Foto: Daniel Rocha
Não gosta
da expressão invisual, considera-a politicamente correcta. Prefere cega ou
deficiente visual. Ana Sofia Antunes, 33 anos, é provedora do cliente da EMEL,
presidente da ACAPO – Associação dos Cegos e Amblíopes de Portugal e integrou
as listas de candidatos a deputados do PS por Lisboa. Estava em 19.º lugar,
posição que em Agosto se considerava elegível, pelo que se pensava que poderia
ser a primeira deputada cega a sentar-se no hemiciclo depois das legislativas.
Dizia
ter vontade de mudar o que já devia ter sido mudado e não teve medo das
palavras: “Um país que não respeita os seus deficientes não tem respeito por si
próprio.” Nasceu com
deficiência visual, frequentou uma escola especializada nos primeiros anos e
depois fez todo o percurso escolar até à faculdade enfrentando e superando as
dificuldades que existiam, e existem. Isso fê-la perceber o muito que ainda há
por fazer em relação a pessoas com deficiência visual ou outras deficiências. É
uma activista, com um longo caminho na ACAPO, de que é presidente desde Janeiro
de 2014.
Quando foi
convidada para integrar as listas do PS como independente, ficou surpreendida,
mas “feliz”. Se tivesse sido eleita seria a primeira deficiente visual a
sentar-se no Parlamento como deputada. Seria simbólico mas mesmo assim já vinha
tarde, lamentava. “Nós, ao contrário de outros países
europeus, nunca tivemos pessoas com deficiência a ocupar cargos como deputados
ou no Governo”, nota, considerando que essa lacuna, em termos de representação,
“diz muito” sobre a própria sociedade e sobre o país. Por isso, não podia
recusar o desafio: “Aceitei com muito orgulho. Mais do que a minha ida para o Parlamento, é uma abertura de portas para
as pessoas com deficiência.”
Sabia que o
que esperavam dela era que levasse as questões relacionadas com a inclusão e a
igualdade para a Assembleia da República. Ainda assim, não pretendia fechar-se
“numa espécie de gueto”, com apenas uma causa, uma bandeira. Não se é eleito
apenas por um conjunto de cidadãos, mas “por todos”, ressalvou.
Apesar de
ter essa ideia presente, quando questionada sobre o que pretendia fazer caso
viesse a sentar-se no hemiciclo, Ana Sofia Antunes tinha as respostas todas na
ponta da língua. Eram muitas as propostas. Dois exemplos apenas: queria
bater-se pelas medidas compensatórias dos custos da deficiência e pela criação
de uma lei de bases da vida independente. Terá agora mais poder para o fazer.
Sobre o
primeiro ponto, dizia haver “estudos de entidades independentes que demonstram
aquilo que é a realidade das pessoas com deficiência e o que significa a mais
no orçamento familiar”. “Obviamente
que existem algumas medidas a nível fiscal que tentam minorar o impacto a nível
do IRS, mas não são suficientes. O que temos é uma dedução à colecta um pouco
superior às restantes pessoas”, explicou. E o que Ana Sofia Antunes defendia
que deve ser estudado é a existência de “um complemento” que permita fazer face
a despesas adicionais.
“Se tenho
uma deficiência motora, não tenho culpa de ter nascido com esta
característica”, argumentou, acrescentando que apoiar estas pessoas chama-se
Estado Social. Se tal não acontece, “é um país que não respeita os seus
deficientes”. E um país que não respeita os seus deficientes é “um país que não
tem respeito por si próprio”.
Sobre a
criação de uma lei de bases da vida independente, explicou que se pretende
analisar “de que forma é que as verbas investidas pelo Estado a
institucionalizar pessoas podem ser atribuídas directamente à pessoa para viver
de uma forma autónoma, na sua habitação”, ou seja, os montantes podiam servir
para pagar a assistentes que auxiliassem as pessoas com deficiência em casa.
Ana Sofia
Antunes trabalhou na Câmara Municipal de Lisboa entre 2007 e 2013, era então
presidente o actual secretário-geral socialista e primeiro-ministro indigitado,
António Costa. Licenciada em Direito pela Universidade de Lisboa, fazia
assessoria jurídica no departamento da mobilidade. Foi já
depois de ter feito estágio, entrado na Ordem dos Advogados e exercido um ano
de advocacia que recebeu o convite para ir para a câmara. Lá, começou a
mexer-se, a querer fazer mais, a mostrar preocupação com as barreiras
arquitectónicas em Lisboa, por exemplo. Fez parte de um grupo pequeno que
começou um plano de acessibilidade pedonal na cidade.
In Publico por Maria João Lopes, 25-11-2015
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Parabéns Ana Sofia Antunes !!
Desejo-lhe uma luta sem tréguas para melhorar a mobilidade (e os direitos) de todos os deficientes desta cidade. Um melhoramento para esses....será um melhoramento para todos. Talvez alguns de nós ainda possam vir a assistir a passeios sem obstrução por equipamentos urbanos, carros estacionados nos mesmos, dejectos caninos....e tudo o mais que torna o dia-a-dia dos deficientes desta cidade num verdadeiro calvário.
1 comentário:
Será preciso muita espinha direita e não deixar-se enrolar com a austeridade e com corte de verbas e muitos outros argumentos estafados. Porque quando existem outras prioridades que politicamente se tentam justificar mas que não entram no entendimento da maioria dos cidadãos, é preciso coragem para bater o pé ao Ministro das Finanças ou ao 1º. Ministro.
Mas fundamentalmente na Capital é preciso muito mais que coragem e ousadia para afrontar Manuel Salgado e outros velhos responsáveis na C.M.L. quando nos licenciamentos estiverem em jogo milhares.
As acessibilidades, transportes dedicados, mobilidade, passeios e um sem número de barreiras arquitectónicas que causam a vida negra a um deficiente, não colherão compaixão na hora do visto e da aprovação de projectos que diariamente continuam a ser autorizados e que tornam Lisboa um péssimo exemplo de cidades sustentáveis.
Apoiemos esta Secretária de Estado e acompanhando-a naquilo que for autorizando, percebendo se não lhe passam rasteiras.
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