In Público (25/4/2008)
Ana Henriques
«Só os comunistas se opuseram à transformação da unidade hoteleira, alegando que esta irá "desfigurar o edifício na sua traça original"
10
andares tem o Hotel Ritz Four Seasons, com entrada pela Rodrigo da Fonseca, e 282 quartos com vista privilegiada
A Câmara de Lisboa aprovou esta quarta-feira a sentença final de morte das galerias do Hotel Ritz e a sua substituição por um novo edifício com mais dez metros de altura, destinado a comércio e serviços.
Os comunistas foram a única força partidária que se opôs à transformação do conjunto arquitectónico, que o actual bastonário dos arquitectos, João Rodeia, considerou em 2005 ocupar "um lugar central e paradigmático na história da arquitectura portuguesa e da cidade de Lisboa". Mesmo a sua antecessora na Ordem, a agora vereadora, Helena Roseta, conformou-se com a irreversibilidade de decisões camarárias anteriores à de ontem, tendo-se abstido quando chegou a altura de votar o licenciamento da demolição.
"Perante essas decisões tínhamos que ter um argumento legal qualquer para chumbar [o novo projecto]", explica a autarca, que admite ter tido muitas dúvidas na posição a tomar. "O problema é que o Instituto Português do Património Arquitectónico [Ippar], actual Igespar, o tinha aprovado."
Acontece que o principal argumento do Ippar para viabilizar as intenções dos proprietários do Ritz se relaciona precisamente com as autorizações camarárias que já existiam, quando lhe foi pedido parecer sobre o assunto: um pedido de informação prévia e um projecto de arquitectura aprovados respectivamente em 2002 e 2004, pela então vereadora do Urbanismo, a social-democrata Eduarda Napoleão, que terão dado direitos aos proprietários do hotel.
"O que foi aprovado desfigura o edifício na sua traça original", lamenta o vereador do PCP Ruben de Carvalho, sublinhando o facto de o Ritz se encontrar em vias de classificação patrimonial. As restantes forças políticas não foram sensíveis ao argumento, tendo votado a favor da demolição.
A transformação do gaveto onde se situam as galerias - no cruzamento entre a Av. Joaquim António de Aguiar com a Rua Castilho - "desfaz duas das premissas mais importantes" do desenho original, refere o técnico do Ippar que analisou em 2005 o novo projecto, feito pelo gabinete de arquitectura RRJ Arquitectos.
"O novo corpo em altura vai tapar parcialmente uma das perspectivas mais importantes do conjunto [nomeadamente para quem sobe a Rua Castilho e a Joaquim António de Aguiar], precisamente aquela que permite entender a relação do imponente bloco dos quartos com a plataforma de apoio, através dos imponentes pilares de sustentação".
Classificação chegou tarde
Apresentado como um dos exemplos mais marcantes da arquitectura do modernismo em Portugal, pertence a Porfírio Pardal Monteiro o desenho original do Ritz, que é dos anos 50 do século passado.
O projecto não contemplava as galerias, que correspondem a uma ampliação feita por um colaborador seu, o arquitecto Leonardo Castro Freire, uma década mais tarde, após a morte de Pardal Monteiro. Amplicação essa que, no entender do Ippar, não retira valor a esta parte do conjunto, "que beneficiou com a sua introdução".
Apesar do elevado valor que reconhece à obra - "constitui um bem comum vivo -, foi o actual bastonário dos arquitectos quem, como responsável máximo do Ippar, emitiu há dois anos e meio parecer favorável à demolição integral das galerias, que nos últimos anos foram vítimas de abandono. O processo de classificação patrimonial surgiu demasiado tarde para impedir o seu desaparecimento.
O PÚBLICO tentou, sem sucesso, obter esclarecimentos sobre a nova obra prevista junto da sociedade proprietária do Hotel Ritz, a Sodim, mas tal revelou-se impossível.
10
andares tem o Hotel Ritz Four Seasons, com entrada pela Rodrigo da Fonseca, e 282 quartos com vista privilegiada»
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
3 comentários:
Mas como é que o responsável por tudo isto, o arquitecto João Rodeia, enquanto "responsável máximo do Ippar, emitiu há dois anos e meio parecer favorável à demolição integral das galerias" e agora aparece, quando já nada há a fazer, e enquanto bastonário dos arquitectos acabado de empossar, a clamar que a obra "constitui um bem comum vivo"?
São estes mistérios que nos fazem questionar os designios dos IPPARs desta cidade, onde tanta coisa se passou sem cidadão saber...
olhóoooo mamarrachooo fresssquinhoooo!!!!
e que tal uma mega petição contra mais um ataque ao nosso pouco património que resta por destruir?
as petições parecem proliferar por tudo e por nada, mas neste caso dialogar com os intermináveis processos burocráticos - e políticos - das nossas instituições públicas parece ainda mais desencorajador...
Enviar um comentário