Seria excelente que se aproveitasse o entusiasmo com as eleições norte-americanas para perceber o tamanho monstruoso dos boletins de voto nos EUA. Além de escolherem os seus presidentes, os norte-americanos escolhem juízes, pronunciam-se sobre regimes de casamento, posse de drogas… e, eis o que agora me interessa, também sobre questões locais tão simples quanto autorizar ou não o mayor a gastar determinada verba na reconstrução dum edifício ou apoiar um determinado museu. Como é óbvio nunca o legislador português confiou em nós o suficiente para nos dar o poder de autorizar ou não os presidentes de câmara a gastarem o nosso dinheiro nuns projectos e não noutros.
O que de mais próximo temos disso é uma abstrusa figura que dá pelo nome de Orçamento Participativo. Para começar cabe perguntar – participado por quem? – pois temos de nos registar o que torna os participantes numa espécie de clube muito restrito. E depois a nossa função é mais ou menos de claque e não propriamente de cidadãos: podemos valorizar mais ou menos. E chega! Como resido em Lisboa inscrevi-me no site da CML, que presumo não ser muito diferente dos outros.
Devidamente registada confrontei-me com questões que não consigo entender e muito menos pontuar. Por exemplo, em que se traduzirá a “Intervenção na Avª António Augusto Aguiar entre o SEF até ao Corte Inglês” da qual só sabemos estar orçamentada em 500 mil euros e ter um prazo de seis meses para ser efectuada? Pode ser utilíssima ou tão desastrosa quanto a “intervenção” da CML na Av. das Forças Armadas, na qual a autarquia começou por achar que devia construir habitações para jovens e acabou a anunciar que as casas que as casas já vendidas só serão entregues ao compradores com o atraso de um ano e a transformar boa parte do projecto que era habitacional em escritórios? Será que faz sentido que uma autarquia como a de Lisboa se dedique à construção de escritórios? E será que nós nunca poderemos ter um boletim eleitoral onde isto nos seja perguntado? "
*PÚBLICO
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3 comentários:
Tenho de discordar com alguma da apoteose que aqui se faz das eleicoes americanas. Nem os americanos se sentem assim tao representados no seu complexo e distanciado sistema politico, nem sequer a capacidade de intervencao ao nivel local e assim tao geral. Existe sim uma muito boa e activa participacao nos assuntos locais pela populacao em geral sim, mas so em algumas cidades (geralmente nas grandes cidades). Esta cultura participativa e interventiva e' realmente isso: uma cultura. Nao depende tanto da legislacao, mas muito mais de uma predisposicao para participar, porque ha um sentimento de pertenca e de necessidade de manter aquilo que nos pertence nestas grandes cidades. Dizer-se que em Portugal as pessoas nao participam porque o legislador nao o permite e' do mesmo escapismo com que geralmente a participacao e' encarada: facam eles que eles e' que tem de o fazer!
Ora e' precisamente esta atitude que mina qualquer possibilidade de uma participacao politica colectiva. A diferenca e' que nestas "cidades participativas" americanas, a cultura participativa surge de baixo e arrasta as politicas. Em Portugal quer-se que a cultura participativa venha de cima e arraste as pessoas. Parece-me claro que isso nao chega.
De todas as coisas que se poderiam dizer do orcamento participativo, parece-me que a necessidade de inscricao e' uma mera irritacao pessoal. Tambem a fiz e pareceu-me uma inscricao muito pouco intrusiva e bastante adequada, tendo em conta que assim me permite participar Online. Sao as condicionantes da tecnologia que temos por enquanto.
Pessoalmente acho louvavel esta medida do orcamento participativo. Ha muita coisa a melhorar, concerteza. Mas o mais importante agora e' garantir que os projectos escolhidos sejam implementados exemplarmente, para que as pessoas comecem a perceber que o seu envolvimento tem consequencias. As poucas centenas de participantes e' um indicio de uma muito fraca cultura participativa.
Parece-me que de uma analise rapida dos projectos apresentados, salvo uma minoria de projectos muito interessantes, a grande maioria me pareceu muito bairrista e muito localista, sem criterio de prioridades para o todo da cidade. Mas uma discussao publica das consequencias, vantagens e desvantagens de alguns dos projectos apresentados talvez fosse muito importante acontecer, mesmo 'a posteriori, para que se comece a desenvolver uma maior consciencia de como "pensar cidade".
A ideia da democracia representativa é de eleger pessoas de confiança e próximas dos valores do eleitor para tomar decisões técnicas e operacionais. Não veria com bons olhos ligarem-me à meia noite para casa para sondar a cor da iluminação de uma estrada onde não moro.
Vejo estas iniciativas com alguma desconfiança, e uma boa sorte de retórica demagógica por parte do legislador. Não se elege representantes para nos devolverem a batata.
A senhora Helena de Matos já ultrapassou há muito tempo o seu limite de incompetência. Opina sobre tudo e pensa muito pouco antes de escrever os seus artigos. É verdade que o sistema de apresentação e votação de propostas no site da CML podia funcionar melhor e todos esperamos que possa ser melhorado. Mas se a senhora fazedora de opinião se tivesse dado ao trabalho (como eu me dei) poderia encontrar a descrição das propostas clicando em "Contributos Registados". Não o fez e resolveu ridicularizar uma iniciativa louvável da CML.
Destruir é muito fácil para o fazer nem é usar o cérebro, valorizar o que há de bom e propor melhorias dá muito trabalho e requer alguma reflexão, algo que a senhora Helena não parece gostar muito.
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