seriam necessários 150 a 200 viagens de camião.
Com o tipo de plano que tem em preparação - pensado para ter um horizonte temporal até 2025 -, a APL demonstra estar pouco preocupada com as intenções camarárias de reforçar a componente lúdica-comercial da frente ribeirinha da cidade, diminuindo o peso da parte estritamente portuária. É certo que o plano estratégico em elaboração não ignora essa componente (ver caixa sobre a Doca de Pedrouços). Mas o facto é que a procura do transporte marítimo tem aumentado nos últimos anos, por via da globalização, e isso representa um negócio que os gestores do porto não tencionam - pelo menos no plano das intenções - deixar perder.

O porto de Lisboa vai ser cada vez mais um porto e cada vez menos uma espécie de Docas com dezenas de quilómetros de extensão, depreende-se das intenções dos seus administradores. Actualmente assegura 38 mil postos de trabalho, gerando de forma directa e indirecta cerca de cinco por cento do PIB da região de Lisboa. A APL acha, portanto, que o porto de Lisboa deve crescer face ao previsível aumento de procura. A evolução esperada do movimento de contentores até 2025 aponta para dois números: no cenário mais desfavorável - aquele em função do qual a APL está a desenhar o seu plano estratégico - 1,5 milhões de contentores por ano; no cenário mais favorável, 2,25 milhões. Actualmente - repete-se -, o número ronda o meio milhão por ano, mas o porto está em subutilização (tem capacidade para mil 850 mil contentores por ano).
No lado sul do Tejo, na Trafaria, a capacidade também está longe de estar esgotada. A movimentação dos granéis agro-alimentares é de 1,2 milhões de toneladas por ano e pode ser, segundo a APL, de quatro ou cinco vezes mais. Mas para que a utilização cresça é importante que se construa um ramal de ligação ferroviária da Trafaria à rede nacional, visto a rede de estradas estar saturada.

A APL insiste ainda no reforço da capacidade das plataformas logísticas de apoio à movimentação de contentores no Sobralinho, Castanheira do Ribatejo e Barreiro.
A elaboração do plano deverá estar concluída até Novembro deste ano. Por agora, está-se numa fase em que a APL vai falando com as várias autarquias envolvidas, no sentido de concertar vontades. No fundo, o dito plano consiste na definição dos usos dos terrenos ribeirinhos ao longo de todo o estuário do Tejo, em ambas as margens.
f A área de jurisdição da APL abrange:
f 11 municípios
f 2 margens do Tejo
f 42 quilómetros de extensão
e 30.900 hectares
f Garante 30.800 postos
de trabalho
f Representa 5 por cento do Produto Interno Bruto da região

Administração portuária pode impor as suas propostas
A Administração do Porto de Lisboa (APL) pode impor aos onze municípios contíguos à sua área de jurisdição (mais de 50 quilómetros de extensão, entre os concelhos de Oeiras e Vila Franca de Xira, na margem norte do Tejo, e Almada e Benavente, na margem sul do rio) as soluções que entender contemplar no seu Plano Estratégico para o Porto de Lisboa, documento que deverá estar concluído até ao final de Novembro.
A administração portuária não necessita, quer da aprovação das autarquias, quer do aval da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional de Lisboa e Vale do Tejo (CCDR-LVT), ou da intervenção do poder central para levar a bom porto as suas intenções, como acontece, por exemplo, quando os municípios querem alterar os seus planos directores. Na sua área de jurisdição, apenas a APL tem legitimidade para emitir licenças de obras e cobrar as taxas inerentes às mesmas. Isto acontece porque a APL é uma Sociedade Anónima, de capitais exclusivamente públicos (resultante da transformação do anterior instituto público com a mesma designação), dotada de personalidade jurídica de direito público, de autonomia administrativa, financeira e patrimonial, conferida pelo Decreto-lei nº 336/98. Para aprovar o seu plano estratégico, a autoridade portuária terá apenas que o submeter à tutela (um primeiro documento será submetido ao Ministério das Obras Públicas, a 15 de Julho), e fazê-lo aprovar em assembleia-geral.

Apesar de ter a "faca e o queijo na mão", a administração portuária diz que não pretende impor o seu poder indiscriminadamente e está, desde a fase zero do seu plano estratégico, a envolver os onze municípios, tendo apresentado as primeiras linhas na passada quinta-feira. De acordo com uma fonte da direcção da APL, a intenção "não é entrar em radicalismos e posições extremas", mas chegar a plataformas de entendimento com os vários municípios, e sobretudo, com Lisboa, que são possíveis e desejáveis. D.R. e J.P.H.

Pedrouços vai ter uma marina de luxo "à Montecarlo"
A Doca de Pedrouços vai ser transformada numa marina de luxo, ao estilo da de Montecarlo, no Principado do Mónaco. O objectivo da administração portuária de Lisboa é captar o mercado de iates de grande porte, para os quais não existem condições de acolhimento em Lisboa (lembre-se a visita do milionário russo Roman Abromovitch, em Junho do ano passado, que acabou por atracar os seus dois gigantecos iates em frente à discoteca Lux). A zona ocupada actualmente pela Docapesca será também alvo de requalificação. Nesses terrenos, a Administração do Porto de Lisboa (APL) quer criar as condições necessárias para que Lisboa se possa candidatar a acolher grandes eventos náuticos desportivos internacionais, colocando a capital portuguesa no mapa deste tipo de competições que atraem milhares de adeptos em todo o mundo. Posta de parte, no plano estratégico do Porto de Lisboa, está a hipótese de as instalações anexas à Docapesca voltarem a ser ocupadas por um porto de pesca.
A par da construção da marina de luxo em Pedrouços e do complexo de desportos náuticos na Docapesca, o plano da administração portuária de Lisboa prevê, também em Pedrouços, o desenvolvimento de um grande projecto imobiliário, com habitação, comércio, serviços e hotelaria, de apoio aos complexos náuticos que irão ser construídos e que atrairão um segmento da população de classe alta. Este empreendimento envolverá, segundo declarações recentes do presidente da APL, Manuel Frasquillho, um investimento na ordem dos 200 a 300 milhões de euros.
A vertente imobiliária dos terrenos de Pedrouços é que irá financiar a parte do lazer. O modelo financeiro do projecto pode passar pela criação de um fundo imobiliário fechado para obter mais-valias e financiar o empreendimento. A proposta relativa a esse fundo está a ser desenvolvida por uma equipa liderada pela Caixa Geral de Depósitos, avançou Manuel Frasquilho à imprensa, em Abril passado.
Até ao final do ano em curso, a administração portuária de Lisboa pretende iniciar aos trabalhos de recuperação da doca de Pedrouços, que, normalmente, tem fundos de oito metros, mas que, devido à sua degradação, tem agora fundos de 2,5 a três metros. D.R. e J.P.H
."

A APL não sabe o que diz e continua a portar-se como senhor feudal, em pleno séc.XXI.

Monte-Carlo em Lisboa? Bom, depois do casino, para isso acontecer só restaria mesmo a F1, mas essa, desde a barracada que o Governo deu por altura do diferendeo FIA/FOCA/ACP/Autódromo, essa tão cedo virá, pelo que estamos salvos. E às gares de Alcântara e da Rocha de Conde d' Óbidos, que lhes vão fazer? Condomínios privados, também? Com vista para os contentores, talvez?

Quantos aos iates do dono do Chelsea FC, eles poderão ir até Cascais ... para que é que essa barracada foi feita, afinal? Podiam começar, assim, por ajudar a CP a rebaixar a linha de comboios de Cascais, pelo menos até Algés, e entre Cascais e São João do Estoril! Isso sim seria uma boa acção por Lisboa.

PF

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