In Público (30/11/2006)
Vanessa Rato
"Espólio de Daciano da Costa poderá ficar no Mude: o museu encetou negociações com os herdeiros de um dos nomes maiores do design português do século XX
O MUDE EM NÚMEROS
4,2 milhões
de euros é a verba prevista para as obras de renovação do Palácio de Santa Catarina, a instalação e abertura do museu
500 mil
euros é quanto o museu terá para se promover e fazer compras em 2007, o ano que antecede a sua abertura
25 mil
euros foram já aplicados em compras a quatro autores portugueses: 15 obras da estilista Ana Salazar e dos designers Cristina Filipe, Fernando Brízio e Miguel Vieira Baptista
A inauguração oficial foi atrasada um ano e está agora prevista para o final de 2008, mas o novo Museu do Design e da Moda, a abrir em Lisboa no Palácio de Santa Catarina e que se chamará Mude, já tem orçamento para se promover e fazer compras em 2007 - 500 mil euros - e, nos últimos meses, já fez aquisições.
Desde o anúncio da sua criação, em Maio, a Câmara Municipal de Lisboa criou um fundo de 100 mil euros para compras em 2006. Destes, 25 mil foram entretanto aplicados em aquisições a quatro criadores portugueses. No total, são 15 peças da estilista Ana Salazar e dos designers Cristina Filipe, Fernando Brízio e Miguel Vieira Baptista, e os primeiros passos de uma política desenhada para completar a colecção de Francisco Capelo, que a câmara comprou em 2002, quando estava avaliada em 10 milhões de euros, e que serve de base ao museu.
Reforçar a presença do design português num espólio tido como de excepção a nível internacional e que, enquanto esteve instalado no Centro Cultural de Belém, atraía mais de 300 mil visitantes por ano é uma prioridade, explicou ontem a directora do museu, Bárbara Coutinho, na primeira vez que falou publicamente sobre o projecto desde que foi apontada para o cargo, em Julho.
Um museu, "uma estratégia"
Numa conferência em que estiveram também o vereador da Cultura, José Amaral Lopes, e o coleccionador Francisco Capelo, Bárbara Coutinho explicou ainda que ampliar o núcleo de design industrial, acompanhar a criação mais actual e fazer um recuo temporal que mostre a produção anterior aos anos 30 - a actual baliza histórica da colecção - são as restantes prioridades do plano museológico.
Mas a ampliação da colecção - 1000 objectos de design e 1200 peças de alta costura - não deverá basear-se apenas em aquisições: ainda segundo Bárbara Coutinho, foram há pouco abertas negociações com os herdeiros de Daciano da Costa no sentido de o museu vir a receber em depósito o espólio daquele que foi um dos nomes maiores do design português.
Autor dos interiores e equipamentos de espaços tão emblemáticos como a Biblioteca Nacional, a Fundação Calouste Gulbenkian, o Teatro Villaret, o Casino Estoril, o Centro Cultural de Belém e a recente Casa da Música, Daciano da Costa, que morreu há um ano, foi um dos primeiros designers portugueses a ver os seus projectos serem produzidos em série. É, precisamente, uma das responsabilidades assumidas pelo museu: a criação de ligações entre os criadores a indústria, de forma a ajudar o design nacional a sair do protótipo.
O próprio nome da instituição, que será Mude - não adoptando a sigla de Museu do Design e da Moda -, assume desde logo todo um programa de intenções: no conceito do museu, enfatizar o carácter transformador do design e assumi-lo como um motor para a alteração de atitudes não passa apenas por manter e expor uma colecção - implica a criação de "uma plataforma de encontro entre autores, empresas, escolas e públicos".
"No Centro Cultural de Belém a Colecção Capelo nunca foi um museu a 100 por cento: era uma exposição permanente. Aqui há um projecto, uma estratégia, uma equipa e objectivos muito ambiciosos", sublinhou a directora do Mude, em cujo plano de arquitectura (ver caixa) está já prevista uma sala de ensaio para a apresentação do resultado final de residências de criação e laboratórios.
Coordenadora do Serviço Educativo do Centro Cultural de Belém entre 1998 e Julho deste ano, Bárbara Coutinho esteve ligada ao espólio de Francisco Capelo desde que este entrou no CCB, como depósito, em 1999. Fez parte da equipa que instalou a colecção como Museu do Design. Segundo explicou ontem, até Abril, quando se anunciou a saída da colecção, o público terá tido oportunidade de ver apenas entre 30 a 40 por cento das peças de design de equipamento e mobiliário da colecção - a parte de moda, que não entrou no depósito, nunca foi vista em Portugal.
Com peças dos mais emblemáticos nomes internacionais do design de mobiliário e moda do século XX e exemplares dos mais importantes movimentos, a colecção de Francisco Capelo foi comprada em 2002, quando Santana Lopes estava à frente da Câmara de Lisboa. Na altura foi avaliada em 10 milhões de euros; Capelo acedeu em vende-la por 6,6 milhões na condição de ficar com voto presidencial sobre o destino do seu espólio. Ontem, Amaral Lopes, disse que, neste momento, o mesmo conjunto valerá várias vezes mais. Segundo a directora, só a parte de design de mobiliário e equipamento está já avaliada em mais de 17 milhões de euros.
Também ontem, Francisco Capelo anunciou a doação ao museu de cerca de 350 livros sobre design, como base para um centro de documentação, e de 40 novas peças de design de equipamento. O coleccionador escusou-se a entrar em mais detalhes sobre a doação.
O plano de arquitectura
O Museu do Design e da Moda, a inaugurar até ao final de 2008, no Palácio de Santa Catarina, vai ocupar parcialmente o Largo de Santa Catarina, frente ao edifício oitocentista e ao Museu das Farmácias. No largo em que desemboca a Rua Marechal Saldanha, um dos principais acessos ao Bairro de Santa Catarina, com vista para o rio e o Jardim do Adamastor, está prevista a construção de uma estrutura transparente onde ficarão instaladas as bilheteiras e postos de informação do museu. O prolongamento do edifício para um espaço hoje usado para estacionamento automóvel foi decidido de forma a preservar todo o espaço expositivo do interior do palácio, explicou a directora do museu, na ausência do arquitecto Alberto Caetano e do proprietário da discoteca Lux, Manuel Reis, que assumem a obra de arquitectura. O próprio Jardim do Adamastor fará parte do museu, com mostras pontuais, mantendo-se, contudo, o seu carácter público, sublinhou Bárbara Coutinho. Com os custos de obras, implantação e abertura estimados em 4,2 milhões de euros, o museu terá uma área expositiva de cerca de 1800m2, enquanto os espaços públicos - incluindo uma cafetaria com vista para o casario da zona da Bica, espaço educativo, um auditório para 70 pessoas e um centro de documentação - ocupam cerca de 300m2. "
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