22/02/2016

Adeus, calçada nossa


Por Miguel Esteves Cardoso In Público (21.2.2016)

«Por não existir em mais nenhum outro lugar do mundo, a calçada portuguesa tinha de morrer. Até para passar a ser única.

Foi a primeira profissão que quis ter: calceteiro. Passava horas a vê-los deixar cair os martelos para conseguirem as clivagens certas para o espaço que tinham de ocupar.

Eu era tão pequeno que mal sabia falar português. Mesmo assim, eles aturavam-me horas a fio e respondiam a todas as minhas perguntas. Eu chamava-lhes os toom-toom men, por causa do barulho dos martelos sobre as pedras e, segundo a minha mãe, anunciei-lhe, com 5 anos de idade que, depois de ter pensado no assunto, tinha decidido que, dentre todas as profissões que admirava (bombeiros, detectives, pintores) queria ser, exclusivamente, um toom-toom man.

Fui um dos leitores do PÚBLICO online que contribuíram para tornar a reportagem de Inês Boaventura, com fotografia de Daniel Rocha, intitulada “É assim que vão ficar os passeios de Lisboa”, na peça mais popular do dia 19 de Fevereiro.

Vai ser preservada nas zonas ditas históricas. A alternativa, perdida de feia, é um cimento cobarde e barato com um pozinho exculpatório, lisboeta e homeopático de pedra de lioz que foi estreada na Rua de Alcântara. Sim, Alcântara. É, como toda a gente sabe, uma zona distante e moderna freguesia - a do PÚBLICO, por acaso - que nada tem a ver com a Lisboa histórica.

Que fique aqui registado que somos muitos os que choramos a morte da calçada portuguesa que, por não existir em mais nenhum outro lugar do mundo, excepto no Rio de Janeiro, tinha de morrer. Até para passar a ser única.»

6 comentários:

Filipe Melo Sousa disse...

Não existe em mais nenhum lado, e por algum motivo. É que é muito mau, com aspecto porco, caro.. só desvantagens.

Anónimo disse...

Filipe Melo Sousa... decididamente, você ou toma substâncias ilícitas pela manhã, ou não tem olhos na cara. Tenha um bom dia.

Anónimo disse...

Por acaso quando estive nas portas de Brandenburgo tive uma sensação muito familiar...

Joaquim Dentinho disse...

Caro Filipe Melo Sousa, a calçada é porca porque não é tratada e lavada pela CML. Todos os passeios do mundo são porcos e sujos porque estão expostos aos elementos. Hoje em dia tudo é caro, e na minha opinião vale mais apena pagar mais por uma beleza como a nossa calçada que já sobreviveu tantos anos! Um abraço

Filipe Melo Sousa disse...

A calçada é porca, porque este tipo de passeio é uma solução técnica impraticável que já foi descontinuada em todo o lado no mundo. Nem sequer é algo original português. Teimarmos em pedrinhas toscas marteladas de cócoras na terra é um tique de terceiro-mundismo parolo. Nada mais

Anónimo disse...

Mesmo que se ignore a questão patrimonial e a falta de durabilidade da solução placas de cimento, o aumento da impermeabilização dos solos e o consequente risco acrescido de inundações são factores que deveriam suscitar preocupação.