05/01/2011

Av. Brasil: manual da hegemonia automóvel no espaço público III

A Avenida do Brasil em Lisboa é um triste exemplo de como temos deixado o espaço das nossas cidades ser conquistado pelo automóvel. Esta avenida é particularmente interessante por ser uma avenida (1) moderna, (2) larga, (3) numa das áreas onde houve planeamento urbano digno desse nome, (4) central, (5) com metro a 300m, (6) servida por imensos autocarros, (7) foi abençoada pelo plano de ciclovias, resumindo, teria tudo para ser um bom exemplo.

7. Pilaretes

Existem ocasionalmente alguns pilaretes ao longo da Avenida, mas o seu propósito não é bem claro. Estes parecem garantir que ninguém estacione em frente a entradas de garagens. O estacionamento no resto do passeio é bem-vindo:

Estes dizem que há um bocadinho do passeio onde não se deve estacionar:

Os seguintes (que já mereceram um post) têm uma mensagem muito clara: estacionar no passeio não é problema, desde que não se tape a publicidade.

8. "Mas há falta de estacionamento"

Se cabe aos moradores arranjar um local para morar, e aos lojistas um local para venderem, não percebo porque haveria de caber à câmara arranjar espaço para estacionar... Mas enfim, talvez a razão pela qual os proprietários acham que há poucos lugares seja porque estes venderam os espaços que havia disponíveis para outros fins, com óbvio proveito próprio, como por exemplo para comércio:

9. "Ciclovia"

A "ciclovia" foi criada por gente com boas intenções que infelizmente se teve que submeter servilmente ao automóvel. Não se podendo roubar espaço ao automóvel, meteu-se a "ciclovia" no passeio.

E sejamos justos, não chega a ser uma ciclovia. São uns bocados de passeio pintados de vermelho,

sendo que nos bocados não pintados o ciclista é convidado a meter-se pelos espaço exíguo dos peões - nunca pelo meio do automóvel:

Nos cruzamentos seria complicado determinar o percurso da ciclovia, de modo que mais vale deixar o ciclista desenrascar-se. Neste caso parece-me que a ideia é que o cruzamento seja sobrevoado, já que não existe ciclovia de um ponto ao outro:

Sendo que se optou por uma ciclovia bi-direcional (o tipo de ciclovia mais perigosa), também não há preocupação com a segurança nos cruzamentos. Os carros não são avisados que vão cruzar uma ciclovia quando viram à direita:Há ainda obstáculos colocados pela câmara (nunca vi pilaretes no meio da ciclovia noutros países)

e obstáculos tolerados pela câmara.

Quando tentei circular na ciclovia perdi a conta ao número de sinais de perda de prioridade que existem (como se vêem em algumas fotos acima). Uma via a direito com constantes perdas de prioridade, isso chega a ser uma via para circular?

4 comentários:

Xico205 disse...

Se a loja ou os residentes deixa de ter estacionamento simplesmente mudam-se e a zona passa a ficar vazia e a degradar-se simples.

Eu sei que nas ruas pedonais de Alfama tambem há comercio e habitantes, mas a classe social dos residentes da Av do Brasil não é a mesma.
Alem disso ninguem de fora de Alfama gasta dquele comercio enquanto que na Av. do Brasil acontece isso.

O ciclista se quiser pode andar de bicicleta na estrada, corre é mais riscos de ser atropelado mas nada o impede.
Numa estrada reta tambem há imensas perdas de prioridades. Assim de repente lembro-me da rua principal do Bº da Encarnação onde fiz exame de condução em 2002, em que em todas as interseções com ruas secundárias perdia a prioridade.

Realmente a ciclovia da Av do Brasil é a coisa mais mal parida que há em conjunto com outras. É o que se chama fazer coisas para o espetaculo em vez de fazerem bem feito. Neste caso é uma via partilhada entre peões e ciclistas em que as bicicletas têm prioridade.

Anónimo disse...

Caro Xico, não o entendo.
Não tem filhos, pais ou Avós com mobilidade reduzida?
Não quer ver as pessoas desfrutarem da cidade?
Ver os passeios livres? Morar numa rua onde se possa deixar uma criança andar num passeio sem receio de ser atropelada?
Se estes moradores ou lojistas se forem embora por falta de estacionamento, boa viagem.
Outros virão, com novas ideias e formas de viver.
Podem ir todos para o subúrbio, de onde nunca deviam ter saído e onde me parece que é onde se sentem melhor.
Os andares da Av do Brasil não ficaram vagos, não se preocupe.

Xico205 disse...

Em lado nenhum vejo o perigo duma criança ser atropelada num passeio. Aliás com carros estacionados esse perigo diminui já que fazem de barreira de protecção. O que não falta nestes passeios são espaço para as crinaças andarem.

Em lado nenhum vejo que alguem que ande por esta rua seja afetada com o estacionamento desse Alfa Romeo Mito.

Não vejo impossibilidade nenhuma de desfrutar da cidade.

Não ficaram não, mas podem vir a ficar, esse é que é o problema.

Ok, estes comerciantes que vão embora. Realmente ainda há poucos chineses e indianos na Av. do Brasil.

Xico205 disse...

Ó anónimo, a migração esmagadora é de Lisboa para o suburbio, não é do suburbio para Lisboa. Esses chegam a conta gotas.

Até porque na maioria das vezes Lisboa não tem nada que os atraia a residir.