03/03/2008

Terreiro do Paço anda perdido nos caprichos do tempo

In Público (1/3/2008)
Ana Henriques


«Relógio do arco da Rua Augusta está parado por causa de desajuste entre mestre relojoeiro e organismo do Estado


Tudo começou há quatro meses com uma pequena oscilação, o ponteiro dos minutos a correr mais veloz do que o próprio tempo, noutras alturas a molengar, sem pressa de chegar a horas ao destino. À medida que passavam os dias agravava-se a rebelião do relógio do arco da Rua Augusta, junto ao Terreiro do Paço, em Lisboa. Ontem, às 11h00, o mostrador marcava orgulhosamente dez para as cinco da tarde, como se o mecanismo seguisse um outro qualquer fuso horário. E dias houve em que teimou em anunciar a hora correcta, porventura com a certeza de que as actividades mundanas já tinham deixado de se regular por si.
Há quatro meses era tudo mesuras: a então ainda ministra da Cultura debruçada sobre as suas entranhas, o mestre relojoeiro, vereadores e assessores a subirem ao topo do arco para celebrarem a reparação de um mecanismo que estava quieto há vários anos. O arranjo foi pago por uma empresa de relojoaria, a Torres, que fez um protocolo com o Instituto de Gestão do Património e desembolsou cerca de 25 mil euros. Só que o tiquetaque certinho que encantou toda a gente foi sol de pouca dura. Nos dias seguintes, o mestre relojoeiro que fez a reparação, Manuel Cousinha, atribuiu os pequenos devaneios do ponteiro dos minutos à necessidade de fazer alguns ajustes ao pêndulo. Que era mesmo assim, dizia, sem poder adivinhar o destrambelhamento que se avizinhava. Hoje confessa sem pudor a sua angústia: "Está parado, e há-de parar muitas mais vezes". Porquê? A resposta não podia ser mais irónica: por causa do tempo. Ou melhor, da noção que dele têm diferentes pessoas, neste caso ele e o organismo que tem o arco à sua guarda.
Cousinha diz que foi há um mês que tudo mudou, quando a chave do arco transitou para as mãos da Direcção Regional de Cultura de Lisboa. Habituado a pedir a chave a qualquer hora para ir afinar o volúvel relógio, viu-se obrigado a vergar-se aos horários do funcionalismo público. Já só podia mexer nas rodas e no pêndulo a horas decentes, e sempre acompanhado de um funcionário do Estado. Depois da máquina, foi a vez de o homem se rebelar: "É caricato, ridículo. Não nos deixam trabalhar, estou revoltadíssimo". O pior é que na direcção regional também há quem se queixe de ter ficado horas a fio à espera do consertador de relógio. Na versão oficial dos factos, Cousinha nunca se queixou dos novos horários. "Se ele tem algum problema temos toda a disponibilidade para ir lá fora de horas", asseguram os responsáveis deste organismo.
Calibrada nos mecanismos dos dispendiosos relógios de pulso que importa para Portugal, a casa Torres vê com maus olhos o que se está a passar. "O funcionamento do relógio do arco da Rua Augusta já devia ter entrado em velocidade de cruzeiro. Não estávamos à espera que isto acontecesse nesta altura do campeonato", observa Paulo Dias, da empresa. Depois deste primeiro restauro, a Torres tinha-se disponibilizado para avançar com operações semelhantes em Coimbra e no Porto, ao ritmo de um relógio por ano. Está desde Janeiro à espera que o Instituto de Gestão do Património lhe indique um relógio a precisar de restauro numa destas cidades. Os caprichos do tempo parecem também aqui ter vencido a vontade dos homens. »

Pois é. Nada que não se previsse. O relógio nunca esteve certo desde que foi 'inaugurado'. O pior, é que me parece que o problema está no relojoeiro... a seguir no Observatório dos Relógios Históricos.

3 comentários:

daniel costa-lourenço disse...

É confrangedora, toda esta situação.

Fosse no relógio da igreja para trás do sol posto, e ainda acreditava.

Agora, no centro da capital...

Filipe Melo Sousa disse...

Acho incrível que se gasta avultadas somas com burocratas que se dizem guardiões da hora, relógios atómicos do Observatório Astronómico de Lisboa e toda essa cangalharia inútil.

Um casio custa 10 € e não adianta nem atrasa. Já era hora de mudar para o digital. É bem mais barato e fácil de ler do que esses nónios obsoletos.

FJorge disse...

Portugal no seu melhor...