10/09/2007

Zezinha quer explusar chineses da Baixa

In Expresso On Line

"Maria José Nogueira Pinto quer acabar com as lojas chinesas na Baixa de Lisboa. A ex-vereadora do CDS vai continuar ligada ao projecto de reabilitação da Baixa-Chiado, cuja elaboração coordenou. Segundo explicou ao Expresso, deverá liderar, durante dois anos, uma unidade de missão que será “uma placa giratória para a ligação com os parceiros: comerciantes, bancos, restauração, hotelaria, comissões de moradores e juntas de freguesia, rede cultural”.

Esta entidade, que ‘Zezinha’ tenciona dirigir “em «part-time»”, ainda fará o planeamento e operacionalização do projecto, além de avançar com “todas as medidas de curto prazo”, relacionadas com segurança, iluminação, limpeza e algum trabalho no espaço público.

Outra prioridade imediata, diz, “é travar o declínio (da Baixa-Chiado)”. A antiga vereadora dá como exemplo “travar a proliferação das lojas chinesas, porque se continuam naquele território, nunca mais vai ser possível deitar mão ao pequeno comércio”. Nogueira Pinto considera que o comércio “é central” para a Baixa, mas sem as lojas chinesas, que “estão a dar cabo do comércio da cidade”.

O ideal, explicou Nogueira Pinto ao Expresso, seria deslocar as lojas chinesas para uma «Chinatown» (que, quando era vereadora, propôs que se localizasse entre o Martim Moniz e os Anjos). Não sendo assim, propõe que a autarquia proíba a abertura de novos estabelecimentos destes na Baixa-Chiado. “A Câmara é que dá a licença, pode dizer que a quota de lojas chinesas neste espaço está esgotada.”

Em sua opinião, no caso destas lojas não basta falar em liberdade de mercado. “Não há nenhum controlo sobre a origem desses produtos, portanto, mesmo em termos de mercado, não digo que seja concorrência desleal, mas não estou certa de que seja leal. Se esses produtos de facto são feitos por uma criança que come uma tigela de arroz...” Apesar destas dúvidas, a coordenadora do plano da Baixa-Chiado assume que compra “muita coisa nas lojas chinesas, desde frigideiras a «tuperwares», panos de cozinha e pilhas. E sei lá donde é que aquilo vem”.

Nogueira Pinto considera os imigrantes chineses “ordeiros e trabalhadores”, mas preferia que, “como estão vocacionados para o comércio, estivessem num território que eles caracterizam.” E defende que a autarquia devia envolver a China nessa solução. “Todos estes chineses chegam com o «agrément» do Governo deles. Portanto, há um interlocutor oficial, basta dizer ao senhor embaixador da China que a câmara quer fazer uma Chinatown, e a negociação faz-se.”

8 comentários:

Paulo Ferrero disse...

LOL. Viva MJNP!

Carlos Medina Ribeiro disse...

A reacção de MJNP contra os chineses, se bem que não seja tão grosseira como a de A.J.Jardim, faz lembrar as velhas reacções contra outra minoria bem-sucedida: a dos judeus, também eles empurrados para bairros próprios...

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Outras dicas:

As Chinatowns não foram fruto do extremo racismo da sociedade americana?

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Estará MJNP disponível para aceitar que, na China, os investidores portugueses (industriais, mas não só) também sejam "pressionados"?

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Ao falar na exploração infantil, MJNP aceitará que a Europa civilizada aplique o mesmo critério a algumas das nossas exportações - nomeadamente de calçado?

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Etc

Nuno Valença disse...

Para além das considerações de Carlos Medina Ribeiro há que ter em conta os seguintes aspectos:

- é mais fácil demonizar o comércio dos chineses que apontar para as fraquezas do comércio tradicional, que muitas vezes não consegue oferecer conveniência e/ou qualidade.
- Parece redutora a ideia que as coisas se resolvem da forma apontada por MJNP. Nem tudo se resolve por decreto, e nem todos os decretos (por muito que nos pareçam fazer sentido)podem ser postos em prática!

De qualquer forma é relevante que MJNP diga o que muitos políticos pensam, mas não dizem com medo do politicamente correcto. Mesmo que nem todos concordem com ela, é óbvio que se trata de uma questão pertinente.

Dário Nantes disse...

ai se o SOS racismo sabe..........

Carlos Medina Ribeiro disse...

Coloquei um post mais detalhado n' "O Carmo e a Trindade"
http://carmoeatrindade.blogspot.com
onde este assunto também está a ser discutido

Anónimo disse...

Hehe....será que a senhora já visitou a Via Principe Eugenio....
um bom exemplo de "Chinastreet", e bem horrível...bolas é melhor em avulso.

JA

Diogo Moura disse...

concordo com Carlos Medina Ribeiro

John le Doe disse...

Preocupam-me duas ou três coisas e a mais séria não diz respeito directamente a Lisboa, talvez devesse ser um caso para o Ministério Público meditar – e, eventualmente, agir – porque me parece que a impunidade de algumas figuras públicas fora do futebol começa a raiar o ultraje ao cidadão.
Mas passemos ao que interessa.
A cidade moderna – e Lisboa conseguiu resistir a sê-lo até há duas ou três décadas atrás – enferma de vários problemas, uns fáceis de debelar, outros não. Este parece-me mais entranhado – eventualmente já inexpurgável - por ser um problema de mentalidade (desculpa-se uma pequena parte por termos vivido tantos anos em ditadura) e pode resumir-se na palavra segregação (ou discretização, se preferirmos um termo estruturalista mais erudito). Na cidade pré-moderna tudo e todos conviviam, o espaço era repartido e gerido pelas pessoas, as coisas surgiam, modificavam-se e desapareciam por força das circunstâncias; as pessoas regulavam ao vivo as relações entre elas e as relações com o espaço; as classes habitavam os mesmos bairros, os mesmos prédios (por cá nem tanto, e o elevador terá desferido o golpe fatal na hierarquização da vertical - só o rés-do-chão se manteve distinto). As lojas chinesas de então ocupavam o lugar que o contexto e a oportunidade lhes ofereciam ou que a ocasião reclamava: davam resposta a uma necessidade e representavam uma adequação à vida concreta da cidade. Passava-se assim com quase tudo e a cidade era um organismo saudável (perdoe-se a metáfora higienista e esqueça-se, por exemplo, o água-vai), que se adensava e crescia com um sentido e uma smoothness bem evidentes.
Um dia alguém se distraiu, confundiu o mapa com o território, e decidiu mandar separar as coisas. Nasceu a cidade moderna, a cidade racional, a cidade pensada, a cidade perfeita e sabe-se lá mais quantos sinónimos da cidade que temos. Se é inegável a vantagem de já não ter a Petrogal e outras coisas desagradáveis dentro da cidade, é também inegável, por exemplo, a aberração de ter as universidades concentradas num pólo (para já e por muito tempo, fora da cidade – já se havia feito o mesmo com o Campo Grande). Em que café se encontram agora os estudantes?[1] O que conhecem eles de Lisboa? Que cidade habitam?
A Baixa sofreu o problema moderno do zonamento com mais de um século de antecedência e isso terá contribuído para o seu insucesso [2], o agrupamento das profissões terá sido forçado – ao contrário de uma vocação marinha que determinou com naturalidade a concentração de alguns ofícios na margem do Tejo – e o preço foi a falta de enraizamento da população residente. Se subsistirem dúvidas poderemos fazer um exercício saudável: percorrer as ruas da Baixa, de olhos levantados, à procura das placas que assinalam, um pouco por toda a cidade, os seus residentes ilustres (mesmo no caso dos lugares de encontro – os cafés, por exemplo – somos remetidos para a fronteira da Baixa – a Brazileira, o Martinho da Arcada, os cafés do Rossio, etc.)
O zonamento, o agrupamento espacial das unidades funcionais, dos grupos homogéneos (qualquer que seja a pertinência) é um rude golpe na possibilidade de sobrevivência de uma cidade. Retirar um conjunto de lojas que surgiu com espontaneidade num lugar e, ainda por cima, reuni-las num espaço confinado é, além de muitas outras coisas, ferir a cidade.

A Maria José não é estúpida, pelo contrário, todos nós – por muito que a alguns possa custar a admitir – já a vimos ter desempenhos brilhantes. É apenas incompetente nesta matéria. Como o somos todos nós, porque crescemos à sombra de valores falaciosos no que respeita às cidades, porque temos por lugares comuns [3] muitas das causas para a doença da cidade.

Há um acerto deveras impressionante na gestão das nossas cidades, uma regularidade que deveria ser estudada a sério: cada tentativa que o organismo faz para retomar o funcionamento, por ínfima que seja, é de imediato atacada pelo poder (político, intelectual, científico, etc., etc.), como se de uma perigosa erva daninha se tratasse.
Proponho que se lhe chame a síndrome do jardineiro zeloso .
Uma óptima cartografia deste fenómeno pode ser encontrada – para além dos tradicionais lugares de expressão da opinião com poder – nos textos do projecto da Baixa.
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[1] Os alunos de Belas-Artes subiam do Chiado à Escola Politécnica para ter algumas aulas o que, para além de sustentar uma vida interessante nesse eixo agora turístico, trazia consigo uma miscigenização verdadeiramente própria de uma cidade.
[2] Ao contrário do que se poderia pensar, a Baixa nunca foi verdadeiramente um lugar de habitação.
[3] «…aquilo em que estão de acordo todos, quase todos, ou os mais informados…» relembrando grosseiramente Aristóteles.