23/10/2019

Carta Aberta: Em defesa da imprensa local e regional





Carta Aberta: Em defesa da imprensa local e regional


Recentemente o jornal New York Times publicou um artigo que descrevia como é que a cidade de Nova Iorque depois de ter assistido a mais uma vaga de encerramentos de jornais locais e, até, de programas de rádio com décadas tinha decidido empreender uma iniciativa legislativa para, pelo menos, procurar conter essa sangria. Com efeito, dois legisladores estatais (os EUA são um país muito descentralizado) estão a trabalhar numa proposta que vai exigir que todas as operadoras de cabo disponibilizem pelo menos um canal local com "notícias, meteorologia e uma programação sobre 'assuntos públicos' locais". Segundo o projecto de lei agora em elaboração esta programação tem que ser original e não ser uma simples reprodução de notícias já emitidas ou produzidas por outros canais. A iniciativa insere-se num quadro mais global em que se encontra a verba de 2 milhões de dólares aprovada em New Jersey para financiar o "jornalismo de comunidade" e a nível dos EUA, há quem esteja a trabalhar no Congresso numa isenção total de impostos a este tipo de meios de comunicação.

Em Portugal o problema não é menor mas a acção por parte dos sucessivos governos continua a não existir. Sabendo disto os peticionários da petição, admitindo que "não somente em Portugal mas um pouco por todo o mundo os jornais locais estão em crise" e que "nos últimos 15 anos os jornais locais perderam mais de 30% de tiragem e 35% dos seus jornalistas. Estudos académicos recentes indicam que o desaparecimento de jornais locais leva a eleitores menos informados, a maior abstenção e a políticos locais mais distanciados da população. As dificuldades da Imprensa e do jornalismo de investigação são sobejamente conhecidas e não ocorrem apenas em Portugal nem se limitam a Lisboa e decorrem, muito, da canibalização quase total do mercado publicitário por plataformas como o Google e o Facebook. Mas a questão é saber se pode existir uma democracia local de qualidade sem imprensa local. E é nossa opinião de que tal é IMPOSSÍVEL."

Desta forma os peticionários propõem assim que "tendo em vista o esgotamento do modelo convencional de financiamento através de venda de jornais e da publicidade acreditamos que é preciso assumir que o serviço público desempenhado pelo "quarto poder" merece apoio público através de uma (ou várias) destas opções:

1. Cofinanciamento público quer sob a forma de uma dotação específica no âmbito do orçamento do Ministério da Cultura ou dos orçamentos autárquicos (a serem cedidos por júris independentes): para 2020 o Governo britânico vai lançar um projecto-piloto de 2.2 milhões de libras para apoiar o "jornalismo local de interesse público".

2. Dotação de uma parte do IRS a este fim com inscrição do NIF do jornal local que recebe esse benefício

3. Isenção total (de Segurança Social e IRC) sobre este tipo de empresas

4. Criação de mecanismos de apoio e estímulo à constituição de cooperativas (organizações não lucrativas) de jornalistas, quer através de serviços partilhados (de logísticas, recursos humanos, contabilidade e instalações) entre vários jornais geograficamente próximos

5. Criar legislação que permita que as autarquias - que o desejam - pode criar taxas locais de pequeno valor mas que garantem um financiamento regular à imprensa local (algo semelhante ao que faz Denver com uma taxa sobre o comércio local para financiar as organizações culturais desta cidade dos EUA)

6. Determinar que todos os editais autárquicos (Câmaras Municipais e Juntas de Freguesia) tenham que ser, obrigatoriamente, publicados no jornal local ou numa edição local de um jornal nacional.

7. Permitir o abatimento para efeitos de IRS de custos de assinaturas de jornais regionais: nos EUA, jornais locais de várias cidades registaram nos últimos anos crescimentos dos seus subscritores pagos de dois dígitos: uma medida fiscal deste tipo poderia promover este tipo de subscrição.

8. No IRS abrir uma rubrica para escolher dedicar uma pequena parte do IRS a organizações cooperativas de Informação Local.

9. Via CNE garantir um espaço idêntico para todas as listas que se apresentarem a eleições pago a um valor fixo a todos os jornais e à disposição de todas as forças políticas que se apresentarem a eleições e a aplicar na edição imediatamente anterior à edição.

10. Promover a criação de uma plataforma online única de partilha entre todos os jornais e manter essa estrutura fora das estruturas de custos dos jornais locais.

11. Seguir de perto a "Report for America" uma iniciativa da fundação "GroundTruth Project" que disponibiliza 300 milhões de USDs em financiamento a notícias, jornalistas e jornais que trabalham na área do jornalismo local e sugerir iniciativas idênticas a fundações em actividade em Portugal. Esta iniciativa reduz a metade o custo de empregar um jornalista o qual recebe financiamento deste fundo ao qual adere através de uma competição aberta a todos os interessados.

12. Desenvolver a lei do Mecenato Cultural por forma a incluir o apoio a Jornais Locais

13. Permitir às empresas que fazem deduções fiscais de todas as verbas que investem em publicidade nos Jornais Locais

14. Criar um prémio anual, patrocinado por empresas privadas e organizado por uma fundação, para a melhor reportagem de jornalismo local."

Uma ou várias destas alternativas de financiamento podem fazer a diferença entre termos ou não imprensa local já que a alternativa é, simplesmente, não termos esta importante componente da democracia local e assistirmos consequentemente a uma grave degradação da nossa democracia.


Primeiro peticionário da "Carta Aberta: Em defesa da Imprensa Local e regional", Membro do Fórum Cidadania Lx e Fundador dos Vizinhos do Areeiro

1 comentário:

Alvaro Pereira disse...

Tantos jornais de Lisboa desapareceram e deixaram saudades:"O Século", "Diário de Lisboa", "A Capital", "República", etc, etc...