05/06/2009


Em defesa da cidade e da zona de Belém,

A Câmara Municipal de Lisboa não pode aprovar o novo Museu dos Coches

O Presidente da Câmara Municipal de Lisboa (CML), Dr. António Costa, afirmou publicamente há já algum tempo que considerava "desnecessário" o novo Museu dos Coches. E desde então a CML entendeu remeter-se ao mais completo silêncio sobre este projecto.

Tendo permitido ao Estado fazer o que a nenhum particular autorizaria, iniciar demolições e obras sem projectos aprovados, a CML prepara-se para quebrar da pior forma o seu silêncio comprometido, fazendo aprovar uma resolução do vereador Manuel Salgado, já agendada para debate, na qual se propõe “a homologação de parecer favorável condicionado ao projecto do novo Museu dos Coches”.

Ficamos assim a saber que a CML considera que o seu papel na construção da cidade e de uma zona tão sensível como Belém se limita a impedir a construção de um silo-auto junto ao Tejo.

É pouco, é muito pouco para qualquer município; e é especialmente pouco para um poder autárquico que, em vésperas de eleições, entendeu desencadear um conjunto de reflexões estratégicas alargadas a um amplo período de tempo (2010-2024), seguindo uma metodologia de debate público que saudamos e pode efectivamente conduzir uma nova e audaciosa visão da cidade.

Ora, para que seja levada a sério, impõe-se que a reflexão para o futuro seja ancorada em posições coerentes no presente. Sem isto teremos de concluir que as iniciativas agora tomadas não passam de "fogo de vista", em período eleitoral.

E nem sequer seria difícil fazê-lo. Com efeito, aquilo que nem os poderes autárquicos, nem os poderes centrais do Estado parecem interessados em concretizar, ou seja, uma reflexão em que as medidas tomadas no presente sejam perspectivadas estrategicamente, já foi iniciado pelos movimentos associativos culturais e patrimoniais, mostrando que existe na sociedade civil capacidade técnica e vontade de cidadania a que os poderes políticos deveriam estar mais atentos.

Pela primeira vez desde que há memória, reuniram-se em Maio passado, por iniciativa da Comissão Nacional Portuguesa do ICOM (Conselho Internacional de Museus), todos os directores de museus e monumentos de Belém, numa mesa-redonda ("Museu de Belém: perspectivas de futuro") muito participada e frutuosa, pelas propostas que nela surgiram. Como aí ficou bem demonstrado, é imperioso começar por considerar esta zona de Lisboa, Belém, onde se junta o maior e mais emblemático parque museológico e patrimonial português, como um todo que deveria ser coerente. Qualquer intervenção avulsa a fazer numa das unidades museológicas ou monumentais existentes num tecido urbano tão sensível, não somente corre o risco de ser em si mesma contraproducente, como pode originar uma cadeia de consequências que pode revelar-se catastrófica para outras unidades similares e para o conjunto, no seu todo.

O Projecto para o novo Museu Nacional dos Coches é o mais acabado exemplo deste perigo. Não se trata apenas de uma questão de arquitectura ou de uma questão de museologia - trata-se de uma questão de coerência nas políticas culturais e das suas relações com a construção de cidade, que é bem mais importante.

Assim, por todas as razões já amplamente conhecidas da opinião pública, a actual Câmara Municipal Lisboa, se de facto quiser ganhar credibilidade para o futuro, só tem um caminho a seguir: não aprovar o projecto de construção do novo Museu dos Coches, e fazê-lo não por questões de projecto arquitectónico, mas por questões bem mais sérias de estratégia urbana e de construção sustentada e democrática da cidade de Lisboa.

O período eleitoral autárquico e legislativo que se avizinha é especialmente favorável à promoção da discussão pública das matérias que interessam à cidade. Pode até acontecer que se conclua, após debate sério e participado, que o projecto existente para um novo museu em Belém é aceitável, devendo apenas ser reprogramado nos seus conteúdos, por forma a respeitar não somente as prioridades uma política cultural e museológica nacional, como as carências de oferta que se fazem sentir em Belém. Mas é fundamental, como dizia uma das consignas da concentração realizada há meses em frente do local previsto para esse novo museu, "discutir primeiro; demolir (e reconstruir) depois". O camartelo e a política do facto consumado nunca foram bons conselheiros para as políticas de salvaguarda e de valorização do nosso património cultural.

As responsabilidades políticas tomam-se no presente. Boas intenções e promessas futuras já não chegam, como base para cimentar o contrato social adulto que se exige neste início do século XXI.

O Secretariado da PP-CULT

10 comentários:

Anónimo disse...

Podem ficar descansados, que se a coisa é um atentado dessa ordem o Zé embarga de certezinha.

Anónimo disse...

Muito bem, apoiado!
Pena é que outras entidades com responsabilidade na defesa do património não tenham o mesmo comportamento.
Pois trata-se também de arquitectura, isto é mesmo muito mau.

Anónimo disse...

Caro António Costa
Podes esfregar as mãos na parede, um mandato curto e conseguiu por muitos lisboetas contra estas estravagâncias. Mas fica tranquilo que as despesas devem ser partilhadas com Manuel Salgado e Sá Fernandes.

Um lisboeta

Anónimo disse...

O Zé só vai voltar a embargar a seguir a Outubro, QUANDO FOR PARA O OLHO DA RUA. Mas aí paga as brincadeiras do bolso dele que o Bloco não suporta mais gente desta

Ferreira arq. disse...

As incongruências deste projecto são tantas que, pura e simplesmente arquivar o projecto e pagar ao autor, é o menor dos custos que agora podemos ter.
O projecto nunca devia ter sido adjudicado como foi.

A definição do programa para esta obra tem que ser bem definida, actual e consensual.
Há que redefinir, para não termos ali um monstro consumista.

Ver opinião sobre o projecto actual em:

http://forumsociedadecivil.blogspot.com/2009/06/cidadania-lx-novo-museu-dos-coches-3-f.html

Lesma Morta disse...

Francamente acho fraco. Perde-se em considerandos generalistas dando um pouco a entender que é bom não chatear demais. Pegam na questão democrática demolindo por completo o argumento arquitectónico que comprometerá a cidade por várias gerações. Num momento como este e em vésperas da reunião da câmara, os argumentos têm de ser mais contundentes e livres de falinhas mansas. Isto não pode ir para a frente. Como o arq ferreira disse, pague-se ao arquitecto e livrem-nos deste mal.

Abraços

Jorge Santos Silva

Teresa Pinto disse...

Belém é um espaço de representação desde a construção dos Jerónimos reforçado pelo romantismo do século XIX, pelos museus, centro cultural, da 'real barraca' ao palácio presidencial contudo,
não é um espaço de permanência e quando encontra pequenos momentos em pouco tempo se esvaziam os espaços ficando o medo e a insegurança próprios da não cidade.
Colocar o estacionamento perto de um novo museu dos coches seria interessante para quem?
Realizar um novo museu que não favorece o urbano, afasta-se da escala, do clima, da envolvente traduzindo aquilo que o movimento moderno defendia, afastamento do solo, formas e geometrias com rupturas com a história ...
Realizar um novo museu quando aquele edificio que sempre o albergou o justifica está excelente, não existe a palavra ampliação no dicionario português?
Numa época de crise financeira reduzem-se funcionários efectivos em todos os sectores menos no sector da construção em obras públicas e nas indeminizações a pagar aos políticos ou empresas com estes relacionados ...
Fernando Pessoa tinha razão "falta cumprir-se Portugal" in Mensagem

Anónimo disse...

Parabéns ao PPCult pela coragem.
Vamos todos divulgar esta posição, no nosso bairro, aos nossos amigos.

Quanto ao anónimo das 5,13 recordo-lhe que o Bloco, que só muito tarde se demarcou de Sá Fernandes, continua A FAVOR de uma NOVA PONTE em Lisboa (mais 100 000 carros, mais poluição, caos no parquemento), do TGV, de nova Gare do Oriente, etc etc, além de não ligar nenhuma ao património histórico.

jose santiago disse...

Há que parar mais esta pouca vergonha do Costa. Estes Senhores utilizam o voto que os eleitores de Lisboa lhes confiaram de livre e expontânea vontade para governarem a Capital de uma forma harmoniosa e correta, mas infelizmente não é isso que se está a passar.

Estão desgovernando com a mesma arrogância do Sócrates. Esta escola tem tido bons e fiéis discípulos.

Há que correr com eles.

Ferreira arq. disse...

Lisboa: Futuro Museu dos Coches está em zona de risco sísmico e inundações - Protecção Civil

Ainda mais esta???
.

http://noticias.sapo.pt/lusa/artigo/9771032.html
08 de Junho de 2009, 18:33
Lisboa, 08 Jun (Lusa) - O departamento de Protecção Civil da autarquia de Lisboa concluiu que o futuro Museu dos Coches está a ser construído numa zona vulnerável a sismos e inundações, de acordo com um parecer a que a Lusa teve acesso.
A Câmara de Lisboa discute terça-feira uma proposta do vereador do Urbanismo, Manuel Salgado (PS), para que a autarquia dê "parecer favorável condicionado" ao projecto do novo Museu dos Coches.
"Geologicamente, a área de implantação do Novo Museu dos Coches localiza-se sobre terrenos pertencentes ao Complexo Vulcânico de Lisboa. Parte desta unidade encontra-se no entanto recoberta por uma sequência de aluviões e aterros, que são especialmente favoráveis a fenómenos de amplificação de efeitos sísmicos", lê-se no parecer.