Opinião
Um prémio poético
Por José Sarmento de Matos in Público
Lisboa acaba de ser galardoada pela Academy of Urbanism da Grã-Bretanha com o Urbanism Award 2012 - The European City of the Year. Embora as outras duas cidades em concurso não fossem propriamente grandes metrópoles europeias - Oslo e Gotemburgo -, a verdade é que o numeroso júri da academia britânica não hesitou em dar o prémio a Lisboa, reconhecendo que a cidade portuguesa se avantajava com mérito sobre as duas rivais.
O distintos membros do júri, composto essencialmente de arquitectos e urbanistas, estiveram em Lisboa este Verão, tendo então tido oportunidade de os acompanhar num animado passeio de eléctrico, no 28, claro, onde tive a oportunidade de os pôr a par de algumas características da cidade, tendo notado sobretudo o seu olhar interessado e entendido sobre a especificidade lisboeta de ser uma cidade onde num ápice se passa do racionalismo setecentista da Baixa pombalina para o dédalo de ruelas das partes mais antigas, dicotomia que deveras os interessou, especialmente dadas as múltiplas questões formuladas sobre esse tema para eles tão inesperado.
No entanto, lendo agora o texto fornecido pela academia, julgo que não terão sido as particularidades históricas, sobre as quais me esforcei para os elucidar conforme podia e sabia, que tenham sido a razão fundamental para a atribuição do prémio pelos especialistas ingleses. Tudo indica que estavam bastante mais interessados na percepção das qualidades que a cidade podia apresentar na actualidade, quer do ponto de vista de renovação patrimonial e reabilitação urbana, quer na arquitectura e urbanismo mais recentes, com uma menção especial à Expo-98 e ao Parque das Nações. De salientar também que é expressamente mencionada a especial aptidão para cruzamento de culturas, sendo dito expressamente (numa tradução livre) "que se reflecte a habilitação especial da cidade para manter a sua relação com as tradições mediterrânicas e atlânticas assim como os seus laços com o Brasil e África". Valorizam curiosamente com ênfase a chamada "calçada portuguesa", tema esse que por cá tanto se discute, consoante as quedas sucessivas se acentuam. Outro aspecto muito valorizado é a conjugação íntima entre a cidade e os seus arrabaldes, aquilo a que apelidamos a Área Metropolitana de Lisboa. Mas os peritos foram igualmente sensíveis ao despovoamento dos centros históricos, chamando a atenção para o incremento acentuado das medidas que o evitem, em especial a reabilitação acelerada dos edifícios que os compõem.
Enfim, um olhar simpático sobre a cidade e o seu universo, sustentáculo de um prémio lisonjeiro, sem dúvida um estímulo para quem acredite que Lisboa tem todas as condições para se tornar, de forma cada dia mais acentuada, não só um destino turístico de grandes cruzeiros e numerosos estrangeiros chegados em bando ou solitários, mas também um lugar simpático para quem gosta de cá viver.
Um dos aspectos mais curiosos deste prémio é o diploma formal atribuído pela interessada instituição britânica. Trata-se de um diploma à antiga, em papel bem grosso, com todos os dizeres em belas letras, destacando a categoria de European City of the Year. Mas o mais insólito é que os dizeres do texto que segue estão escritos em verso, numa série de oito estrofes duplas, todas elas construídas em torno das míticas sete colinas da cidade, destacando diversos aspectos tidos em conta na atribuição do prémio.
No fim, além do chairman, Kevin Murray, assina também o senhor Ian McMillan, que se intitula poet-in-residence, presume-se que da própria instituição. Isto é, a Academy of Urbanism dispõe de um poeta contratado para tornar mais coloridos os seus diplomas, por hábito entre nós bastante desenxabidos.
Parece de lembrar à Ordem dos Arquitectos Portugueses que, havendo por aí tanto poeta à míngua, se dispusesse a seguir as pisadas da congénere britânica e pusesse em verso as obras mais em foco de alguns dos seus associados. Olisipógrafo
20/11/2011
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1 comentário:
Já vi muito boa gente (e com razão) ficar "cegamente apaixonada" por esta bela cidade.
Agora um prémio de "urbanismo" em concorrência com Göteborg e Oslo....só com uns "berdinhos" a mais.
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