por Luísa Botinas, in Diário de Notícias, 8 de Abril de 2007
"Os habitantes do Bairro Azul, em Lisboa, que se encontra, desde Abril de 2005, em vias de classificação como património de interesse municipal por parte da câmara, querem salvaguardá-lo de agressões e descaracterizações resultantes de obras no exterior dos imóveis, enquanto a distinção oficial não chega. Pretendem preservar a tempo o que ainda é genuíno."Vemos com muita frequência contentores das obras no meio da rua cheios de elementos decorativos originais. Portas em bom estado, tacos que revestem o chão das casas. É uma pena, porque fazem-se intervenções de manutenção sem que se reponha o estilo. Opta-se por tijoleira no chão e outros materiais que nada têm a ver com o original da casa. Bom, mas dentro das habitações nada podemos fazer, a não ser sensibilizar as pessoas para a necessidade e vantagem de se manter o que confere valor a estes prédios. É no exterior que é preciso actuar", explica ao DN Ana Alves de Sousa, membro da Associação de Moradores do Bairro Azul.A preservação das fachadas e elementos decorativos dos edifícios deste conjunto urbano constitui um dos pontos fundamentais da luta deste grupo de cidadãos. "O estatuto especial deveria impedir que fossem efectuadas alterações significativas nas fachadas e áreas comuns dos edifícios, como é o caso de vestíbulos de entrada, caixas de escada e e elevadores", lembra Ana Sousa, que sublinha a importância de ser elaborado o mais rapidamente possível um regulamento que permita "preservar as características de excelência arquitectónica e urbanística" deste bairro, um expoente do estilo art déco, construído na Lisboa dos anos 30 do século XX.Segundo a Câmara de Lisboa, o regulamento está em elaboração, no âmbito de uma intervenção mais vasta: o Plano de Pormenor da Praça de Espanha e Avenida José Malhoa. Quando estará pronto, ainda não se sabe. Os Serviços do Urbanismo da autarquia são os responsáveis pela feitura deste instrumento de gestão urbanística, que carece de consultas e pareceres de várias entidades e de um período de discussão pública antes de ser aprovado definitivamente. Entretanto, a Divisão de Património Cultural (DPC) da CML está a fazer o levantamen- to de todo o bairro para a elabora- ção do regulamento. São 91 edifícios os que deverão ser incluídos na proposta de classificação. "Estamos a fazer fichas para cada um deles", informou fonte da DPC. Sublinhe-se que para tal tarefa a autarquia tem destacados um arquitecto e um historiador.A associação de moradores teme que esta corrida contra o tempo não seja ganha por quem quer proteger o bairro. "Continua a assistir-se diariamente à destruição do bairro. As facha- das exibem cada vez mais publicidade abusiva; as caixilharias originais continuam a ser substituídas por outras de desenho e materiais inadequados; aparelhos de ar condicionado e parabólicas proliferam; as lojas tradicionais encerram ou modernizam-se. O azul, que deu o nome ao bairro, dá lugar ao rosa e recentemente a um extravagante amarelo limão", queixam-se. Além de terem apresentado contributos ao município no âmbito da preparação do regulamento (ao nível das fachadas, cores, escadas de serviço e marquises de tardoz (traseiras e áreas comuns interiores), a associação tenta sensibilizar outra parte importan- te neste processo: os comerciantes. Nem sempre com sucesso. "Às vezes olham-nos com alguma descrença, sobretudo quando começámos por reivindicar o estacionamento tarifado e a circulação automóvel condicionada no interior do bairro. Diziam-nos que iríamos afastar clientes", lembra Ana Alves de Sousa. Este distanciamento ainda se mantém. "Querem transformar o bairro num condomínio, mas isso não é possível", afirmava ao DN a proprietária de uma das duas farmácias existentes no bairro. "Nada mais errado", responde Ana Alves de Sousa. "Queremos um bairro vivo, genuíno, que retome a unidade que tinha e que se tem vindo a perder, com o rasgar das ruas, com o atravessamento de tráfego automóvel. O bairro não é só composto pelas três artérias mais conhecidas: a Fialho de Almeida, a Ressano Garcia e a Marquês de Fronteira. A Ramalho Ortigão também dele faz parte, só que com a construção do viaduto sobre a José Malhoa e o consequente alargamento do seu perfil rodoviário deixou quase de ser habitável. As pessoas, sobretudo as idosas, não conseguem atravessá-la. Têm medo de ser atropeladas. "
09/04/2007
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2 comentários:
Dentro de décadas vamos viver numa cidade de "fachadas". A luta contra a ignorância é prioridade absoluta.....ou não fica nada.
JA
O Bairro das Colónias é outra preciosidade do periodo Art Déco que precisa urgentemente de ser classificado! Também lá proliferam as alterações sem critério: cores berrantes, estores de plástico, caixilharias de alumínio, portas de prédios destruídas, etc...
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