19/05/2010

Privados descrentes são entrave à revitalização da Baixa

In Público (19/5/2010)
Por Inês Boaventura

«A "decrepitude" da Baixa Pombalina "é uma escolha, não uma fatalidade" e o plano de pormenor de salvaguarda recentemente aprovado pela Câmara de Lisboa só será bem sucedido se o aparelho camarário for capaz de "dar resposta às ansiedades dos privados". Este é o entendimento do historiador António Sérgio Rosa de Carvalho, que defende que para tornar viva esta zona da cidade há que começar por convencer as "elites" a mudarem-se para lá.

Licenciado em História de Arte e Arqueologia pela Universidade de Amesterdão, António Sérgio apresentou anteontem no Centro Nacional de Cultura a sua obra História das Ideias, História da Teoria da Arquitectura e Defesa do Património. A Baixa, área na qual chegou a desenvolver trabalho enquanto assessor da autarquia na área da reabilitação urbana e onde reside, foi um dos temas centrais da sua apresentação.

O historiador considerou "um erro ter-se desistido da classificação da Baixa a património mundial", quando em seu entender a reabilitação desta zona de Lisboa devia ser entendida como "um desígnio nacional". E esse processo, diz, poderia começar pelo Largo de São Paulo: se aqui funcionasse "uma microcidade" com comércio, habitação e espaço público, esse exemplo acabaria por alargar-se às artérias vizinhas.

António Sérgio louvou a existência de alguns casos de "inteligência emocional e sensibilidade patrimonial" no restauro de espaços de comércio e serviços, mas sublinhou que a maioria dos empresários tem "um profundo cepticismo perante o aparelho camarário", desde logo devido à multiplicidade de interlocutores.

Quanto ao resto da cidade, o historiador lamentou a inexistência de uma cultura de restauro, criticando os arquitectos que, em vez de lutarem por uma certa "invisibilidade", fazem por "deixar uma marca da sua intervenção". Um dos resultados, acusa, é "a agonia da Lisboa romântica", onde foram surgindo "intervenções cyborg" como o edifício Heron Castilho, onde à "carcaça biológica" se acrescentou "um esquema high-tech".»

5 comentários:

J A disse...

Arquitectos, construtores, proprietários.....fazem o seu papel de privados.
Cabe às entidades responsáveis, colocar a fasquia a altura devida. Mas como os segundos parecem estar ao serviço dos primeiros....pescadinha de rabo na boca.

Anónimo disse...

Foi um privilégio assistir à "aula" de António Sérgio Rosa de Carvalho.
A ideia sobre o Largo de São Paulo merece ser aprofundada.

Anónimo disse...

Baseada na minha experiência no mercado imobiliário residencial, a minha opinião é a seguinte, tendo em conta que :


1. A zona da “Baixa” tem um inegável valor histórico. As fachadas dos edifícios devem ser intocáveis, tanto quanto possível.

2. Os edifícios que compõem a zona tem sensivelmente 200 anos (alguns um pouco mais, outros um pouco menos), apresentando questões delicadas ao nível da sua sustentação. Este factor encarece qualquer projecto de recuperação/reconstrução.

3. Os edifícios são na sua origem desprovidos de inúmeros aspecto de conforto fundamentais, actualmente, do ponto de vista comercial, nomeadamente espaço para estacionar automóveis.


É meu entender que a solução para a zona da “Baixa” só pode passar por uma ou pela conjugação de 3 hipóteses, todas com vista ao mercado imobiliário residencial, a ver :

1. Destinar os edifícios ao arrendamento jovem para habitação, sendo este um mercado em que as exigências ao nível de conforto são mais baixas, sendo muitas vezes desvalorizado o factor “espaço para estacionar”. Esta solução só é viável com um plano jurídico específico para o projecto “Baixa” em que os despejos por incumprimento do inquilino são concretizados num muito curto espaço de tempo, captando assim a confiança dos investidores.

2. Destinar os edifícios à venda de apartamentos para habitação, a custos reduzidos, mais uma vez captando um público com menores exigências em termos de conforto. Só é possível com um pacote alargado de isenções fiscais quer para promotores quer para compradores, o qual diminuiria os custos fiscais do projecto.

3. Destinar os edifícios à venda de apartamentos para habitação de qualidade, os quais terão de ser adaptados às exigências actuais, nomeadamente dotados de espaço para estacionar, o que apenas é (ou será) possível no piso térreo.


Se bem me recordo, o único projecto nos últimos anos de reabilitar um edifício para habitação, ocorreu na Rua da Prata, por parte de um promotor espanhol. Correu mal do ponto de vista comercial (como seria de esperar – preços elevados e ausência de conforto adequado ao preço) e o promotor encerrou a actividade em Portugal.

Neste momento os promotores imobiliários estão “perto”, nomeadamente no Chiado, mas se analisarmos o que está a ser feito e o que foi feito anteriormente, vamos encontrar aquela que é a minha terceira solução, ou seja, a habitação para particulares de elevado rendimento. Refiro que alguns dos imóveis mais caros do país são vendidos precisamente no Chiado. Porque não está a ser replicado na Baixa ? Porque não é permitido construir com base nos mesmos parâmetros de conforto.

Estou certo que as soluções apresentadas são as únicas capazes de revitalizar a zona da “Baixa”, com consistência e por um período longo, criando novamente raízes no espaço e dentro da realidade e exigência actual.

Helder Guerreiro disse...

Qual é o mal de mandar abaixo, mesmo na baixa!? Os edifícios poderão ter interesse histórico, então que se conserve um para estudo futuro (técnicas de construção e afins). O resto pode demolir-se - sempre que se justifique economicamente e mantendo o traçado original.

Parece-me que é muito mais pernicioso a proliferação de edifícios cyborg e outro tipo de edificações completamente deslocadas. Ou então edifícios a cair como vemos por toda a cidade.

Poder-me-ão chamar bárbaro ou coisa do género. Mas por minha vida, se mandarem um daqueles edifícios a baixo e se for reconstruído exactamente (volto a dizer, exactamente) segundo o traçado original, não vejo como vai descaracterizar a zona - nem afectar-lhe a personalidade. É óbvio que desta forma se deixa de puder viver o interior original do edifício, mas essa vivência é assim tão importante? E se é pq motivo a zona da baixa é tão pouco atractiva? - No estado actual de coisas são afectadas muito mais pessoas.

Desta forma o investidor teria o melhor retorno possível e a cidade não se descaracterizava.

Já agora, quem entrar em muitos dos edifícios da baixa sabe que estes estão para lá de qualquer restauro (economicamente sensato) - estou-me a referir a elementos estruturais destruídos, nichos, janelas e portas novos em todos os andares, etc. Logo os custos de restauro desses prédios são completamente proibitivos. - Esperamos que venha tudo abaixo?

/Helder

Anónimo disse...

http://www.construir.pt/2010/05/20/plano-de-pormenor-da-baixa-vai-a-discussao-publica/
Luís Alexandre